Opinião

Sim, também temos nossos “Complexos do Alemão”

Ninguém gosta muito de tocar em certas feridas sociais. Mas, diante da guerra urbana instalada no Rio de Janeiro, entre o Estado e o narcotráfico, quando – depois de décadas de domínio do crime organizado em territórios do município – finalmente se resolveu combater de fato o mal, vale lembrar que o problema não está instalado apenas nos morros cariocas. São Paulo, e por que não dizer Guarulhos, também tem seus “Complexos do Alemão”, seus “morros do Cruzeiro”, suas “Rocinhas”, entre outras comunidades famosas.


 


São áreas comandadas pela bandidagem, onde moram muitas famílias de boa índole mas que, por essas incontingências da vida, não encontraram locais mais apropriados para ficar. Sem a presença do Estado, que fecha os olhos para a necessária urbanização, proliferam os gatos – ligações clandestinas de água e luz -, inexiste o saneamento básico, escolas ficam distantes, postos de saúde nem pensar. Em condições adversas, fica fácil para o crime se instalar e ditar a lei e a ordem, sob seu ponto de vista.


 


Salvo algum engano, seria interessante que se pudesse apontar uma comunidade guarulhense – para não dizer favela, já que se considera politicamente incorreto utilizar esse termo – em que um cidadão de fora possa ingressar à noite sem medo. Em muitas, bem próximas à região central, é impossível entrar de dia sem o consentimento dos donos do lugar, que não fazem outra coisa que seus colegas cariocas.


 


Mas prevalece aquela velha história das autoridades competentes fingirem que o problema não é com elas. Como a criminalidade se encontra em níveis aceitáveis para a sociedade, por que então mexer com essas feridas? Melhor deixar tudo como está. Viciados vão até lá buscar os objetos de seus desejos ou necessidade e voltam para o convívio de seus lares, como se nossos “complexos do Alemão” já fizessem parte da paisagem urbana.


 


Quando um cidadão de bem sofre qualquer tipo de violência – seja o simples furto do estepe de seu veículo, um assalto à mão armada, um sequestro relâmpago ou mesmo – na pior das hipóteses – acaba assassinado durante um roubo -, a comoção é inevitável. Mas a dor fica dentro das quatro paredes da família violentada, sob o patrocínio do narcotráfico que nos cerca. Que está em nossos morros, em nossos presídios e – aos poucos – vai ganhando nossa vizinhança.


 


Passa da hora do Brasil estabelecer uma política macro de segurança pública, com ações de combate ao narcotráfico, como um todo, que envolvam as fronteiras do país. Que se busque soluções e não paliativos. Que se encontre saídas reais e não apenas os holofotes da mídia, como se vê agora no Rio de Janeiro, onde se anuncia a vitória de uma batalha, mas com poucas prisões, sem abater o inimigo que – provavelmente – fugiu pelos esgotos da cidade maravilhosa. Infelizmente, há muitos interesses em jogo. Interesses que, para as pessoas comuns, são inimagináveis. Mas que prevalecem.

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