As comunidades ribeirinhas da Amazônia que vivem da produção de juta estão, desde a última terça-feira, 30, no centro de uma divergência entre o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), de um lado, e Itamaraty e Fazenda, de outro. A causa é a decisão de não prorrogar a sobretaxa que o governo impunha na importação dos sacos de juta produzidos na Índia e em Bangladesh.
Essa sobretaxa, uma medida antidumping, vinha sendo aplicada desde 1992 para compensar o fato de o produto importado chegar aqui a preços inferiores aos cobrados no mercado de origem, prejudicando a produção local. E taxa venceu no último dia 30 e não foi renovada. O MDIC tinha posição favorável, segundo informou a pasta. Porém, houve votos contrários da Fazenda e do Itamaraty.
O episódio acabou elevando a temperatura, nos bastidores, de uma disputa que fermenta desde que o presidente Michel Temer transferiu para o Ministério das Relações Exteriores (o Itamaraty), comandado por José Serra, a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) e a secretaria executiva da Câmara de Comércio Exterior (Camex). Ambas faziam parte do MDIC.
Quem defendia a prorrogação do antidumping aponta para uma suposta “barbeiragem” da nova direção da Camex. Na outra ala, técnicos explicam que havia uma prática de a Câmara apenas referendar o parecer do MDIC nos casos de antidumping, mesmo quando havia opinião divergente.
A pasta da indústria deu parecer favorável à prorrogação por entender que os preços dos sacos de juta importados são artificialmente baixos. Para chegar a essa conclusão, utilizou como referência valores cobrados em terceiros mercados, e não nos países de origem, como previsto na metodologia tradicional de apuração de dumping.
Isso foi feito porque os técnicos consideraram que Índia e Bangladesh não praticam preços de mercado nas vendas internas. A base disso é um conceito chamado “situação particular de mercado”, previsto nos regulamentos da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Dúvida
Os dois pareceres contrários, da Fazenda e do Itamaraty, questionam a metodologia adotada pelo MDIC. Eles consideram que o conceito de “situação particular de mercado” não deveria ser usado, porque a própria OMC tomou, recentemente, decisão contrária à aplicação desse mecanismo.
“Ganhar ou perder faz parte do processo, mas é falta de consideração a forma como o processo foi conduzido e a forma como foi tratado, sem dar satisfação a ninguém”, disse o diretor superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel. “Nem fomos informados da decisão; ficamos sabendo porque fomos atrás.” Ele acrescentou ser este um sinal ruim para os investimentos.
Procurada, a secretária executiva da Camex, Tatiana Rosito, explicou que não se trata de sinalização alguma, e sim de um processo que procurou conduzir da forma mais equilibrada possível. Ela explicou que o antidumping não foi prorrogado porque havia um voto favorável e dois contrários. “Não temos nada contra o setor”, frisou. As outras três pastas integrantes do colegiado se abstiveram ou não se manifestaram. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.