Mundo das Palavras

Arquitetura da Destruição

     Depois que Barcelona, em 1978, se livrou do fascismo franquista imposto por quatro décadas pela Espanha à Catalunha, até a temperatura da brisa que soprava no convés dos transatlânticos catalães, no início do século XX, foi recuperada pelo museu de História da cidade, através de tecnologia.


Como aquele convés de navio catalão, a Praça da República, em Belém, na Amazônia, também era um lugar onde se podia admirar a engenhosidade dos habitantes antigos daquela região. 


 


A partir de 1869, na praça foi edificado o Teatro da Paz, um dos ícones da Arquitetura Paraense no ciclo da riqueza regional desfrutado com a exportação de sua borracha. Em 1908, o intendente de Belém, Antônio Lemos ordenou que o Horto Municipal reservasse 3.798 plantas para a praça. Naquele momento, o Teatro da Paz recebia cortinas com franjas de ouro, bustos de mármore de carrara e grades de escadarias – tudo produzido em Paris. Os equipamentos para iluminação de seu palco e o tanque para lavar as louças de seu café interno vieram de fábricas norte-americanas. Quatro anos depois, o cinema Olímpia começou a funcionar naquele trecho da cidade. Continua em funcionamento, até hoje. O aspecto da praça se mantinha encantador, em 1927, reconheceu o poeta e escritor paulista Mário de Andrade. Naquele ano, ele escreveu em Belém uma carta para seu colega, o poeta Manuel Bandeira na qual manifestou o desejo de poder desfrutar do “direito de sentar naquela terrace em frente das mangueiras tapando o Teatro da Paz”. Mário acrescentou: de “sentar, sem mais nada, chupitando um sorvete de cupuaçu, de açaí”. Ele indagou: “Você que conhece mundo, conhece coisa milhor do que isso, Manu?”.


 


                    Mais nove anos transcorreram. No dia 2 de dezembro de 1936, Maria José Sayão, mãe da cantora Bidu Sayão, em temporada na capital do Pará, registrou no seu diário: estava hospedada no “magnífico” Grande Hotel, “numa praça toda arborizada de lindas mangueiras e defronte do lindíssimo Teatro da Paz”.


 


                  A partir de 1950, a situação começou a mudar com o cerco de edifícios altos. O Grande Hotel foi demolido, em 1974. O cerco foi se fechando até privar o Teatro da Paz do destaque que havia sido reservado a ele, na História da Amazônia. Infelizmente, nós brasileiros não temos orgulho por nosso passado, nem por nossa identidade cultural. Ao contrário dos catalães.


 


 

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