50 anos de Arte Sacra

Muitos acontecimentos, alguns pitorescos, marcam os 50 anos do Museu de Arte Sacra de São Paulo, comemorados hoje sem festa. Planejada antes da pandemia, a grande exposição que marcaria a data foi adiada por causa da quarentena e só deverá abrir em 2021. Pena. O público perde a oportunidade de ver este ano 300 peças raríssimas emprestadas por colecionadores particulares para a mostra, cujo curador é o respeitado crítico Fábio Magalhães.

O museu está temporariamente fechado, mas segue com planos de expansão nos próximos anos. Instalado no Mosteiro da Luz, o convento de monjas enclausuradas da Ordem das Concepcionistas da Imaculada Conceição é um dos prédios mais bonitos do centro histórico, mas ainda pouco conhecido do grande público, apesar de sua importância arquitetônica e histórica – o convento é a única edificação colonial do século 18 em São Paulo que preserva sua estrutura e materiais originais.

Os frequentadores conhecem sua história, mas apenas uma parte ínfima do riquíssimo acervo do museu, que tem, entre outras peças valiosas, esculturas do mestre barroco Aleijadinho (1738-1814) e do frei beneditino Agostinho de Jesus (c. 1600-1661). Segundo o diretor do Museu de Arte Sacra, José Carlos Marçal, ele consegue exibir apenas de 14% de seu acervo, o que faz de forma rotativa por causa dos limites físicos do espaço expositivo.

A reserva técnica do museu, instalada num prédio alugado, é também pequena para abrigar os 18 mil itens de seu acervo, que tem a segunda maior coleção de lampadários do mundo (a primeira é do Museu do Vaticano) e abriga vários presépios de diferentes origens e períodos, sendo o mais impressionante um exemplar napolitano do século 18 com 1.620 peças.

Alguns passos já foram dados para levar esse acervo ao grande público. Na estação Tiradentes do metrô foi aberto um espaço para mostrar aos usuários o que existe a poucos metros do burburinho subterrâneo. O interior do Museu de Arte Sacra é quase uma extensão da clausura: silencioso, imaculado, com um pátio interno que convida à meditação em pleno centro de São Paulo.

Por ocupar parte de um convento, o Museu de Arte Sacra é comumente associado à iconografia cristã, mas, observa seu diretor, outras religiões foram contempladas com exposições em sua sede, como Urubu Ka`apor – A Arte Primária Indígena (2018), ou A Outra África (2020), com arte da corte de Benin, que representa 29 etnias africanas.

"A arte e a Igreja têm uma relação de séculos e fica difícil para o público dissociar o museu de uma instituição católica, a despeito de mostras como essas, que atraíram bom público, mas não o suficiente para manter o museu", diz Marçal.

Com orçamento anual de R$ 8 milhões, reduzido durante a pandemia, o museu poderia até ter uma presença internacional se não dependesse apenas dos recursos provenientes da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo. "Os russos ficaram interessadíssimos na exposição Urubu Ka`apor, com adornos e objetos litúrgicos e cerimoniais de várias etnias brasileiras, mas ficava muito caro levar a mostra para fora do Brasil", justifica.

Doações o museu só recebe em peças artísticas quando alguma família generosa abre mão de obras colecionadas pelos antepassados. Para fazer uma nova reserva técnica, que seria construída como anexo do museu, seriam necessários R$ 15 milhões, calcula o diretor Marçal, no cargo desde 2013.

Cobrando R$ 6 o ingresso, não é difícil imaginar quantas décadas seriam necessárias para concretizar o projeto. Uma solução alternativa encontrada por Marçal para dar visibilidade ao museu veio na forma de réplicas do acervo em 3D: essas obras podem ser emprestadas sem nenhum risco para o museu, da moeda de Alexandre, o Grande à Nossa Senhora das Dores de Aleijadinho. E já viajaram para outras cidades, como Iguape.

Os riscos num museu que tem obras tombadas pelo Patrimônio são grandes. Há algum tempo, uma senhora muitos quilos acima do peso se debruçou sobre o altar do Cristo morto e derrubou o seu tampo.

Na exposição Il Cristo Velato (2015), projeção volumétrica da escultura homônima do século 18, feita pelo artista napolitano Giuseppe Sanmartino (1723-1793) para a Capela Sansevero, de Nápoles, a imagem do Cristo era tão real que a parede amanheceu com marcas de batom de piedosas.

É difícil explicar ao público que um museu não é exatamente um templo de devoção. Mas a direção tenta: promoveu até um curso dedicado ao estudo da obra do filósofo existencialista Jean-Paul Sartre, que lotou o museu. Sartre podia não ser crente, mas considerava Genet um santo mártir. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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