A Comissão Europeia está abandonando a ideia de cotas obrigatórias de refugiados para seus Estados-membro, para tentar mudar as regras de asilo e migração da Europa após mais de quatro anos de impasse, relatou o jornal britânico <i>The Guardian</i>.
As tão esperadas propostas de imigração, adiadas pela pandemia do coronavírus, permitiriam aos Estados membros da UE escolherem se aceitam refugiados ou se encarregam de devolver as pessoas rejeitadas a seus países de origem.
Como um incentivo para receber refugiados ou requerentes de asilo resgatados no Mar Mediterrâneo, os países receberiam 10.000 (R$ 64.872) para cada adulto, financiados pelo orçamento da UE. Mas, em uma ruptura com propostas passadas, nenhum país seria obrigado a oferecer abrigo a ninguém.
Apelidado por críticos de "solidariedade à la carte", o programa visa quebrar o impasse que reina desde 2015, quando a UE obrigou a cotas obrigatórias de refugiados no auge da crise migratória.
A Hungria, mais tarde acompanhada pela Polônia, recusou-se a receber refugiados. Os dois países se juntaram a uma "coalizão de bloqueio" que impediu uma tentativa de reforma da lei em 2016 baseada em pagamentos obrigatórios para os países que se recusassem a receber requerentes de asilo.
Embora as últimas mudanças tenham o objetivo de aliviar a pressão sobre os Estados que estão na linha de frente da recepção aos imigrantes, Itália, Grécia e Espanha ainda vão manter a responsabilidade pelo gerenciamento dos pedidos de asilo.
A comissária europeia para assuntos internos, Ylva Johansson, disse que a ênfase nos retornos reflete a realidade que mudou desde 2015. "Precisamos lidar com a situação real e não com a situação que as pessoas têm em suas cabeças", disse ela a um grupo de repórteres. "A maioria das chegadas não são refugiados: dois terços das chegadas irregulares serão recusadas".
Em 2019, 491.200 pessoas foram obrigadas a deixar a UE, mas apenas 29% foram devolvidas ao seu país de origem. Johansson disse que "retornos de 100% talvez não sejam viáveis", mas havia "espaço significativo para melhorias".
Embora melhorar os retornos tenha sido uma meta da política da UE durante anos, a comissão espera injetar ímpeto ao nomear um coordenador de retornos para ajudar os Estados membros.
Johansson, a comissária europeia para assuntos internos, espera que assumir o controle pelo retorno dos imigrantes seja uma opção atraente para os governos da UE que não desejam abrigar requerentes de asilo.
Ela insistiu que a ausência de ligações históricas com o Oriente Médio e países africanos não deveria ser um obstáculo para o "patrocínio de retorno". Seu próprio país havia "investido muito no Marrocos e no Afeganistão" para encorajar esses governos a aceitar de volta seus cidadãos, disse ela. Mas os governos se tornarão responsáveis por quaisquer migrantes que eles não retornem.
Os governos que evitam a relocação e o retorno também podem optar por gastar dinheiro em outras medidas, por exemplo, o financiamento de centros de recepção em estados da linha de frente, como a Grécia. Mas a comissão seria capaz de ignorar esses gestos, se não houvesse países suficientes para fazer o trabalho pesado de recolocação e retorno. "Todos têm que fazer sua parte na solidariedade", disse Johansson.
A comissão também está prometendo processos mais rápidos: ela quer introduzir uma regra para que todas as chegadas tenham verificações de saúde e segurança concluídas em cinco dias. Apesar de um programa-piloto prometido na Grécia, não está claro se a UE tem recursos para acelerar procedimentos notoriamente lentos na Grécia e na Itália.
Os líderes da UE cortaram os gastos com migração e controle de fronteiras em 8,5 bilhões, ou 27%, quando fecharam um acordo sobre o próximo orçamento de sete anos do bloco em julho.
As propostas certamente serão alteradas nas negociações entre os legisladores da UE nos 27 estados membros e o Parlamento Europeu, e o acordo final está longe de ser certo.
Mais de cinco anos depois que Angela Merkel abriu as fronteiras da Alemanha para centenas de milhares de refugiados, a migração continua a dividir a UE, embora as chegadas sejam muito menores.
Cerca de 150.000 migrantes irregulares chegaram à UE em 2018, o nível mais baixo em cinco anos, e apenas uma fração dos 2,4 milhões que vieram viver na União europeia no mesmo período.
As terríveis condições enfrentadas por alguns requerentes de asilo, presos em campos como o Moria, recentemente incendiado, são vistas como retrato do fracasso da UE.
Às vésperas das novas propostas, a agência das Nações Unidas para os refugiados e a Organização Internacional para as Migrações advertiram que a política atual da UE era "inviável, insustentável e muitas vezes traz consequências humanas devastadoras".
Após relatos de resistências ilegais no Mar Mediterrâneo e nas fronteiras terrestres, a comissão deseja introduzir um mecanismo de monitoramento para investigar os abusos. "Para ser franca, não posso agir sobre esses relatórios, porque não tenho possibilidade de investigar", disse Johansson.
Duas ONGs, no entanto, disseram que havia "violações bem documentadas e de longa data das leis da UE", ao pedirem à comissão que iniciasse uma ação legal contra o governo grego. A Oxfam e a WeMove Europe entraram com uma reclamação legal na terça-feira, 21.
As ONGs afirmam que a nova lei de asilo do governo grego viola a legislação da UE ao negar aos requerentes de asilo um procedimento justo. "A comissão deve avaliar urgentemente se as autoridades gregas respeitam a legislação da UE e desencadeiam processos judiciais contra a Grécia por expor pessoas que buscam asilo em seu território ao sofrimento e abuso", disse Marissa Ryan, chefe do escritório da Oxfam na UE. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)