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Vencedora do Urso de Ouro fala sobre a difícil trajetória de um filme

Chamada às pressas pela organização do festival, a húngara Ildikó Enyedi levantou-se às 4 da manhã de sábado em Budapeste e tomou o avião para a capital alemã. À 1 da tarde, já havia recebido, por On Body and Soul (De Corpo e Alma), três dos mais importantes prêmios dos júris independentes – melhor filme da crítica (Fipresci), prêmio do público, atribuído pelo jornal Berliner Morgenpost, e prêmio ecumênico. Quando o repórter a cumprimentou, no salão do Hotel Hyatt em que se realizava a premiação, disse que estava mais surpresas que cansada. “Isso tudo é tão inesperado”, acrescentou. “Demorei tanto parta conseguir fazer esse filme.” Mas ainda faltava o gran finale. À noite, no Berlinale Palast, o presidente do júri, cineasta Paul Verhoeven, lhe entregou o prêmio máximo da 67ª Berlinale – o Urso de Ouro. No palco, fez um agradecimento simples. O filme nasceu de uma forma muito solitária. “Todo mundo carrega suas feridas. O fato de haver me comunicado com diferentes níveis e plateias da Berlinale é a prova de que estava certa ao precisar fazer esse filme como fiz.”

Ildikó não é nenhuma menina. Em 1989, em Cannes, venceu a Caméra dOr, a Palma de Ouro do melhor filme de diretor estreante, com My Twentieth Century. Desde então, fez poucos filmes. Demorou dez anos para realizar De Corpo e Alma. O festival começou dia 9, o filme passou dia 10. Foi a primeira entrevista realizada pelo repórter na Berlinale de 2017. Ildikó explicou – “na verdade, o roteiro foi muito fácil de escrever, saiu quase de um jato. O problema não foi esse. Em 2006, o Instituto de Cinema da Hungria entrou em colapso e a produção foi paralisada. Tive de esperar alguns anos pela retomada da produção, e mais um ou dois para ver que o novo esquema não estava fechado em grupos. Minha carreira tem sido estranha. Depois do sucesso de Meu Século 20, e do prêmio em Cannes, todo mundo queria filmar comigo. O problema é que meu filme mais caro e ambicioso, Simão e os Mágicos, foi um fracasso de público e me marginalizou.” Terminou indo para a TV, contratada pela HBO para fazer as versão húngara de In Treatment.

Desde o primeiro tratamento do roteiro, De Corpo e Alma já era o que é – a história de um homem e uma mulher num matadouro. Ela é fiscal de qualidade, ele, diretor financeiro. Carregam suas feridas, e ele as sequelas de um ataque que deixou seu braço paralisado. Quase não se comunicam no cotidiano, mas compartilham o mesmo sonho, no qual formam um casal – e de cervos, numa floresta bela e misteriosa. “O roteiro mudou pouca coisa ao longo de todo esse tempo, quase nada. As mudanças se deram quase todas nos personagens secundários. Sempre fui atraída pelos significados mágicos da existência. Não creio que somos produtos do meio social, ou pelo menos filmo para criar novas possibilidades. Quais as forças, sejam cósmicas ou terrestres, que podem mudar nossas vidas? Tem gente que me relaciona a (Andrei) Tarkovski, que diz que busco a transcendência.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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