Enquanto tenta atacar os problemas de seu prédio centenário, que está em obras para a recuperação da fachada e segue com ar condicionado claudicante, a Biblioteca Nacional investe em sua vertente na internet. Criada há dez anos, a BN Digital (https://bndigital.bn.gov.br) reúne hoje 15 milhões de documentos, entre fotografias, mapas, documentos oficiais e edições de jornais e revistas. A coleção inclui as obras raras do acervo, cujo núcleo original foi trazido em 1808 por d. João VI ao Rio, e hoje é acessado online por pesquisadores de todo o mundo.
Voltada à preservação da memória documental brasileira, a maior biblioteca digital do País tem coleções que começaram a ser escaneadas em 2001, no próprio prédio da Cinelândia, e que hoje estão em domínio público (em sua maioria). O usuário, que no passado só tinha contato com o acervo presencialmente, pode baixar os arquivos em alta resolução, para usá-lo em pesquisas acadêmicas, trabalhos escolares ou outros fins. Até em telas de celulares é possível ter boa visualização.
O material é preparado para ir para a internet por digitalizadores, bibliotecários, historiadores e arquivistas da BN. A relevância e vastidão do conjunto é tamanha que ele integra o Programa Memória do Mundo, da Unesco. O projeto identifica documentos importantes para a preservação da história da humanidade. Este ano, a capacidade de armazenamento, de 320 terabytes, será dobrada.
“Queremos que a BN Digital seja um Google da memória brasileira, reunindo todos os acervos memoriais do Brasil”, diz a presidente da Fundação Biblioteca Nacional, Helena Severo. Ela cita instituições parceiras que participam da coleção Brasiliana Iconográfica, a ser disponibilizada no segundo semestre (Instituto Moreira Salles, Pinacoteca de São Paulo, Itaú Cultural e Museus Castro Maya).
A navegação na BN Digital é simples, e o zoom permite a observação de detalhes de documentos. “Na foto da missa campal que comemorou a Abolição da escravidão, em 1888, a ampliação permite que sejam vistos os rostos da Princesa Isabel, do Conde DEu e de Machado de Assis”, exemplifica a coordenadora da BN Digital, Angela Bettencourt, que trabalha com a modernização do acesso ao acervo desde 1983. “Não há acervo que conte a história do Brasil através de documentos, manuscritos e fotos como este.” As pesquisas chegam a 500 mil por mês.
Um exemplar da Bíblia de Mogúncia, impressa em 1462 por Gutenberg na Alemanha, está lá, como a carta de abertura dos portos brasileiros às nações amigas, assinada por d. João VI em 1808, e o maior conjunto de periódicos do Brasil, a Hemeroteca Digital Brasileira, que tem desde o primeiro exemplar do primeiro jornal impresso no território brasileiro, a Gazeta do Rio de Janeiro, de 10 de setembro de 1808. São cerca de 14 milhões de páginas de 5 mil veículos.
Como a BN faz registro de direitos autorais de obras intelectuais desde 1898, seu acervo tem preciosidades, como a partitura original do “tango carnavalesco” Pelo Telefone, de Donga e Mauro Almeida, de 1916, considerado o primeiro samba registrado no Brasil, e manuscritos de compositores como Carlos Gomes e Ernesto Nazareth, entre muitos outros. Outro tesouro é a Coleção Thereza Christina, de 21.742 fotografias, formada por d. Pedro II no século 19. A coleção constitui um painel das primeiras décadas da história da fotografia, técnica da qual o imperador era entusiasta.
Parte desse acervo hoje está exposta ao calor que faz no prédio da BN, cuja sede não conta com refrigeração em todos os seus cinco andares. Para amenizar as altas temperaturas, que tornam os dias de verão desagradáveis para funcionários e usuários desde que o sistema de ar condicionado começou a falhar, há seis anos, a presidente, no cargo há cinco meses, determinou o conserto emergencial de 45 aparelhos portáteis.
O sistema de ar da BN tem cerca de 30 anos de uso e a manutenção não é eficiente. Em dias de sensação térmica de mais de 40 graus nas ruas, não dá conta. Servidores classificam o cenário como “limite”.
“A situação não é ideal, mas também não é catastrófica. Há áreas razoavelmente frescas e outras que estavam como uma estufa, e estamos tentando amenizar. Não quero criar falsas expectativas”, pondera a presidente. Ela acredita que só em 2019 o edifício, datado de 1910 e tombado, estará todo adequadamente refrigerado.
A fachada, que chegou a sofrer perda de reboco anos atrás, está em obras. O interior do prédio vai sofrer intervenção na parte elétrica, para que o sistema do ar seja redimensionado – a licitação deve estar pronta no mês que vem. Além dessas reformas e dos investimentos da BN Digital, estão no horizonte a adequação do galpão que a BN tem na zona portuária, para onde a hemeroteca deve ser transferida, um incremento da participação da BN em feiras literárias internacionais e a organização de cinco grandes exposições em sua sede, que deem visibilidade ao acervo.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.