Com a produção garantida, Gustavo Nunes convidou João Fonseca para direção de Cássia Eller – O Musical, função dividida com Viniciús Arneiro. “O fato de ter um novo olhar foi fundamental para que eu arriscasse mais”, comenta o diretor. “Nosso desafio era descobrir como observar aquela artista e o que ela provocou na nossa geração. Cássia era autêntica e, por isso, não chocava.”
A dramaturgia, portanto, ficou a cargo de Patrícia Andrade, por também acreditar que Cássia não passou pela vida dos amigos impunemente. E, ao lado de Lan Lan e Fernando Nunes, Fonseca e Gustavo participaram dos cinco dias de audição para definir o elenco.
Aos poucos, os personagens foram ganhando corpo: Emerson Espíndola foi escolhido para viver, entre outros, Nando Reis; Eline Porto foi selecionada para ser Eugênia, companheira de Cássia; Evelyn Castro interpreta Nanci, mãe da cantora; Thainá Gallo foi eleita para viver Lan Lan; Jana Figarella é Rúbia e Glicério Rosário se divide entre Oswaldo Montenegro e Fernando Nunes, além de outros papéis.
Restava o grande desafio: a intérprete de Cássia Eller. João Fonseca alimentava um desejo de escalar uma grande atriz, Georgette Fadel, o que garantiria um peso considerável na interpretação. “Sem dúvida, seria uma ótima escolha, mas eu havia me comprometido com a família da Cássia que encontraríamos alguém ainda desconhecido para o papel”, observa Gustavo.
Assim, mais de mil candidatas se apresentaram, mas nenhuma provocou tamanho frisson que o provocado por Tacy de Campos. Curitibana, 24 anos, ela foi convidada para a audição depois que a produtora de elenco Cibele Santa Cruz descobriu um vídeo no YouTube, que mostrava Tacy cantando como Cássia Eller. “Alguns amigos queriam fazer uma homenagem a ela e me convidaram para participar”, conta Tacy, cuja timidez diante de entrevistadores se assemelha à da própria Cássia, famosa pelos monossílabos que dava como respostas.
“Quando Tacy entrou com um jeito de bicho do mato, cabeça baixa, extremamente tímida, já senti um frio na espinha”, lembra Fernando Nunes, que acompanhou Cássia em quase toda sua carreira. “Comentei com a Lan Lan que era o mesmo jeitão.” E bastou a menina soltar a voz para a certeza se concretizar – Tacy emocionou os selecionadores ao cantar Por Enquanto, Come Together e Partido Alto.
“Fomos às lágrimas e, para nós, não havia mais dúvidas”, relembra Fernando.
Embora também tocados pela apresentação, João Fonseca e Gustavo Nunes não estavam ainda totalmente convencidos. “Preparávamos um musical e não um show, ou seja, era preciso que ela demonstrasse também aptidão para atuar”, explica o diretor, ciente da completa inexperiência de palco de Tacy. “Tivemos uma boa conversa e ela decidiu aceitar o desafio.”
Além de ter aulas de interpretação, foi essencial na composição do personagem, segundo Gustavo, a amizade que Tacy estabeleceu com o baixista Fernando Nunes. “Eles criaram uma cumplicidade totalmente favorável para o musical”, observa. Fernando confirma: “Como conheci bem a Cássia, mostrei detalhes nos gestos que ajudaram a compor o personagem”.
João Fonseca também se impressionou com a evolução de Tacy. “Ela revelou uma incrível inteligência cênica e acompanhar sua descoberta do papel foi como ver uma criança engatinhando até aprender a andar.”
Ao contrário de outras produções musicais que apostam em cenários suntuosos, Fonseca preferiu trabalhar apenas com cadeiras que marcam espaços e plásticos escuros que cercam o palco, criando um ambiente de caverna. “Cássia certamente não gostaria de nada luxuoso”, acredita o encenador. “Também era preciso que fosse algo que abrigasse todos os lugares e tempos vividos por ela. E, como Cássia gostava de cantar em espaços pequenos, undergrounds, esse clima de caverna é o ideal.”
A iluminação é determinante, segundo Fonseca. É a luz que mostra a mudança de ambientes. E também é um lento apagar que marca poeticamente a morte da cantora.
Família não fez imposições
Companheira de Cássia Eller por 14 anos, Maria Eugênia Martins não fez nenhuma imposição ao musical, tampouco pediu alguma mudança no texto, mesmo com várias cenas exibindo uso de álcool e drogas ou mesmo não escondendo as infidelidades promovidas pela cantora.
Durante os ensaios, Maria Eugênia e o filho de Cássia, Francisco, eram representados por Rodrigo Garcia, que cuida do espólio artístico da cantora. “Foi uma convivência muito tranquila, sem nenhum problema”, comenta o produtor Gustavo Nunes.
No total, são 34 canções, abrindo com Do Lado do Avesso e encerrando com um grande sucesso de Cássia, Segundo Sol.