O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou a exclusão de pelo menos 334 publicações em redes sociais, alegando veiculação de conteúdos falsos, desde o início da pré-campanha neste ano. Levantamento feito pelo <b>Estadão</b> mostra que decisões de ministros da Corte ordenaram a retirada de conteúdo de plataformas digitais como Facebook, Instagram, Twitter, Telegram, WhatsApp, Tiktok, Kwai e Gettr, este último popular entre adeptos de ideologias de extrema direita por não conter ferramentas de moderação de conteúdo.
No total, foram emitidas 43 decisões que têm como principal alvo publicações feitas pela campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) e por seus aliados na disputa eleitoral.
Algumas decisões do TSE contendo ordens de remoção de conteúdo têm sido questionadas por entidades da sociedade civil por, segundo elas, intervir excessivamente na seara política e na liberdade de expressão. Recentemente, a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) condenaram a decisão da Corte que determinou a retirada de 31 publicações que associavam o candidato do PT ao Palácio do Planalto, Luiz Inácio Lula da Silva, ao ditador da Nicarágua, Daniel Ortega.
Na lista das remoções está um post do jornal paranaense Gazeta do Povo. A ANJ chegou a classificar a medida do tribunal como "censura" e a Abraji afirmou que não é saudável para a democracia colocar "o Judiciário na posição de decidir sobre o que um veículo jornalístico pode ou não publicar".
Em outro caso, a Corte Eleitoral determinou que o site de notícias O Antagonista removesse um texto no qual Lula era acusado de ter ligação com o traficante Marcola, que atua como chefe da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).
<b>Excessos</b>
Para David Nemer, professor de Estudos da Mídia da Universidade de Virginia (EUA), a manifestação de associações como a Abraji, no caso da Gazeta do Povo – que fez uma postagem nas redes sociais vinculando Lula a Ortega -, evidencia possíveis "excessos" na atuação do TSE.
"Uma forma de mitigar isso é o TSE se colocar em conversa com associações de jornais e imprensa. Redes sociais não são entendidas como empresas de bem comum, diferentemente de como é vista a imprensa. Ações contra a imprensa precisam ser vistas com muita cautela", disse o autor do livro Tecnologia do Oprimido.
<b>Balanço</b>
O TSE recebeu, desde julho, 129 representações com denúncias de disseminação de fake news contra os presidenciáveis, o que corresponde à abertura de mais de um processo por dia nos últimos três meses. Nem todos os pedidos, no entanto, resultaram em decisões para retirada do ar de conteúdos que as campanhas consideraram ofensivos. Os ministros negaram a exclusão em 58 processos. Em outros 29 casos, a Corte nem sequer chegou a analisar o mérito dos pedidos.
Nas ações movidas pela campanha de Lula, o alvo mais frequente foram publicações feitas por Bolsonaro e seus aliados mais próximos, como os deputados eleitos Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Carla Zambelli (PL-SP) e Nikolas Ferreira (PL-MG), o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e a ex-ministra Damares Alves (Republicanos-DF), eleita para vaga no Senado. A candidatura petista também mirou publicações de influenciadores digitais ou usuários comuns das redes.
Uma dessas ações em que Lula conseguiu a remoção das notícias falsas compartilhadas por adversários foi contra Flávio Bolsonaro e os deputados Otoni de Paula (MDB-RJ) e Hélio Lopes (PL-RJ), que acusaram o PT de manter relações com líderes da facção criminosa PCC e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), com o objetivo de aplicar um "golpe milionário" em caso de vitória do candidato petista no próximo dia 30 de outubro. Outra postagem dizia que Lula estava associado ao STF "para matar" Bolsonaro.
Em outra ação, a federação composta por PT, PCdoB e PV obteve decisão que obrigou a remoção de publicações de Damares Alves com alegações falsas de que os governos do ex-presidente petista teriam distribuído cartilhas para ensinar os jovens a fumar crack.
A campanha de Bolsonaro, por sua vez, conseguiu tirar do ar vídeos em que Lula o chama de "genocida", assim como a propaganda do PT que compila declarações antigas com falas de Bolsonaro sobre tortura, negação da compra de vacinas e a ofensas às mulheres. Anteontem, o TSE impediu os petistas de usarem vídeo que associa Bolsonaro ao canibalismo. A propaganda petista usava uma entrevista antiga do atual presidente da República destacando frases consideradas fora de contexto.
<b>Ações</b>
O TSE conta com apenas quatro ministros fixos dedicados ao julgamento das propagandas eleitorais. No início de agosto, o presidente da Corte, Alexandre de Moraes, designou Cármen Lúcia, Maria Claudia Bucchianeri, Raúl Araújo e Paulo de Tarso Sanseverino para cuidar desses processos. Além das ações envolvendo fake news, os ministros ainda precisam analisar centenas de pedidos de direito de resposta, acusações de difamação e supostas irregularidades das campanhas.
A advogada Angela Cignachi, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), destacou que a intervenção judicial não tem a capacidade de reverter todos os danos causados pelas fake news à imagem de um candidato.
"Apesar de essas decisões serem tomadas e haver a determinação de retirada dos conteúdos, nós sabemos que não há meios tecnológicos para tirar aquele vídeo ou conteúdo de todos lugares em que se espalha, o que torna a eficácia dessas medidas bem limitada. O prejuízo para quem é atingido por uma notícia falsa ou descontextualizada que afete a honra é muito grande", argumentou a advogada.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>