O histórico anúncio do governo de Joe Biden de apoio à quebra temporária de patentes das vacinas contra a covid-19 não deve trazer nenhum benefício imediato ao Brasil. O País não tem capacidade de produção instalada para a fabricação de imunizantes como os da Pfizer e da Moderna, feitos a partir do RNA. Mas especialistas concordam que a decisão dos EUA pode ser importante no longo prazo, até como estímulo ao investimento em novas tecnologias.
No Brasil, apenas duas instituições teriam capacidade técnica para incorporar novas tecnologias de imunizantes e desenvolvê-las no País: o Instituto Butantan, em São Paulo, e a Fundação Oswaldo Cruz, no Rio; atualmente envolvidos na produção da Coronavac e da vacina de Oxford-AstraZeneca, respectivamente. Uma nova linha de fabricação demandaria a suspensão da atual produção, pois não há espaço ocioso nas plantas.
Além disso, a incorporação de novas tecnologias não é algo simples. Um bom exemplo é a fabricação da própria vacina de Oxford-AstraZeneca, baseada na tecnologia de vetor viral, nunca antes produzida por aqui. A Fiocruz levou meses para adaptar uma planta à nova produção e, até agora, ainda não começou a produzir o Insumo Farmacêutico Ativo (IFA) em larga escala.
Países como a China e a Índia teriam maior capacidade de incorporar novas tecnologias e começar a produzir imunizantes em massa com mais agilidade. Ainda que essa produção extra possa, em tese, nos beneficiar, continuaremos dependentes da capacidade diplomática do governo de Jair Bolsonaro de fechar acordos com esses países.
"No curto prazo, não há benefício imediato para nós na quebra de patentes, porque não temos um parque tecnológico para produção em massa", resumiu o imunologista André Báfica, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). "No médio e longo prazos pode ser bem interessante, desde que esteja atrelada à criação de um parque tecnológico capaz de desafogar Butantan e Fiocruz."
O uso do RNA mensageiro para a produção de imunizantes é considerado a principal tecnologia moderna para a fabricação de vacinas. Dominar essa técnica, que pode ser adaptada para outros imunizantes, é crucial para a autonomia científica de qualquer país. "Do ponto de vista estratégico, é muito importante dominar essa tecnologia", afirmou Báfica. "Tanto é assim que os EUA investiram pesado nisso."
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>