Estadão

Sudão: golpe de Estado compromete apoio internacional conquistado com dificuldade

Só este ano o empobrecido Sudão começou a reverter décadas de isolamento internacional para obter investimentos e ajuda urgentemente necessários. Mas o recente golpe militar ameaça este progresso, dizem analistas. Nesta quarta-feira, 27, pelo terceiro dia consecutivo, os manifestantes permanecem nas ruas da capital do país, Cartum, para protestar contra o golpe de Estado liderado pelo comandante do exército, general Abdel Fattah al-Burhane.

Também hoje, o aeroporto de Cartum vai retomar as operações a partir das 16h locais (11h de Brasília), anunciou o diretor da Aviação Civil, Ibrahim Adlane, dois dias após o golpe de Estado que derrubou o governo de transição do Sudão. Na terça-feira, Adlane afirmou que os voos procedentes e com destino a Cartum estavam suspensos "até 30 de outubro". Não houve explicação para o motivo da antecipação da data de reabertura.

O aeroporto, no centro de Cartum, onde os manifestantes bloquearam avenidas com pedras e pneus queimados, é separado apenas por uma cerca das principais avenidas da capital sudanesa.

Sob a ditadura de Omar al-Bashir, o Sudão era um pária para os países ocidentais. Os Estados Unidos impuseram severas sanções contra o regime por abrigar extremistas islâmicos, incluindo o então chefe da Al-Qaeda, Osama bin Laden, nos anos 90.

O líder autoritário foi derrubado por seu próprio exército em abril de 2019, após grandes protestos de rua. Um governo de transição civil-militar foi então instalado e derrubado no golpe de Estado da última segunda-feira, 25.

Estes dois anos colocam o Sudão no caminho certo, diz Alex de Waal, um experiente especialista no país e diretor executivo da Fundação para a Paz Mundial, sediada nos EUA. Em dezembro, Washington retirou o Sudão de sua lista de países que patrocinam o terrorismo. E, este ano, abriu as portas para uma anulação de dívida de US$ 50 bilhões e novos financiamentos do FMI e do Banco Mundial.

<b>Suspensão da ajuda</b>

"Os interesses nacionais do Sudão estavam sendo atendidos, dando continuidade a este lento caminho de reforma com assistência internacional que finalmente estava começando a chegar na quantidade necessária", diz De Waal.

Mas com a prisão do primeiro-ministro, Abdallah Hamdok, um economista internacional, e de outros membros civis do governo, os militares criaram "sérios riscos para o Sudão", diz um relatório do Grupo Internacional de Crise.

Os Estados Unidos não hesitaram em reagir. Horas após o golpe, anunciou que suspendia um pacote de ajuda econômica de 700 milhões de dólares para apoiar a transição democrática do país.

Na terça-feira, a União Europeia também advertiu sobre a suspensão do apoio financeiro se os militares não restaurarem os líderes civis ao cargo.

Se as ameaças, especialmente de doadores ocidentais e do Banco Mundial, forem levadas a cabo, o "progresso esperado, mas substancial, que foi feito para estabilizar o país, desmoronará", adverte De Waal.

O Sudão é um dos países menos desenvolvidos do mundo. No final de 2018, o preço do pão triplicou, levando a protestos que acabaram por expulsar o então ditador. Em tempos recentes, o país sofreu escassez de medicamentos e outros bens essenciais enquanto a inflação estava acima de 300%.

Após a derrubada de Bashir, as monarquias do Golfo depositaram inicialmente US$ 500 milhões em seu banco central como parte de uma assistência prometida de US$ 3 bilhões para manter sua influência no país.

<b>Protestos</b>

Pelo menos quatro pessoas foram mortas e cerca de 80 ficaram feridas nos protestos no Sudão, de acordo com um sindicato de médicos independentes. Analistas expressaram a preocupação de que os protestos continuem sendo brutalmente reprimidos no país. (Com agências internacionais).

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