Economia fraca põe pressão sobre BC

Enquanto os economistas e o mercado se animam com as perspectivas de crescimento em 2021 da economia global – que deve ser impulsionada pela atividade nos Estados Unidos -, no Brasil, o movimento é inverso. Por aqui, os problemas de gestão na economia e na saúde, além dos constantes ruídos políticos, detonaram uma crise de confiança que ameaça o PIB e pressiona o Banco Central a elevar a taxa básica de juros, a Selic. Nem a alta das commodities no mercado internacional, que tradicionalmente impulsiona o País, terá capacidade de salvar 2021, segundo economistas.

"A situação é muito complicada. A economia está voltando à recessão e, não obstante o desemprego e a baixa ocupação da capacidade instalada, a inflação está acima do centro da meta. E o ponto mais importante: estamos vendo uma combinação de inépcia, ignorância e irresponsabilidade na frente sanitária, o que deixa o Brasil muito fora do mundo", diz o economista Eduardo Giannetti.

O cenário, que já não era animador no começo do ano, hoje é de deterioração completa: o real é uma das moedas que mais perderam valor no ano (atrás apenas das de Cuba e da Líbia, onde a desvalorização foi deliberada), a inflação no acumulado de 12 meses se aproxima do teto da meta e o PIB deve retroceder no segundo trimestre – há um risco também no primeiro trimestre.

Para o ano, o mercado estima um crescimento na economia entre 3% e 4%. Na prática, isso significa uma estagnação, dado que o carrego estatístico (quando a base de comparação – o resultado médio do PIB em 2020 – é baixa, mas o ponto de partida é elevado por conta da recuperação no último semestre do ano) é de 3,6%. O Itaú, por exemplo, projeta 3,8% – até semana passada, porém, estimava 4%. Para a economia global, o banco alterou, no mês passado, a projeção de 6,6% para 6,9%.

Na visão do economista-chefe do banco BV, Roberto Padovani, o episódio da Petrobrás foi o catalisador dessa crise de confiança que desestabilizou a economia. Ao anunciar que tiraria Roberto Castello Branco do comando da estatal, o presidente Jair Bolsonaro consolidou no mercado a impressão de que o governo não tem agenda. "Nos últimos dois anos, houve desconfiança, que crescia em alguns momentos. Ali (quando Bolsonaro anunciou a saída de Castello Branco), isso se consolidou", diz Padovani.

Ao lado de uma pandemia descontrolada e do colapso do sistema de saúde, o episódio colaborou para que o câmbio descolasse ainda mais. Pelos fundamentos macroeconômicos do País e pela situação da economia internacional, o dólar deveria estar entre R$ 4,50 e R$ 5,00, segundo Padovani. Mas na segunda-feira fechou a R$ 5,64.

"Houve uma crise de confiança que bateu no câmbio, desancorou as expectativas e mudou a precificação do juro. O resultado é que o Banco Central deve ter de antecipar todo o plano (de elevar a Selic, para segurar a pressão inflacionária). Quando você olha para o mercado financeiro, tem um pessimismo gigante. Esse impacto de confiança bate no PIB", diz Padovani.

O pessimismo com o Brasil é mais claro, de acordo com os analistas, quando se observa a relação entre o preço das commodities e o câmbio. Em situações normais, uma alta das commodities como a que vem ocorrendo faria a moeda do Brasil – importante produtor global de commodities agrícolas e minerais – se valorizar. "Essa questão cambial revela a falta de rumo, de perspectiva, de seriedade de orientação política", acrescenta Giannetti.

<b>Barril</b>

Para Silvia Matos, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), a situação econômica, política e sanitária do País é a de um "barril de pólvora", e a fraqueza econômica, ao lado da inflação acelerada, coloca o Banco Central diante de uma decisão difícil: "Apesar de ser óbvia a elevação do juro, não é uma decisão fácil, porque o BC vê que a atividade está fraca e que a política monetária (com a alta da Selic) deixará de estimular a economia."

A consultora econômica Zeina Latif, porém, destaca que a elevação da Selic – o mercado financeiro projeta alta de 2% para 2,5% ao ano – pode não ser suficiente para acalmar o mercado e segurar as pressões inflacionárias decorrentes, sobretudo, da desvalorização do real. "O câmbio está assim porque a economia não cresce, porque não tem vacina e porque não tem perspectiva de ajuste fiscal. Como se não bastasse, toda hora tem um evento novo, uma hora é a Petrobrás, outra é o presidente enfraquecendo a PEC Emergencial. O governo está sem rumo."

Zeina acrescenta que o fato de o ex-presidente Lula ter se tornado elegível – independentemente de a decisão estar correta ou não juridicamente – exacerba fraquezas do Judiciário. "Isso não sai barato para investidores. A visão do Brasil no exterior está muito abalada, e reputação é difícil de se reconquistar." A economista vê um risco de o Brasil entrar em um ciclo longo de estagflação. Panorama pode ser ainda pior: de recessão com inflação, segundo Giannetti.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo</b>.

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