A Corregedoria Geral da cidade de São Paulo vai investigar um conjunto de quatro pregões eletrônicos para compra de material escolar e uniformes realizadas pela Secretaria Municipal de Educação (SME) entre 2013 e 2016 que causou prejuízo de pelo menos R$ 31,1 milhões aos cofres públicos.
Preços acima do mercado, exigências excessivamente específicas nos itens e até a forma do contrato levantaram a suspeita de que servidores podem ter favorecido parte das empresas envolvidas nos certames. A investigação vai apontar se houve incompetência dos servidores ao não seguirem as especificações técnicas ou crime.
Os dados das compras foram analisados em auditoria realizada pela Controladoria Geral do Município (CGM) divulgada nesta semana. A investigação mirou quatro pregões eletrônicos que, juntos, resultaram em licitações que somam R$ 131.608.082,66. Duas delas eram para fornecimento de kit material escolar, uma para aquisição de estojo e agenda escolar e a outra, de uniformes.
Em dois dos pregões, de kit escolar, os auditores constataram que havia “características restritivas, seja por serem muito específicas, possuírem detalhamento exagerado ou mesmo não conterem a devida objetividade e clareza”.
Um dos exemplos citados é o barbante, que tem as seguintes especificações: “rolo de barbante cru, 100% algodão cru, 3 milímetros aproximadamente, com metragem de 500 metros ou 250 gramas”. Em outras licitações do material não há menção à largura do rolo definida por uma medida específica. “Ao se estipular uma dimensão de, aproximadamente, 3 milímetros, a SME dificulta a apresentação de propostas/produtos pela maioria das empresas do ramo”.
Para a compra de canetas azuis, a “ficha técnica” descrita na auditoria tem 15 linhas e uma das exigências é que o material tenha “no mínimo, 145 mm de comprimento”, que também não é comum no mercado.
Outro caso que chamou a atenção dos auditores é o da compra de um estojo com especificações muito semelhantes à de uma outra licitação, de Aguaí, no interior do Estado. A exigência no edital era de que o item deveria ter as dimensões de 190 milímetros de comprimento e 62 milímetros de largura, no mínimo, restringindo as concorrentes. A empresa Master Indústria Comércio e Produtos Escolares Ltda venceu as licitações em ambos os municípios. “Entende-se que os fatos relatados configuram direcionamento com consequente restrição à competitividade no certame examinado”, diz o documento.
Outros aspectos foram considerados pelos auditores como “restritivos” à competição nos certames, como exigência de amostra dos objetos comprados, o que já foi considerado inadequado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O órgão também menciona “baixa confiabilidade” na metodologia de pesquisa de preços dos pregões e “falta de confiabilidade nas cotações” por “falta de diversificação de empresas na pesquisa de preço”.
Sobrepreço e contrato
Um dos principais problemas apontados pelo relatório é o prejuízo potencial de R$ 24,1 milhões em um dos pregões, já que a secretaria não aderiu a uma ata federal padronizada para compra de material escolar. A SME solicitou alteração de um item de um dos lotes – a substituição de um caderno brochurão de 80 folhas pelo caderno de desenho grande de 96 folhas. Segundo a pasta, a mudança teve motivos pedagógicos.
Se a compra tivesse sido feita com a ata padronizada, custaria R$ 11,7 milhões. Como foi feita, subiu para R$ 36,8 milhões. Segundo a controladoria, o lote de cadernos diferentes solicitados pela secretaria poderia ter sido comprado separadamente, ao custo de R$ 944.591,70 – ainda sim vantajoso para os cofres públicos.
“Entende-se restar configurada fragilidade no embasamento para a alteração do item, divergência injustificada de preços para mesmos itens da mesma empresa e prejuízo ao erário municipal”, diz o documento.
Em quatro dos contratos firmados após os pregões, o órgão municipal também encontrou sobrepreço nos itens adquiridos. A cola líquida de um litro, por exemplo, custou R$ 9,49 por unidade, enquanto o preço médio pesquisado na auditoria foi de R$ 6,29, considerando o valor de compras públicas na Grande São Paulo e em cidades como Campinas, Araçatuba, Bauru, São José do Rio Preto e Sorocaba. Um pincel de cor preta custou R$ 1,53, enquanto o preço médio é de R$ 0,88. Na média, segundo o estudo, a diferença entre o valor contratado e o pesquisado foi de 30%. Neste caso, a economia poderia ter sido de R$ 18.392.994,16, segundo a auditoria.
A Prefeitura, em nota, diz que a SME vai analisar os apontamentos da auditoria e “seguir as determinações da controladoria”. Já o ex-prefeito Fernando Haddad (PT), por sua assessoria de imprensa, informou que a controladoria foi criada em sua gestão e gerou economia superior a R$ 600 milhões aos cofres municipais. O jornal “O Estado de S.Paulo” não conseguiu localizar a empresa Master.