A vitória contestada de Nicolás Maduro nas urnas deixou a Venezuela mais perto de um "banho de sangue" – exatamente como previu o ditador, se ele perdesse a eleição. Em dois dias de protestos contra os resultados da votação, 16 pessoas morreram, mais de 100 ficaram feridas e 750 foram presas.
De acordo com Alfredo Romero, diretor da ONG Foro Penal Venezolano, das 16 mortes, pelo menos cinco foram registradas em Caracas, incluindo dois menores de idade. O procurador-geral da Venezuela, o chavista Tarek William Saab, afirmou que os manifestantes presos poderão responder por "atos de terrorismo e instigação do ódio".
A ditadura foi rápida em culpar a oposição pelo "banho de sangue". "Considero Urrutia responsável pela violência criminosa, pelos feridos, pelos mortos, pela destruição. O senhor será diretamente responsável, assim como a senhora Machado. A justiça vai chegar", disse Maduro, em referência aos dois maiores nomes da oposição nesta eleição: Edmundo González Urrutia e María Corina Machado.
As declarações de Maduro foram a senha para que seus apaniguados colocassem mais lenha na fogueira. Jorge Rodríguez, presidente da Assembleia Nacional, controlada pelo chavismo, pediu ao Ministério Público que prenda María Corina e Urrutia. Em alguns casos, o regime foi além das ameaças e de fato colocou dissidentes atrás das grades.
<b>Prisões e cerco</b>
Agentes da polícia antissequestro prenderam Freddy Superlano, dirigente do partido Voluntad Popular, em Caracas. A repressão também afetou seis outros opositores, que haviam se refugiaram na embaixada argentina, em março: Pedro Noselli, Humberto Villalobos, Claudia Macero, Omar González, Fernando Martínez e Magalí Meda, todos membros do comitês de campanha de María Corina.
Em carta ao governo do argentino Javier Milei, a chancelaria chavista negou nesta terça-feira, 30, salvo-conduto para que os seis deixem a Venezuela e deu 72 horas para que todos se entreguem. O edifício da embaixada da Argentina, localizado em Chacao, área nobre da capital, foi cercado e a luz, cortada. O temor era de que Maduro decida ordenar uma invasão.
O caso ameaça isolar ainda mais a Venezuela no continente. Anteontem, o regime expulsou o corpo diplomático de sete países: Panamá, República Dominicana, Argentina, Chile, Costa Rica, Peru e Uruguai – todos haviam contestado o resultado da eleição. Ontem, Maduro também mandou suspender os voos comerciais vindos do Panamá e da República Dominicana – reduzindo ainda mais as ligações aéreas da Venezuela com o exterior.
Com o agravamento da crise diplomática, a OEA marcou para esta quarta-feira, 31, uma reunião de emergência a pedido de 11 países – o Brasil ficou de fora. Ontem, o secretário-geral, Luis Almagro, chamou o resultado da eleição de "manipulação aberrante". "Ao longo do processo eleitoral, vimos a aplicação pelo regime venezuelano do seu esquema repressivo, complementado por ações destinadas a distorcer o resultado", afirmou Almagro.
<b>Centro Carter</b>
O Centro Carter, uma das poucas instituições independentes autorizadas a observar as eleições venezuelanas, cancelou ontem a divulgação de um relatório preliminar sobre a votação e optou por retirar toda a sua equipe da Venezuela.
A ONG, fundada pelo ex-presidente americano Jimmy Carter, especializada no monitoramento de eleições, exigiu que o governo venezuelano publique os resultados da disputa de domingo, 28, em cada centro de votação, alegando que os dados detalhados são fundamentais para determinar a lisura do processo.
Brasil, EUA e Colômbia estariam em compasso de espera, aguardando o parecer do Centro Carter para decidir qual posição tomar sobre a legitimidade da vitória de Maduro. "O Centro Carter fez um apelo ao Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela para que publique imediatamente os resultados das eleições em cada colégio eleitoral", declarou a instituição, em nota. Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou pela primeira vez sobre o tema e minimizou a crise na Venezuela.
<b>Apoio</b>
Embora a posição de Maduro tenha se deteriorado fora da Venezuela, dentro do país ele recebeu o apoio que mais lhe interessa: do Exército. O ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, expressou sua "absoluta lealdade ao presidente".
De acordo com ele, os protestos que contestam o resultado das urnas "são um golpe de Estado" da extrema direita. "Maduro é o nosso comandante-chefe, legitimamente reeleito pelo poder popular e proclamado pelo poder eleitoral", disse Padrino López, que garantiu ter ordens de Maduro para reprimir os protestos populares, descritos por ele como "absurdos" e "implausíveis". (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>