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Babenco: Sem papas na língua, mas um cinéfilo, sempre

Em outubro passado, Hector Babenco estava feliz por apresentar Meu Amigo Hindu na abertura da 39ª Mostra Internacional de Cinema, em SP. Em fevereiro, quando o filme foi lançado, aparentava sinais de cansaço, mas podia-se pensar que era pela tensão da estreia. Depois, os boatos começaram a surgir. A doença voltara – linfoma. Estava debilitado. Agora é fato. Morreu o grande diretor de Pixote, a Lei do Mais Fraco, de 1982, Lúcio Flávio, Passageiro da Agonia, 1977, Carandiru – O Filme, 2003.

Argentino, nasceu em Mar del Plata, em 7 de fevereiro de 1946 – 70 anos, portanto. Aos 19, radicou-se no Brasil. A trajetória, e o tortuoso caminho que fez do cinéfilo um cineasta, foi contada em Coração Iluminado, de 1998. Babenco estreou em 1975 com O Rei da Noite, com Paulo José e Marília Pêra, seu filme brasileiro-portenho. É curioso que, de certa forma, tenha vivido sempre divertido. Judaico-craniano, brasileiro-argentino. Ético, ao fazer Lúcio Flávio, que não era correto um estrangeiro vir meter-se nos assuntos dos brasileiros, denunciando os esquadrões da morte e suas conexões com os porões do regime cívico-militar. Naturalizou-se brasileiro.

Pixote marcou a consagração internacional. A infância abandonada e carente. A Pietà – e Marília Pêra que foi a melhor atriz para os críticos de Nova York. Houve, na sequência, o imbróglio do ator do filme, o garoto que reproduziu, na vida, a trajetória do personagem. Babenco tinha uma direção de cena forte. Confirmou-o com o irregular, mas poderoso, Carandiru. Assim como era traído pelo código de honra da criminalidade, também era pela homossexualidade como transgressão – em Pixote, Carandiru e O Beijo da Mulher-Aranha, com Sônia Braga e William Hurt no papel que lhe deu o Oscar e o prêmio de melhor ator em Cannes.

Babenco foi um grande diretor de atores. Jack Nicholson e Meryl Streep arrasam em Ironweed, de 1987. Três anos depois veio Brincando nos Campos do Senhor, sobre a Amazônia e os índios. A vertente autobiográfica é mais polêmica – Coração Iluminado, O Passado, Meu Amigo Hindu. Pode-se gostar menos desse, ou daquele. E daí? O conjunto da obra é vigoroso. E o homem era íntegro. Sem papas na língua – mas um cinéfilo, sempre. Uma das melhores conversas sobre o cinema que o repórter se lembra de ter tido na vida foi com ele, sobre Casa Vazia, do coreano Kim Ki-duk.

Babenco faleceu na noite desta quarta-feira, 13, aos 70 anos. Ele estava internado desde a terça-feira no Hospital Sírio Libanês para tratamento de uma sinusite. De acordo com nota da assessoria de imprensa, os procedimentos foram feitos, mas ele teve uma parada cardiorrespiratória. O velório será realizado na sexta-feira, 15, das 10h às 15h, na Cinemateca Brasileira.

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