A Fifa deu o contrato para a venda de pacotes da Copa do Mundo à empresa que perdeu a concorrência interna realizada pela própria entidade. Mas a companhia derrotada tinha um outro ativo: ela faz parte de um conglomerado presidido pelo sobrinho de Joseph Blatter, o presidente da Fifa. A empresa é a mesma que está sendo processada no Brasil por atuar na venda ilegal de ingressos.
Documentos exclusivos obtidos pela reportagem do jornal O Estado de S. Paulo revelam que a empresa Byrom concorria em 2012 com a Kuoni, uma gigante do setor do turismo mundial. Em 12 páginas de avaliação da licitação, os técnicos da Fifa chegaram à conclusão de que a Byrom não estava capacitada para realizar as vendas de pacotes para a Copa de 2018 e o modelo comercial nem sequer cobriria os custos. Mesmo assim, a empresa ficou com o contrato.
A Byrom é uma empresa administrada pelos irmãos mexicanos Enrique e Jaime Byrom. Ela é, no fundo, uma subsidiária da Match, empresa que tem como seu CEO Philippe Blatter, sobrinho de Joseph Blatter. No Brasil, em julho, a Polícia do Rio emitiu uma ordem de prisão contra um dos funcionários da empresa por suspeita de envolvimento na venda ilegal de ingressos. Os irmãos Byrom rejeitam a acusação.
Há uma semana, em Zurique, o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, confirmou que a Byrom será mantida para a Copa de 2018, na Rússia. “O trabalho feito pela Match administrando nossa operação de ingressos tem sido ótimo”, disse ele.
O problema é que os documentos oficiais da licitação da Fifa revelam uma conclusão radicalmente oposta às declarações de Valcke. Num informe de 22 de novembro de 2012, a Fifa aponta que a Byrom e a Kuoni foram selecionadas como finalistas da licitação para ficar com os contratos de 2018. Em todos os critérios estabelecidos pela Fifa, a Byrom foi derrotada de forma clara pela Kuoni, com 51 pontos contra apenas 22 da Byrom, que acabou ficando com o contrato.
O documento termina com uma declaração inequívoca. “Recomendação: selecionar a Kuoni.” O trabalho também alerta que, no caso de a Byrom vencer a disputa, a Fifa continuaria “totalmente exposta” em uma situação de turbulência e teria de garantir um financiamento de US$ 50 milhões para a empresa realizar seu trabalho. No caso da Kuoni, nenhum aporte da Fifa seria necessário. Mas nada disso foi suficiente para romper a aliança entre tio e sobrinho.