Depois de passar por sua maior crise em décadas, o Comitê Olímpico Internacional (COI) anunciou neste sábado a proposta de criar uma nova entidade que execute os testes antidoping, sob o marco da Agência Mundial Antidoping (Wada), e de trabalhar com governos na elaboração de novas leis padronizando a luta contra o uso ilegal de substâncias.
A reforma retira da Wada ou de federações esportivas internacionais qualquer poder de sanção, que passa a ser exclusivamente da Corte Arbitral do Esporte (CAS, na sigla em inglês), e deixar apenas com governos a prerrogativa para que façam legislações para eventualmente punir dirigentes.
A iniciativa está sendo vista com suspeita de que se trate de uma ofensiva para enfraquecer a independência da Wada depois que o organismo, de forma autônoma, investigou e revelou o escândalo da fraude nos testes russos.
A proposta é de que atletas, técnicos, dirigentes e médicos passem a ser tratados como “criminalmente responsáveis” por eventuais casos de doping. Mas se atletas serão todos julgados pela CAS, os demais envolvidos terão de depender de novas leis de governos, muitos dos quais são os próprios organizadores do doping.
Os principais dirigentes internacionais estiveram reunidos neste sábado em Lausanne (Suíça), na esperança de chegar a um consenso sobre como lidar com a crise. O COI passou a ser alvo de duras críticas depois que autorizou que a delegação russa estivesse nos Jogos Olímpicos do Rio, mesmo depois das revelações dos investigadores de um “doping de estado”.
Pelo novo projeto, haverá uma “revisão total” do controle de doping. Uma nova autoridade será criada para realizar testes de doping, com maiores poderes de investigação e de colher informações. Mas um eventual teste positivo não irá mais às federações esportivas – como a Fifa, a IAAF ou a Fina -, e sim ao CAS.
Outra medida é ainda a total segregação entre os organismos que regulam o combate ao doping (ou seja, a Wada) e as unidades que fazem os testes. Delatores também terão um novo tratamento, para tentar incentivar que informações possam chegar aos investigadores.
ESTADO – Tentando dar uma resposta ao escândalo da manipulação do estado russos sobre os testes de doping, o COI anunciou que a Wada terá “maior autoridade sobre organizações nacionais antidoping”, além de “supervisão efetiva” sobre os programas nacionais.
Mas isso não significará sanções. Segundo o presidente do COI, Thomas Bach, haverá uma “maior supervisão” e a possibilidade de uma cooperação diária entre agências nacionais e Wada para prevenir manipulações.
Quaisquer punições a dirigentes ou funcionários de estados terão de ocorrer justamente por governos e tribunais nacionais. Para se chegar a um entendimento sobre como isso ocorreria, Bach sugere uma negociação sob a égide da ONU e onde os estados teriam 50% dos votos numa eventual decisão.
Uma vez aprovado o novo projeto, caberia a cada Parlamento nacional aprovar novas leis para eventualmente criminalizar dirigentes e funcionários de estado envolvidos em doping. Bach, porém, garante que o plano dará “maior independência em relação às federações esportivas e aos interesses nacionais”. “Trata-se de um compromisso para ter uma agência mais forte. Isso é um marco”, declarou.
Bach promete mais dinheiro à luta contra o doping. Mas não especifica nem quando e nem quanto seria dado. O COI apenas indica que isso irá “depender” da implementação do plano. Nos últimos meses, a Wada vem alertando que, com os recursos que dispõe, não tem como lutar contra o doping.
Pelo novo plano, haverá ainda uma harmonização dos testes de doping entre os diversos esportes e um programa centralizado pela Wada.
INCIDENTE – No sábado, para deixar a situação do COI ainda mais tensa, o presidente do Comitê Paralímpico Internacional, Sir Philip Craven, caiu em uma “pegadinha” de um russo que, ao telefone, se passava pelo ex-atleta americano Ed Moses.
Em seus comentários, o dirigente deixou claro suas críticas ao comportamento de Thomas Bach. “Se Bach não mudar seu tom, vai ter muitos problemas”, disse, em referência ao tratamento dado pelo COI ao escândalo russo.
“A opinião pública mundial está contra ele e em especial na Alemanha. Merkel não aguenta ele”, disse. Segundo o dirigente, Bach está “enfraquecido” e colocou a seu lado pessoas com pouca influência.
“Bach fracassou. Não podemos ter os russos competindo”, disse. Temos de ter nações limpas”, insistiu. O dirigente ainda garantiu que seu movimento continuará a impedir a participação dos russos. “Não somos corruptos como outras pessoas ou outras organizações são”, completou.