O retiro de pouco mais de um ano em Lisboa rendeu ao casal Marcelo Camelo e Mallu Magalhães um outro episódio em suas histórias. Ao lado do baterista português Fred Ferreira, de produções mais eletrônicas e percussivas, como as que faz nos coletivos Buraka Som Sistema e Orelha Negra, eles criaram a Banda do Mar. O primeiro disco, com novas de Mallu e Marcelo, sai esta semana, e a turnê começa em 10 de outubro, em Porto Alegre, e vai até 9 de dezembro, em Goiânia. São Paulo vê o trio dia 31 de outubro, na nova casa Áudio Club, na Barra Funda.
Em poucas linhas, ou em uma palavra, trata-se de um disco mais otimista, ou “ensolarado”, se comparado com trabalhos dos Los Hermanos e do Buraka. Gravado com linhas de baixo e bases de violão colocadas em estúdio, o que se ouve é essencialmente um som de trio, seco e roqueiro, com solos de Camelo que muitas vezes lembram a surf music dos anos 1960. O jornal O Estado de S.Paulo encontrou os três na tarde dessa segunda-feira, 1, na sede da gravadora Sony, em São Paulo.
Questinados se já sabiam o que queriam quando entraram no estúdio, Mallu diz que “olhando agora, eu consigo identificar as nossas intenções diretamente relacionadas com o resultado ensolarado, expansivo, mais comunicativo. A gente estava mesmo nesse momento, sabe? Os três felizes, tantas coisas bonitas acontecendo, o Fred com estúdio novo (onde o disco foi gravado), eu e Marcelo conhecendo um país, a nossa vida juntos. Acho que o disco refletiu esse momento”.
Há letras que apontam para uma autobiografia. Mallu faz Me Sinto Ótima (Eu me achei no colo do meu par / A melhor parte de mim eu acabei de descobrir / E se perguntarem por mim / Diga que eu estou ótima). Depois, vem Marcelo com Faz Tempo (Faz tempo que eu quero descansar / E veras coisas por aí / Viver conforme o que vier / Só precisar do que eu tiver). Olhando agora o quadro que vocês pintaram, o que ele quer dizer? Marcelo diz que “eu não faço uma letra há muito tempo mirando em um objeto único, com começo, meio e fim. É quase como reconhecer na existência de todas as coisas uma parte de mim, fazer essas associações livres entre elas. Tento ver se consigo revelar para mim mesmo coisas sobre mim”.
A referência a Los Hermanos é natural e, se olharmos em comparação, a Banda do Mar é muito menos reflexiva, mais divertida. A palavra seria despretensiosa? Marcelo diz que “não sei, temos tantas pretensões também… A criação está ligada aos nossos sentidos, ao que percebemos ao redor. Há uma influência de lugar, de nosso estado de espírito, mas pode ser também uma projeção do que queremos alcançar. Às vezes, estar ali pregando algo feliz é só um bote salva-vidas para você mesmo. Gritar um viés de felicidade não quer dizer necessariamente que você esteja feliz. Sobre soar biográfico, acho bonito que se possa trazer alguma orientação de estado de espírito. Faz sentido”.
Os universos fogem um pouco do que fazem em outros trabalhos. Fred faz uma bateria de rock, mais orgânica, e Marcelo faz vários solos que lembram a surf music dos anos 1960. A reportagem questinou se ouviram como inspiração. Segundo Fred, “ouvimos Beatles, sempre muito importantes, e gostamos de Growlers (quinteto californiano). Mas acaba sendo um conjunto de tudo o que sempre escutamos”.
Já para Marcelo”o Matt (Taylor), do Growlers, tem um jeitinho de tocar no canto esquerdo, guitarras doces, fazendo paisagens. Gosto também do Pedro Sá, do (Rodrigo) Amarante, as guitarras dos filmes do Tarantino… O Fred disse uma coisa lá no início que eu acho que norteou o trabalho na hora da composição e de fazermos os arranjos. A gente não estava em busca de uma estética mirabolante, queríamos o contrário, e o Fred disse de como nas músicas dos Beatles a próxima nota é aquela que você quer ouvir. Você a antevê, você a espera, e ela acontece. É uma sequência disso o tempo inteiro, e eles nunca te dão uma rasteira. A gente ficou com isso na cabeça, foi uma orientação. Queríamos algo que tivesse essa fluidez, que não se valesse do artifício da surpresa para construção da sua figura”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.