O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu filho caçula, o empresário Luís Cláudio Lula da Silva, adotaram o padrão de dispensar, às vésperas dos depoimentos, testemunhas que eles próprios arrolaram em processo no âmbito da Operação Zelotes.
Depois de mobilizar a estrutura do Judiciário para intimar 80 depoentes, os advogados dos dois já protocolaram a desistência da oitiva de 40. Até agora, 12 falaram. Na ação, eles são acusados de integrar um esquema de tráfico de influência para viabilizar a compra de caças e a aprovação de uma medida provisória no governo da ex-presidente Dilma Rousseff.
As medidas têm atrasado o andamento da ação penal sobre o caso, que pode resultar em mais uma condenação ao ex-presidente e complicar seus planos dele concorrer novamente ao Palácio do Planalto em 2018. A lista de testemunhas inclui executivos e ex-mandatários de outros países, diversos políticos e até o técnico do Sport, do Recife, Vanderley Luxemburgo.
A 10ª Vara da Justiça Federal, em Brasília, teve de expedir dezenas de ofícios para ministros e parlamentares indicados, solicitando que agendassem, conforme suas prerrogativas, hora e local para a inquirição. Além disso, foi necessário emitir um lote de cartas precatórias para que fossem ouvidas as testemunhas que moram fora do Distrito Federal.
As outras seções da Justiça Federal, em Estados como Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro e Goiás, têm reservado espaço e hora na agenda de seus servidores para que os depoentes sejam questionados a distância, por meio de videoconferências.
Marcados dia e hora pela 10ª Vara para a testemunha falar, um representante de Lula e Luís Cláudio protocola a desistência. Nesta terça-feira, 26, seria a vez de a ex-ministra do Planejamento Miriam Belchior depor em Salvador. Na tarde de segunda, 25, a defesa de pai e filho declinou.
Entre as testemunhas que foram dispensadas estão os ministros Blairo Maggi (Agricultura), Dyogo Oliveira (Planejamento) e Aloysio Nunes (Relações Exteriores), fora 15 deputados e senadores. Entre os 12 que não escaparam de depor estão o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e seu ex-ministro da Fazenda Pedro Malan.
Lula e Luís Cláudio ainda podem desistir da maioria das outras testemunhas, pois ainda não ocorreram as audiências para ouvi-las.
A estratégia da defesa destoa do esforço feito para arrolar toda a lista. O juiz Vallisney de Souza Oliveira, titular da 10ª Vara, havia limitado o número de testemunhas a 32, mas a defesa de Lula e Luís Cláudio recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). O desembargador Néviton Guedes deu provimento ao pedido. Na ocasião, os advogados dos dois não detalharam os motivos da indicação de cada testemunha – por lei, isso não é necessário.
O advogado Cristiano Zanin Martins, que representa Lula e Luís Cláudio, informou que o Código do Processo Penal assegura às partes o direito de desistir de testemunhas. “Usando desse direito, desistimos da oitiva de testemunhas quando constatamos que os fatos que seriam objeto do depoimento já estão devidamente esclarecidos no processo por depoimentos anteriores”, justificou, em nota.
O advogado alegou que “nenhuma testemunha” ouvida na ação confirmou “qualquer fato que possa dar sustentação à acusação de tráfico de influência”. “Ao contrário, está claro que o Ministério Público buscou fazer uma acusação contra o ex-presidente Lula com base em benefícios fiscais instituídos durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que também foi ouvido e esclareceu esse fato e a intenção de desenvolvimento regional que norteou a edição da primeira medida provisória sobre o tema”, acrescentou o defensor.
Na ação, em curso desde dezembro do ano passado, Lula é acusado de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Luís Cláudio responde por estes dois últimos crimes. Os procuradores da Operação Zelotes sustentam que o ex-presidente ofereceu a lobistas do setor privado a possibilidade de influenciar o governo Dilma a fechar o negócio dos caças e viabilizar a MP. Em troca, alegam os denunciantes, uma empresa de Luís Cláudio recebeu pagamentos de R$ 2,5 milhões. O caso foi revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo em 2015. Lula e seu filho negam ter cometido irregularidades.