Homens armados invadiram nesta sexta-feira, 22, uma casa de espetáculos de Moscou, mataram 62 pessoas e incendiaram o local. Segundo o Serviço Federal de Segurança (FSB), a principal agência de segurança russa, o atentado deixou mais de 100 feridos, incluindo crianças. Um terço do Crocus City Hall pegou fogo. Bombeiros tentavam retirar sobreviventes pelo teto, quando parte dele desabou.
O Estado Islâmico reivindicou a autoria do atentado. "Os combatentes do EI atacaram uma grande reunião de cristãos nos arredores da capital russa", disse o grupo, em comunicado no Telegram. Os jihadistas, no entanto, não forneceram nenhuma evidência para apoiar a alegação.
O governo americano, imediatamente, disse acreditar na possibilidade de o ataque ter sido executado pelo EI. O temor na Casa Branca era o de que o presidente russo, Vladimir Putin, culpasse a Ucrânia e usasse o atentado para justificar a guerra. John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, garantiu que não havia "nenhuma indicação de que a Ucrânia ou os ucranianos" estivessem envolvidos no ataque.
A suspeita de que os ucranianos pudessem estar por trás da ação veio principalmente por causa da atração que deveria se apresentar ontem no Crocus City Hall, uma banda russa de rock progressivo chamada Piknik, que foi proibida de se apresentar na Ucrânia após realizar um show na Crimeia ocupada, em 2016. A Rússia vem apertando o cerco contra os ucranianos e intensificando os bombardeios a Kiev.
Apesar das suspeitas, a Ucrânia negou envolvimento no atentado. Mikhailo Podoliak, conselheiros do presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, gravou um vídeo para dizer que "o país não tem absolutamente nada a ver" com o ataque. "A Ucrânia nunca usou métodos terroristas de guerra e seu único objetivo é destruir o Exército regular russo", afirmou.
<b>Pânico</b>
Informações de testemunhas e imagens de câmeras de segurança mostraram que de três a cinco atiradores vestidos em uniformes camuflados invadiram o Crocus City Hall por volta de 20h30 (14h30 em Brasília). O teatro fica em um shopping center nos arredores de Moscou e tem capacidade para 7 mil espectadores. Os ingressos para show da noite de ontem estavam esgotados.
O atentado foi amplamente filmado pelos celulares de espectadores. Imagens postadas nas redes sociais mostraram o pânico na plateia, tiros e bombas, mortos espalhados pelo chão e jovens fugindo pelos corredores da casa de shows.
Em muitos aspectos, o ataque de ontem lembrou o atentado de 2015 ao Bataclan, em Paris, quando militantes do EI mataram mais de 130 pessoas – 90 apenas na casa de espetáculos da capital francesa, durante o show da banda de rock Eagles of Death Metal.
Duas diferenças, no entanto, marcam os ataques. Na ocasião, o EI realizou uma série de atentados simultâneos em diferentes partes de Paris, enquanto a ação de ontem se concentrou no Crocus City Hall. Em 2015, dos nove militantes envolvidos, sete morreram no atentado – dois foram mortos dois dias depois pela polícia francesa. Ontem, o EI afirmou que todos os atiradores haviam escapado do local. Forças de segurança da Rússia admitiram que não encontraram os terroristas.
<b>Alerta</b>
No início do mês, a Embaixada dos EUA em Moscou tomou a medida incomum de emitir um alerta sobre um possível ataque terrorista de uma facção do EI que opera no Afeganistão, aconselhando os cidadãos americanos a evitar grandes reuniões, incluindo concertos. Na época, o Kremlin rejeitou o aviso como uma "provocação" com o objetivo de "desestabilizar a sociedade russa".
O EI é ativo na Rússia e nos cinco países muçulmanos vizinhos que compunham a União Soviética, que se tornaram terrenos férteis para recrutamento durante a guerra civil da Síria, especialmente após a intervenção russa, a partir de 2015.
No início de março, os serviços de segurança da Rússia mataram dois cidadãos do Casaquistão, perto de Moscou, que faziam parte de um plano terrorista para matar judeus. Seis terroristas do EI também foram mortos na Ingushetia, duas semanas atrás, segundo o governo russo.
A Rússia se tornou alvo frequente do terrorismo não só porque ajudou a derrotar o EI na Síria, mas também porque auxilia os serviços de segurança de seus aliados na Ásia Central a erradicar e desmontar células terroristas.
<b>Beslan</b>
O jihadismo islâmico já deixou marcas na Rússia. Em 2004, militantes chechenos cercaram uma escola em Beslan, no sul do país, tomando mais de mil reféns – incluindo 777 crianças. Após três dias de negociações, a polícia acabou invadindo o prédio em uma ação desastrada que deixou um saldo de 334 mortos – sendo 186 crianças.
O resultado foi muito parecido com o sequestro de 850 pessoas por um grupo de separatistas chechenos em um teatro de Moscou, em 2002. A decisão de invadir o local foi determinante para a morte de 132 reféns e 40 terroristas.
Ontem, os russos receberam a solidariedade pouco comum de países da Europa, como França e Alemanha, que condenaram o ataque. Yulia Navalnaia, viúva do líder opositor Alexei Navalni, que morreu em circunstâncias suspeitas em uma prisão do Ártico, em fevereiro, chamou o atentado de "pesadelo". "Todos os envolvidos nesse crime devem ser encontrados e responsabilizados", disse.
O Kremlin afirmou que Putin estava recebendo atualizações constantes sobre o ataque, principalmente a respeito da busca pelos atiradores. O governo russo se manifestou através da chancelaria para criticar os EUA, questionando a certeza dos americanos de que o atentado não havia partido da Ucrânia.
"Com base em quê as autoridades americanas tiram conclusões sobre a inocência de alguém em meio a uma tragédia?", reclamou a porta-voz da chancelaria, Maria Zakharova. "Se os EUA têm informações, deveriam compartilhá-las. Se não têm, não deveriam estar falando assim." (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>