As taxas das apólices de seguro, que haviam baixado nos últimos anos, como reflexo da forte concorrência neste segmento, devem subir agora por conta dos vários desastres com aeronaves nos últimos meses. As indenizações às famílias de vítimas em acidentes com aviões de grande porte podem demorar anos para serem concluídas, mas os impactos nos preços internacionais do seguros, como nas recentes ocorrências com dois aviões da companhia Malaysia Airlines, são imediatos.
O ano de 2014 tem sido marcado por um volume inesperadamente alto de acidentes aéreos. Além dos aviões da Malaysia, entre os casos recentes, um acidente durante o pouso com a aeronave da companhia TransAsia com 58 pessoas a bordo, em Taiwan, o principal aeroporto na Líbia foi bombardeado em julho, afetando 20 aviões, e um ataque Talibã provocou estragos em um terminal no Paquistão. Fora isso, cresceram os acidentes de aviões de menor porte, como o que vitimou o candidato à presidência da República, Eduardo Campos, na semana passada.
“É possível que ocorra um ajuste das taxas. Os preços das apólices no segmento de aviação caíram significativamente nos últimos anos, assim, é esperado que os prejuízos assumidos pelos resseguradores nos últimos anos revertam este movimento de queda nas taxas”, admite Daniel Veiga, diretor de Subscrição – Riscos Especiais do IRB Brasil Re, maior ressegurador da América Latina.
Até o começo deste ano, o mercado mundial de seguros para aviões estava mais tranquilo, com menos sinistros e preços em queda. Isso se refletiu na redução substancial do volume de prêmios no mundo nos últimos anos. De cerca de US$ 1 bilhão emitidos em 2005, o total baixou para US$ 650 milhões no ano passado, caracterizando o momento “soft” do mercado, ou seja, muito competitivo e com preços baixos por conta da sinistralidade controlada. Foram menos de 50 grandes acidentes superiores a US$ 1 milhão por ano no mundo desde 2011 quando ocorreu o fatídico “11 de setembro”, segundo o especialista Gustavo Mello, da Correcta Seguros, com foco no setor aeronáutico.
Os seguros para aviões são complexos e envolvem valores elevados, por conta dos custos altos das aeronaves e das indenizações em casos de acidente. A principal apólice é a chamada “todos os riscos” (“all risks”) e cobre as perdas dos cascos e indenizações a terceiros. No caso da Malaysia Airlines, a cobertura total para cada aeronave é de US$ 2,25 bilhões, por conta dos aviões de maior porte que costuma usar, como os Airbus A380, que transportam cerca de 500 passageiros.
Guerra
As companhias aéreas, incluindo as brasileiras, também costumam contratar a chamada cobertura de guerra principalmente aquelas que voam para locais de maior tensão, como no Oriente Médio. No caso da Ucrânia, muitas seguradoras alertaram para os riscos de voar naquela região por conta do aumento da tensão com a Rússia. Apesar disso, especialistas do setor relatam forte aumento de sinistros nesta cobertura no mundo, batendo em US$ 600 milhões só neste ano, enquanto os prêmios emitidos não chegaram a US$ 70 milhões.
O aumento das taxas para apólice de guerra, conforme Mello, da Correcta, deve se refletir nos preços dos mercados que precisam de resseguro, a exemplo de Índia e Brasil. “O Brasil pagará mais porque tem necessidade de absorver resseguro no exterior. Hoje, uma taxa de cobertura de guerra está em 0,12% do valor do avião. Se houver aumento, pode subir para 0,15%”, estima ele.
A proteção para guerra foi acionada no segundo acidente com o avião da Malaysia, um Boeing 777, que levava 298 pessoas a bordo, uma vez que foi atingido por um míssil na região rebelde separatista no leste da Ucrânia. Tal cobertura estava com a seguradora Atrium Underwriting Group, que deverá responder pelo sinistro. “A Atrium e seus cosseguradores trabalharam com a corretora Willis e os advogados e concordaram em acionar a cobertura de guerra”, afirmou o presidente da Atrium, Richard Harries, em um comunicado.
No caso do avião MH370, que partiu de Kuala Lumpur à Pequim e desapareceu com 239 pessoas, em março último, também da Malaysia, o risco deve ser rateado entre a Allianz, responsável pela apólice “all risks”, e a seguradora que ofereceu a proteção de guerra.
O presidente da Allianz Global Corporate & Specialty (AGCS) no Brasil, Angelo Colombo, explica que essa divisão ocorre quando a causa do acidente não é identificada. “Para que os envolvidos não tenham prejuízo e fiquem esperando eternamente, as seguradoras optam pelo rateio e uma vez descoberta a causa do acidente, a seguradora que não teve responsabilidade pela cobertura faz o ressarcimento à outra”, disse ao Broadcast.
As seguradoras líderes no segmento de aviação no mundo incluem players como a alemã Allianz, as norte-americanas United States Aviation Underwriters, AIG, e Berkley, a inglesa Lloyds of London e a XL, com sede nas Bermudas. No Brasil, as maiores são a espanhola Mapfre, e as nacionais Itaú, que recentemente vendeu sua carteira de grandes riscos para a americana ACE, e Bradesco, segundo a Superintendência de Seguros Privados (Susep).
O mercado brasileiro responde por 20% dos prêmios globais de resseguros, com mais de US$ 152 milhões em prêmios, segundo Mello. Tal volume é explicado pelo tamanho da frota local e demanda de resseguro internacional. No primeiro semestre deste ano os prêmios de seguros somaram R$ 175,4 milhões, aumento de 9,8% ante igual intervalo de 2013.