O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta-feira, 21, por 10 votos a 1, que a denúncia apresentada na semana passada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer deve ser encaminhada desde já à Câmara dos Deputados.
A defesa de Temer havia solicitado ao Supremo Tribunal Federal que suspendesse o envio da denúncia enquanto não fossem esclarecidos os “fatos gravíssimos” que vieram à tona após a divulgação de uma gravação de conversa entre Joesley Batista e Ricardo Saud, que motivou a rescisão unilateral do acordo de colaboração premiada, por parte da PGR, e a ordem de prisão dos dois delatores.
O relator, Edson Fachin, decidiu levar esses questionamentos a debate no plenário como uma questão de ordem e votou no sentido de que não cabe a análise prévia no Supremo sobre a validade das provas do acordo de colaboração da J&F e tampouco se deveria aguardar a apuração sobre irregularidades nas delações de Joesley Batista e Ricardo Saud, dono e ex-executivo do grupo. Ele foi acompanhado por todos os ministros, exceto Gilmar Mendes. Os votos de Cármen Lúcia, Celso de Mello e Marco Aurélio Mello encerraram a votação nesta quinta-feira.
A denúncia aponta que Temer, os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco e os ex-deputados federais Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima e Henrique Eduardo Alves teriam formado uma organização criminosa que se beneficiou de desvio de recursos de contratos relacionados à Petrobras e em outras áreas.
Além disso, Temer é acusado também de obstrução de justiça, por ter supostamente incentivado a “compra” do silêncio de Lúcio Funaro, que teria sido feita por Joesley Batista e Ricardo Saud, respectivamente, dono e ex-executivo do Grupo J&F. “À Câmara dos Deputados compete deliberar por primeiro. Somente após autorização da Câmara é que tem cabimento dar prosseguimento à persecução criminal no STF. Não cabendo a essa Suprema Corte proferir juízo de admissibilidade sobre denúncia antes do exame e da autorização ou não pela Câmara, igualmente entendo que não cabe a essa Corte proferir juízo antecipado a respeito de eventuais teses defensivas”, afirmou o relator do caso, ministro Edson Fachin, em seu voto, explicando também porque as provas não devem ser analisadas neste momento.
Apesar do entendimento majoritário de que nesta etapa cabe à Corte apenas encaminhar a acusação formal contra Temer para o juízo político dos deputados, alguns ministros ressaltaram que o STF tem um “encontro marcado” com discussões sobre a licitude das provas apresentadas por executivos do grupo J&F e sobre a possibilidade de terceiros questionarem a validade das delações. Os pontos críticos à delação levantados por ministros foram comemorados pela defesa do presidente.
“Nós teremos um encontro marcado com análise sobre licitude de provas”, destacou Moraes, ressaltando que a discussão sobre o tema pelo plenário do STF deve ocorrer apenas depois de a Câmara dos Deputados dar aval para o prosseguimento da denúncia.
Gilmar Mendes foi o único ministro a entender que, neste denúncia específica, há elementos que inviabilizariam o envio à Câmara. Ele votou por não apenas suspender o envio, como também por devolver à PGR para readequação da denúncia, para que fatos anteriores ao mandato de Temer fossem retirados da peça acusatória. Para Mendes, há problemas na origem da delação premiada da JBS e isso inviabilizaria a denúncia.
“Há elementos levando a crer que outros membros do Ministério Público, que estão atualmente envolvidos nesta investigação, tinham conhecimento das investigações paralelas e gravações clandestinas. Dentre eles, o signatário da denúncia, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot Monteiro de Barros.
Mesmo acompanhando o voto do ministro Edson Fachin, os ministros Dias Toffoli, Celso de Mello e Cármen Lúcia discordaram de uma parte da fundamentação do relator, no que diz respeito à possibilidade de o Supremo fazer uma análise prévia ao envio de uma denúncia contra um presidente da República à Câmara dos Deputados.
Para os três, a Corte pode sim rejeitar uma denúncia antes do envio à Câmara, se entender que há alguma irregularidade evidente. No entanto, isso não seria possível de afirmar em relação à denúncia em questão. “É possível o Supremo decidir em hipóteses nas quais se revele evidente a consumação da prescrição penal ou naqueles casos em que seja evidente a falta de tipicidade penal ou eventualmente em caso no qual seja iniludível a ausência de uma das condições da ação, legitivamente, da legitimidade ativa de causa”, teorizou o ministro Celso de Mello.
Os acordos de colaboração de Joesley Batista e Ricardo Saud ainda não estão formalmente anulados. Apesar de PGR ter informado ao Supremo a rescisão (cancelamento), cabe ao relator Edson Fachin decidir pela homologação (validação legal) do desfazimento dos acordos.
Até o momento, Fachin concedeu apenas a suspensão parcial do acordo, o que permitiu que os dois delatores fossem denunciados junto com o presidente Michel Temer no episódio, por supostamente, terem pago pelo silêncio do delator Lúcio Funaro.