A Hidrelétrica Santa Isabel, no Rio Araguaia, ficou dez anos em processo de licenciamento ambiental e foi devolvida, em 2013, por desequilíbrio econômico financeiro do contrato de concessão. Nesse tempo, enquanto se discutia a viabilidade do projeto e os impactos que traria para a região, a área que daria lugar ao reservatório foi degradada. Dados obtidos pelo Estado, com base nos estudos ambientais do projeto mostram que, apenas no período entre 1988 e 2008, a pastagem no local aumentou 55% e as formações de florestas caíram 30,5%.
Ou seja, o mesmo cuidado que tiveram para avaliar o licenciamento ambiental não foi despendido na conservação da área. Hoje, o projeto está sem rumo. Em nota, o Ministério de Minas e Energia afirmou que ainda está estudando que encaminhamento dará para o empreendimento. Se tivesse saído do papel, a usina estaria produzindo 1.087 megawatts (MW) desde 2007 – o que daria importante alívio ao sistema elétrico, que vive sob intensa crise hídrica e financeira, com vários projetos atrasados.
A história de Santa Isabel começou em novembro de 2001, durante o maior racionamento de energia do País. O consórcio Gesai, formado por BHP Billiton, Vale, Camargo Corrêa, Alcoa e Votorantim, arrematou a usina por R$ 1,769 bilhão durante 35 anos. Naquela época, ganhava o leilão quem se comprometesse a pagar o maior valor de Uso de Bem Público (UBP) – montante que seria pago durante um determinado período.
Logo após a disputa, o consórcio iniciou o processo de licenciamento ambiental e, seis meses depois, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) afirmou que o projeto era inviável. Um dos principais pontos de divergência era que o Rio Araguaia era um dos poucos que não tinham nenhuma hidrelétrica e que, portanto, deveria continuar assim, afirmou uma fonte que participou das negociações. O entendimento era que a construção da usina traria muitos impactos, com aumento populacional e desmatamento.
Os estudos ficaram parados até 2008, quando o grupo entrou em consenso com o Ibama sobre o termo de referência para elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA-Rima). Os relatórios com as exigências feitas pelo órgão foram entregues em 2010 e, em 2012, o Ibama liberou os estudos para início das audiências públicas. Nessa altura, porém, os problemas eram outros: a tentativa de prolongar o contrato de concessão.
Rescisão contratual
O demorado processo de licenciamento ambiental havia consumido tanto tempo do período de concessão que a viabilidade econômico-financeira foi comprometida. Dessa vez, no entanto, as negociações com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e com o Ministério de Minas e Energia não chegaram a um consenso e a rescisão do contrato foi assinada em 29 de janeiro de 2014. Ou seja, leiloada em 2001, a Hidrelétrica Santa Isabel ficou 10 anos em licenciamento ambiental e, mesmo assim, não saiu do papel. O projeto foi devolvido porque, com a demora no licenciamento, o prazo do empreendimento ficou inviável economicamente.
Mas, apesar do longo tempo de processo ambiental, a região que receberia o reservatório foi transformada. Um mapa do local em três momentos diferentes mostra que a área urbana e a pastagem no local onde seria a represa aumentaram enquanto as formações de florestas diminuíram drasticamente. Em 1988, o espaço tinha 57% do total referente à formação de floresta e 31,72% de pastagem. Depois de 20 anos, os porcentuais de floresta caíram para 39% e o de pastagem subiram para 49%.
Com a devolução do projeto, o governo federal prometeu fazer uma nova licitação. Até hoje, porém, não há sinal de que isso vá ocorrer. O fato é que a usina não foi construída, mas os temidos impactos que ela traria para a região ocorreram. Além do aumento da pastagem e da queda na formação de florestas, a área urbana praticamente dobrou de tamanho e o cerrado caiu 6%. Mas a consultora Maria Cecília Wey de Brito, ex-executiva do WWF, faz algumas ponderações sobre a mudança na área.
Segundo ela, é preciso avaliar se a degradação ocorrida não é efeito da própria expectativa em torno da construção da hidrelétrica. “Os donos das terras, pensando que a área seria alagada pelo reservatório, podem ter acelerado o desmatamento”, avalia. Outro ponto levantado é a questão da qualidade dos estudos apresentados pelos empreendedores, que muitas vezes atrasam o processo ambiental.
Em nota, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) destacou que o projeto não recebeu licença prévia do órgão. Afirmou ainda que, se “de fato houve alteração significativa dos atributos ambientais da região, o estudo deverá ser atualizado, com repercussões nas condições de implantação e operação da usina”.
Ou seja, se o governo decidir colocar a usina em leilão, os estudos ambientais terão de ser refeitos, partindo do zero. Considerando as experiências passadas, isso poderá demorar alguns anos. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.