Como desdobramento do atentado, uma série de leis aprovadas em torno da palavra de ordem “guerra ao terror” reduziram a liberdade e a privacidade de cidadãos nos Estados Unidos, especialmente de estrangeiros. A Europa também seguiu essa tendência. Foram definidos, em todo o mundo, novos mecanismos e protocolos de controle nos aeroportos: revista mais minuciosa das bagagens, uso de detector de metal, restrição a líquidos na mala de mão. A tecnologia foi aprimorada para aprofundar o monitoramento, com scanners corporais, detectores de explosivos e outros equipamentos.
“Assim como o final da Guerra Fria inaugurou uma nova era nas relações internacionais, o atentado de 11 de setembro também simbolizou uma ruptura na forma como se analisava a segurança internacional. A ideia de inimigo transacional, desterritorializado e que pode causar um caos e muitas mortes sem ter o domínio de armas bélicas sofisticadas trouxeram novos parâmetros para o planejamento de segurança dos Estados, reforçando a importância da cooperação internacional”, observa a cientista política Ariane Roder, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Segundo Thiago Rodrigues, pesquisador em relações internacionais e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), o desenvolvimento da tecnologia de segurança colocado em marcha após o 11 de setembro gerou e continua gerando mecanismos de controle das populações, como a biometria e os variados dispositivos para monitoramento do espaço urbano.
“Quem começou a viajar nos últimos 20 anos, principalmente as pessoas mais jovens, não sabe como era antes. Hoje temos diversas camadas de controle, que vão desde a emissão de vistos até as revistas rigorosas nos aeroportos. Mas com exceção dos grupos capturados na iminência de um atentado, não dá pra saber exatamente quantos ataques foram inibidos por essas medidas de segurança. Então os efeitos realmente mensuráveis não são os efeitos sobre os terroristas, mas sobre nós. Mesmo que o terrorismo sumisse hoje, essas tecnologias criadas em nome do combate ao terrorismo não seriam abandonadas”, avalia.
Jorge Lasmar considera que o terrorismo exige que o mundo se mantenha vigilante. “A gente continua tendo atentados e algumas dessas regras conseguem impedir novos ataques.”
No entanto, ele também vê efeitos colaterais que decorrem desse ambiente de controle, como a construção de muros entre os países. “As fronteiras do mundo estão mais fechadas. Temos mais fronteiras físicas entre os Estados do que tínhamos depois da Segunda Guerra Mundial. Há a questão dos refugiados e as dificuldades para o reconhecimento de asilo. A exigência de vistos diante do fluxo de pessoas.”
Em meio a toda essa vigília das populações, os pesquisadores veem um fortalecimento dos estereótipos contra imigrantes provenientes de países considerados como uma ameaça aos valores ocidentais, como a democracia e a liberdade individual.
“Isso tem gerado um outro tipo de extremismo, que tem motivação étnica. Está ligado aos movimentos de supremacia branca, que se alimentam dessa retórica estereotipada contra as pessoas do Oriente Médio. É algo que cresceu muito nos últimos anos no mundo ocidental. E ainda se fala pouco disso. Ainda há um pudor em reconhecer esses grupos como grupos. Mas fechar os olhos para essa questão é um problema, porque esse movimentos vão ganhando força”, observa Lasmar.
Impactos militares
O atentado também revelou sofisticações nos modos de operar de grupos terroristas. Um aspecto que chama a atenção foi a dificuldade encontrada para localizar Osama bin Laden, líder da Al-Qaeda e apontado como o idealizador dos ataques. Mesmo empregando a mais avançada tecnologia, foram necessários quase 10 anos para que as forças norte-americanas o localizassem. Sua morte foi anunciada em maio de 2011.
A guerra ao terror se desdobrou em outras ações militares como a ocupação do Iraque em 2003, país que era comandado por Saddam Hussein desde o final da década de 1970. Na época, Estados Unidos e Inglaterra diziam deter provas de que o país guardava um grande arsenal de armas de destruição em massa que representava um perigo à população mundial. Saddam foi enforcado em 2006, mas as armas nunca foram encontradas. Os dois governos que lideraram a ocupação afirmaram, posteriormente, que confiaram em informações que se mostraram falsas.
As incursões militares no Oriente Médio não eliminaram os grupos terroristas. Nos últimos anos, o Estado Islâmico tem se tornando uma peça-chave nos conflitos que se desdobram na região, sobretudo na Síria, no Iraque e no Afeganistão.
A retomada do poder do Talibã no Afeganistão, na visão de Ariane Roder, retrata a ineficácia do uso de instrumentos clássicos de guerra para lidar com a situação. Segundo ela, as soluções requerem muito mais do que o uso da força.
Ela também observa que há uma dimensão de resistência cultural que alimenta os grupos terroristas. “A utilização realizada por alguns grupos terroristas da religião extremista como instrumento de aliciamento e construção do poder causou um distanciamento ainda maior entre culturas do Ocidente e Oriente, com desconfianças, preconceitos e desrespeitos”, acrescenta.
Para Jorge Lasmar, os Estados Unidos apostaram equivocadamente em um investimento maciço de propaganda sobre sua própria sociedade.
“Buscaram disseminar os valores americanos. Mostraram como a democracia ocidental é legal, como a vida no país é legal, como a liberdade não comporta o terrorismo. Mas muito disso não foi bem recebido não só no mundo muçulmano, mas em todo o mundo oriental. Era uma cultura exógena. E há outros caminhos. Diversos líderes muçulmanos são capazes de mostrar que não há nada na religião islâmica que legitime o terrorismo.”
Lei nacional
No Brasil, na véspera dos Jogos Olímpicos sediados pelo Rio de Janeiro em 2016, foi aprovada uma Lei Antiterrorismo (Lei 13.260/2016). Havia um temor de que se repetissem cenas ocorridas dois anos antes, na Copa das Confederações de 2014, quando uma forte onda de manifestações resultou em cenas de violência e assustou turistas. Foi definida como terrorismo qualquer ação motivada por razões de xenofobia, racismo, etnia e religião, que tenha por objetivo causar terror social a partir do uso, transporte ou armazenamento de explosivos; gases tóxicos; conteúdos químicos, biológicos e nucleares; ou outros meios que possam promover a destruição em massa.
Essas ações podem envolver sabotagem ou ameaça em meios de transporte, portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares e instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias.
Segundo Thiago Rodrigues, a lei incorpora uma perspectiva de terrorismo disseminada de forma global. “Em parte, é resultado de uma pressão que tem a ver com o 11 de setembro. É uma pressão que vem do Comitê Olímpico Internacional, de alguns países específicos como os Estados Unidos e também do capital privado que investe e patrocina os eventos esportivos. Houve uma cobrança por medidas afinadas com as expectativas de países mais envolvidos na guerra contra o terrorismo”.
Ao mesmo tempo, ele observa a presença de outros componentes que não têm relação com o 11 de setembro. “Há outra parte que tem mais a ver com o nosso ambiente político. Há muitos anos de pressão de segmentos da sociedade e de uma ala do Congresso para se ter um maior controle de movimentos sociais consolidados no país. E a lei é ambígua o suficiente para deixar brechas. Dependendo da interpretação, pode ser usada para tentar criminalizar movimentos sociais.”
Jorge Lasmar vê pontos positivos e lacunas no texto da Lei Antiterrorista. “Caminhou numa direção certa de não de designar terroristas e, sim, atos terroristas. Há um excludente explícito dizendo que movimentos sociais não podem ser caracterizados com grupos terroristas. Pode-se até discutir se isso seria redundante, mas as legislações antiterroristas possuem um alto custo social, que pode ensejar maior militarização da polícia e aumento de força do Poder Executivo, o que faz com que esse tipo de resguardo seja positivo. Mal não faz. Movimento social não tem nada a ver com terrorismo”, explica.
“Mas o conceito de ato terrorista no artigo 2º o vincula a uma motivação de discriminação racial, étnica, religiosa. Isso pode ser problemático porque existe um terrorismo político onde não há essa instância de discriminação”, completa o especialista.
quem sabe, daqui a vinte anos NÃO SAIBAMOS A VERDADE …
aliás, não só sobre isto mas tb sobre coisas que aconteceram vinte anos após isto
(obs► não se cobrará que IDIOTAS ÚTEIS ENTENDAM)