Com a retomada lenta do emprego, que vem sobretudo por meio de vagas de baixa remuneração, e o número ainda expressivo de desempregados, o salário mínimo se tornou praticamente um teto para muitos trabalhadores. Entre o terceiro trimestre de 2014, início da recessão, e o mesmo período do ano passado, meio milhão de trabalhadores passaram a ganhar o mínimo. Quando se compara o ano passado com 2015, no auge da crise, essa diferença chega a 1,8 milhão de pessoas.
No trimestre encerrado em setembro do ano passado, eram 27,3 milhões recebendo até um salário, um terço do total de trabalhadores do País. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, compilados pela consultoria Idados.
Eles mostram que muito desse aumento ocorreu pela explosão da informalidade. Sem a estrutura que os empregos com carteira assinada oferecem, os informais são expostos a condições piores e à baixa remuneração. No terceiro trimestre de 2019, eram 20,9 milhões de informais ganhando até R$ 998 por mês — ante 6,2 milhões de trabalhadores com carteira assinada que tinham essa remuneração no mesmo período.
A partir deste mês, o mínimo passa a ser de R$ 1.045. O novo piso, porém, é insuficiente para as despesas básicas do trabalhador, de acordo com especialistas.
"O aumento da informalidade realmente levou mais trabalhadores no mercado a ganhar menos. As pessoas perderam a proteção que o mínimo representa e, por sobrevivência, aceitaram qualquer oportunidade", avalia Ana Tereza Pires, pesquisadora da IDados. Além disso, a diferença salarial entre demitidos e admitidos aumentou nos últimos meses do ano passado, o que aponta que o aquecimento do mercado ainda não recuperou o vigor de antes.
Ela lembra que a crise também fez crescer o número de trabalhadores com mais anos de estudo que caíram na informalidade ou aceitaram uma remuneração menor no mercado formal. De 2014 a 2019, houve um forte crescimento entre os trabalhadores que têm o ensino médio completo ou a partir do ensino superior que ganham até um salário mínimo. Eles ocuparam vagas que antes eram destinadas a pessoas menos qualificadas.
A assistente comunitária Valdelice Lima, de 44 anos, é um exemplo disso. Ela se formou em administração de empresas, em 2010. Hoje, trabalha para a Prefeitura do Rio, por cerca de um salário mínimo – quase a metade do que ganhava. "Lá em casa, somos três. Estamos gastando só no que é essencial."
<b>Mais desigual</b>
Desde o início da crise, mais pessoas passaram a ganhar até um salário nas regiões Sudeste (com mais 859,4 mil pessoas nessa situação) e Norte, com aumento de 306,1 mil. Apesar de ter caído o número de trabalhadores no Nordeste com essa remuneração, cerca de 55% dos trabalhadores de lá recebem até um salário mínimo.
Para o diretor técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, embora mais pessoas tenham voltado ao mercado formal em 2019, houve uma precarização. "Sem um compromisso com o crescimento do País e políticas de inserção, o engenheiro vai continuar dirigindo Uber." As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>