Economia

“Meu maior desafio foi o Plano Real”, diz presidente do Itaú

Prestes a deixar o cargo que ocupa há 23 anos, Roberto Setubal afirmou ontem que seu maior desafio como presidente do Itaú Unibanco foi o Plano Real. “Eu era muito jovem, tinha 39 anos e havia acabado de assumir, quando tivemos uma megamudança na dinâmica toda, no sistema financeiro e tudo mais”, recordou o executivo durante evento ontem no banco, o último como presidente da instituição. No fim do mês, Setubal passa o bastão para Candido Bracher, que estava à frente do Itaú BBA, área de atacado do banco.

Ao relembrar o período da implementação da moeda, Setubal destacou o avanço veloz do crédito, que foi seguido por uma enorme inadimplência, em meio a juros na casa dos 40%, ainda que a inflação girasse em torno dos 3%. “Foi um momento super difícil. O banco rodou alguns meses no prejuízo. Foi uma megarresponsabilidade e um megassusto, mas depois superamos bem”, disse ele.

Sabatinado pelo economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, o executivo afirmou que banco é “muito complicado” e que, se tem uma coisa que tira o sono de um banqueiro, é a inadimplência. “Tira o sono mesmo. Temos de estar ligados para o banco não sair do trilho. Quando está nos trilhos, tudo bem, mas quando sai, para colocar nos trilhos é duro.”

Despedida. O presidente do Itaú Unibanco afirmou que deixa o cargo com uma sensação de “realização enorme”. Apesar dos desafios, ele resumiu o período como “fantástico” para a história dos bancos no País. Setubal sairá do posto após a assembleia geral de acionistas, que acontece hoje, e a reunião do conselho de administração do Itaú, agendada para o dia 27.

No período em que comandou o Itaú, a instituição entregou retorno de mais de 20% ao ano. Setubal, que atingiu a idade limite de 62 anos para o cargo de diretor-presidente, passa a atuar, em conjunto com Pedro Moreira Salles, como copresidente do conselho de administração da organização.

Em sua gestão, conforme o executivo, o banco teve sua estrutura alterada e foi preparado para o movimento de transição por qual a instituição passaria. “Tivemos a possibilidade de fazer um planejamento e anunciar um presidente de qualidade. Candido (Bracher) está super preparado. Fizemos uma transição muito adequada”, destacou.

Conforme ele, Bracher, que tirou a semana de férias antes de assumir a presidência do banco, atuou, desde outubro, na agenda da presidência e “tomou pé” das coisas com calma. Nos últimos dois meses, garantiu Setubal, o executivo presidiu as reuniões da instituição enquanto ele ficou do lado “ouvindo e dando sugestões”.

O atual presidente do Itaú disse ainda que o banco, ao longo dos últimos dois anos, rediscutiu sua governança e evoluiu. De acordo com ele, o fato de ser CEO do banco há mais de 20 anos, membro do Conselho e controlador cria uma combinação de papéis e dá uma “força muito grande” para a instituição. “Estamos bem arrumados em termos de como o banco vai continuar operando e mantendo o nível de alta performance”, concluiu Setubal.

Políticos. Ao responder a uma pergunta a respeito do surgimento de mais empresários na política, Setubal afirmou que vê espaço para que aqueles que gostam de política tentem uma nova carreira. Considerou ainda que os empresários podem trazer uma forma diferente de ver a política e de gerir a coisa pública. Mas ressaltou a importância dos “bons políticos”. “A interação com a sociedade, com o Congresso, é uma atividade política. Não basta colocar um gestor competente para resolver os problemas. A gente precisa de bons políticos.”

Sobre o cenário econômico, a equipe do banco projeta um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 4% no próximo ano. Setubal, porém, é menos otimista. “Seria ótimo (o avanço de 4%), mas minha expectativa é de um pouco menos.” Segundo ele, o Itaú está preparado para esse crescimento, mas a recuperação do País segue lenta por causa da situação atual das empresas e também da demora da retomada do emprego.

Apesar da divergência entre presidente e equipe, o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, não considera revisar para baixo sua projeção para o PIB de 2018. “Temos um processo de governança clara e total independência intelectual. Roberto é um observador agudo, perspicaz e tem visão diferente da nossa”, explicou Mesquita a jornalistas.

Inflação. Na avaliação de Setubal, o Brasil tem uma oportunidade única de reduzir a sua meta de inflação, de 4,5% para 4%. Para o executivo, porém, um patamar ideal para o País deveria ser entre 2,5% e 3%. Nesse cenário, haveria espaço para a queda das taxas de juros. Segundo ele, o Plano Real resolveu muitos problemas, mas juros altos e inflação elevada ainda são desafios a ser enfrentados.

Mesmo cético em relação aos número crescimento estimado para o País, o presidente do Itaú Unibanco acredita no avanço do crédito neste ano. Ele ainda fez críticas à política de se impulsionar a economia via expansão do crédito subsidiado nos bancos públicos, adotada amplamente pelos governos petistas. “Vamos assistir a muitos problemas decorrentes disso. Vamos ver nos balanços dos bancos públicos.” Segundo Setubal, sustentar o crescimento do PIB com crédito não funciona uma vez que “coisas muito artificiais” não resolvem o problema.

Setubal disse ainda que não estava no radar do banco dois anos de recessão, com 7% de queda do PIB. “Fomos pegos bem de surpresa. A inadimplência voltou a subir e começou a recessão.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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