Os juros futuros fecharam em alta nesta sexta-feira, pressionados por declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e uma piora na percepção de risco sobre a guerra Israel e Hamas. O chefe do Executivo mostrou pouca disposição para cumprir a meta de zerar o déficit primário em 2024, definida no texto do arcabouço fiscal, relativizando ainda o impacto negativo de um déficit entre 0,50% e 0,25% do PIB.
Lá fora, o temor de uma escalada no conflito em Gaza pressionou os preços do petróleo e enfraqueceu as bolsas, numa aparente busca por segurança nos Treasuries. Mesmo com a alta desta sexta, as taxas ainda conseguiram acumular queda na semana, com desinclinação para a curva.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 fechou em 10,990%, de 10,791% no ajuste anterior, e a do DI para janeiro de 2026 subiu de 10,57% para 10,81%. A do DI para janeiro de 2027, que nas máximas voltou a rodar na casa de 11%, era de 10,97% no fechamento (10,72% na quinta-feira) e a do DI para janeiro de 2029 avançou a 11,37%, de 11,17%. Na semana, as taxas curtas caíam perto de 10 pontos, as intermediárias e as longas, cerca de 25 pontos.
Em café com jornalistas pela manhã, Lula disse que dificilmente o Brasil atingirá o déficit zero em 2024 e que um rombo de 0,5% ou 0,25% não é "nada". "Eu não vou estabelecer uma meta fiscal que me obrigue a começar o ano fazendo um corte de bilhões nas obras que são prioritárias nesse País", disse.
Afirmou ainda que o mercado é "ganancioso demais" ao cobrar a meta que "eles acreditam" que vai ser cumprida. "Quero dizer para vocês que nós dificilmente chegaremos à meta zero, até porque eu não quero fazer cortes em investimentos e obras", afirmou.
A fala caiu como uma bomba nos mercados. Ainda que as projeções dos analistas, inclusive no Boletim Focus, não apontem para o cumprimento da meta, a avaliação dos agentes é de que uma vez isso dito pelo presidente tem um peso muito maior e negativo para a imagem e credibilidade do País. "Lula não falou nada de novo, mas quando se abandona o objetivo muito cedo, os agentes ficam desconfiados, numa semana que vinha sendo muito positiva para as aspirações da Fazenda", afirmou Daniel Leal, estrategista de renda fixa da BGC Liquidez, referindo-se sobretudo à aprovação do projeto de lei da taxação dos fundos de alta renda na Câmara.
Para Leal, desde que as declarações não sejam oficializadas ou endossadas por mais gente dentro do governo, a tendência é de que os mercados "voltem um pouco" após a reação inicial fortemente negativa. "Lula tem disso. Faz um bate e assopra , eventualmente reconsidera e vai testando. Acredito que tanto um sell-off ou um rali nos próximos dias devem partir mesmo de eventos no exterior", disse.
O estrategista-chefe da RB Investimentos, Gustavo Cruz, lembra ainda que pela manhã o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, havia sinalizado possibilidade de cumprimento da meta. "Horas depois, vem o presidente e fala o contrário", observou.
Ceron disse que o cenário era desafiador para 2024 e, questionado sobre se o alerta significaria que o governo já cogita alterar a meta, negou qualquer sinalização nesse sentido. "Continuaremos buscamos o déficit zero em 2024, mas podemos ter fatores extraordinários. A análise mais macro de 2024 está em curso, mas nada muda na busca por déficit zero", disse.
Ceron fez os comentários em entrevista sobre o números do Governo Central em setembro, que surpreenderam positivamente, o que ajudava a aliviar a ponta longa pela manhã. Após quatro meses no vermelho, as contas voltaram a registrar superávit primário, de R$ 11,548 bilhões. O resultado ficou acima da mediana das expectativas, de saldo positivo de R$ 10,505 bilhões, de acordo com levantamento do Projeções Broadcast.