Variedades

Latão festeja 18 anos de pesquisa cênica

Em julho de 1997, alguns dos artistas que participaram da montagem da peça Ensaio Sobre Danton (encenada no ano anterior) se reuniram com o diretor Sérgio de Carvalho e decidiram montar uma companhia – eles já ensaiavam um novo espetáculo, o texto teórico A Compra do Latão, de Brecht, e motivados para realizar uma pesquisa artística de longo prazo, fundaram a Companhia do Latão, um dos mais importantes grupos teatrais brasileiros, que comemora seus sólidos 18 anos a partir desta sexta, 3, no Sesc Bom Retiro.

Será um evento que vai ocupar o mês inteiro. Nesta sexta, 3, e sábado, 4, por exemplo, acontece o programa Clássicos do Latão, em famosas cenas de espetáculos passados serão reencenadas e comentadas. Já no dia 5, está previsto o Cancioneiro do Latão, show com canções de diversas peças da história da companhia, comentadas pelo diretor musical Martin Eikmeier. O grande evento, porém, é a estreia, no dia 11, da nova montagem, Os Que Ficam, inspirada no trabalho de Augusto Boal.

A trama retrata um grupo de teatro que ensaia Revolução na América do Sul – texto que Boal escreveu em 1960 – no início dos anos 1970. “A peça é uma tentativa de retrato de um certo momento do teatro político no Brasil, quando os avanços da arte do teatro na década de 1970 foram arrebentados pela violência da ditadura, pelas pressões da sobrevivência econômica, pelas visões culturalistas da nova arte de esquerda e mesmo pela desconfiança em relação às antigas categorias políticas da cultura nacional-popular”, diz Carvalho. “Era um exercício de leitura que virou um espetáculo simples, mas muito sincero no que diz respeito às nossas próprias dificuldades de seguir trabalhando na contramão dos padrões convencionais de teatro.”

De fato, desde seu nascedouro, a Companhia do Latão sempre buscou uma prática dramatúrgica e cênica que se aproximasse das questões ligadas à vida social no Brasil de hoje. “O momento em que o Latão surge foi o de uma retomada do trabalho coletivo, experimental, colaborativo”, continua o diretor. “Havia uma reação à divisão exagerada do trabalho teatral, ao centralismo estético do encenador, às concepções artísticas prévias, em favor de uma cena partilhada, que surgisse de um aprendizado comum. Como decorrência dessa coletivização da pesquisa, houve também um questionamento temático. Acho que aí o Latão exerceu um papel importante ao anunciar seu interesse por assuntos brasileiros, não movido por qualquer nacionalismo, mas por vontade crítica de entender o modo com que processos mundiais de modernização rebatem por aqui, aprofundando nossa miséria local.”

Um dos aspectos positivos da Companhia é o de, ao encenar algum texto clássico, promover uma mudança no original que, mesmo não o descaracterizando, oferece uma nova visão daquele texto, muitas vezes até mais crítica e até contrariando alguns detalhes do original. “O texto clássico pede da equipe atual uma atitude clássica, isto é, uma capacidade de dialogar com várias épocas ao mesmo tempo, com o antigo e o novo, avaliando interações e diferenças”, diz Carvalho. “A dificuldade é que qualquer mudança num grande texto exige uma intervenção dramatúrgica à altura do original, para que não haja descaída estética, o que não é fácil.”

O mês de comemorações no Sesc Bom Retiro será completado com a exibição em vídeo de um dos mais arrojados projetos do Latão, Ópera dos Vivos, que uniu teatro, música e cinema para abordar a produção cultural dos anos 1960 até os dias de hoje, tendo como fio condutor uma reflexão sobre a mercantilização do trabalho artístico atual e sua ideologia. Os dois primeiros atos serão apresentados no dia 15 e os dois últimos, no dia 22. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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