O compositor e trompetista Jun Miyake, de 59 anos, tem um jeito peculiar de lidar com a música. Quem o vê falar de maneira tão serena, não pode imaginar o quão forte ele pode ser nos palcos. O compositor e trompetista é do tipo que carrega uma força descomunal dentro de si. O jeito contido de Miyake, portanto, é externado apenas na fala e no caminhar delicado. “É minha primeira vez em São Paulo. Já tive a oportunidade de visitar o Rio de Janeiro para uma gravação, há alguns anos. Faz dois dias que cheguei. Você, inclusive, pode me mostrar alguns números musicais daqui”, brinca o japonês em entrevista em um estúdio que fica na zona sul da capital paulista.
Nascido em Quioto, Miyake se apresenta neste domingo, dia 7, na plateia externa do Auditório Ibirapuera. O concerto, que também contará com a performance do pianista Ryuichi Sakamoto, celebra a abertura da Japan House São Paulo, novo espaço cultural localizada na Avenida Paulista.
O nome de Jun Miyake pode até parecer estranho para os mais desavisados. Quem, no entanto, assistiu atentamente ao documentário Pina, dirigido por Wim Wenders (leia mais abaixo), lembra-se com clareza da trilha sonora do longa. O filme faz uma emocionante e sensível homenagem à coreógrafa alemã Pina Bausch, que virou diretora da companhia Tanztheater Wuppertal na década de 1970 e morreu em junho de 2009. A canção Lillies in the Valley, uma das principais da produção alemã, é de autoria de Miyake. “Acho que consegui explorar toda a minha sonoridade nessa composição. O jeito melancólico e ao mesmo tempo instigante do ritmo consegue chamar a atenção do público. Acredito que escutá-la significa ficar hipnotizado. Precisei de várias referências para compô-la, inclusive a bossa nova”, afirma ainda.
Miyake é mundialmente respeitado por sua capacidade de misturar elementos aparentemente díspares. Apaixonado por bossa nova desde a adolescência, ele conta que ficou encantando pela melodia do gênero criado por João Gilberto, Tom Jobim e Vinicius de Moraes. Segundo Miyake, nada é mais bonito na música do que o ritmo cadenciado do violão à brasileira. “Lembro da primeira vez que escutei os acordes de João Gilberto. Fiquei com a melodia na cabeça e jamais fui capaz de esquecê-la. Seu país, em termos musicais, é bastante heterogêneo. A bossa nova, por exemplo, não é uma referência direta, mas, sim, indireta para minha composição. Trabalho o tempo todo com músicas dos mais variados tipos. É preciso estar sempre ligado em tudo o que acontece”, revela.
Jun Miyake trará ao Brasil o espetáculo The Here and After. Para sua primeira performance no País, ele contará com a participação dos artistas Kyoko Katsunuma, Lisa Papineau, Bruno Capinan, integrantes do Vozes Búlgaras, e um quarteto de cordas formado por músicos da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp). “Os convidados foram escolhidos a dedo. Todos, de alguma forma, têm uma relação especial com a minha música e a sonoridade que faço. O Bruno (Capinan), por exemplo, foi um cara com que me identifiquei logo de cara. A música precisa ser entendida em um contexto geral.
Ela é ampla e aberta a várias coisas”, ressalta Jun Miyake.
Passado. Apesar de hoje deter o status de estrela, Jun Miyake não teve uma adolescência muito fácil. Filho de um rígido professor de química, o jovem, então com 16 anos, não podia ouvir música em casa. Controlador, seu pai abominava qualquer tipo de barulho. Um simples abrir de porta já era suficiente para irritá-lo. Crescer em um “ambiente musicalmente” hostil fez com que Jun Miyake passasse a amar muito mais sua futura profissão. “Meu pai não suportava barulho. Lembro de uma vez que pisei mais forte na escada e ele brigou comigo. De alguma forma, isso me fez apreciar a música mais intensamente. Quando decidi sair de casa para estudar jazz, eu não recebi qualquer tipo de apoio. Hoje, entretanto, a relação é saudável”, acrescenta.
JUN MIYAKE E RYUICHI SAKAMOTO
Auditório Ibirapuera. Av. Pedro Álvares Cabral, s/nº, tel. 3629-1075. Dom. (7), 18h. Grátis.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.