O lobista Milton Pascowitch – preso pela Operação Lava Jato – acusado de operar pagamentos de propina no esquema da Petrobras para a empreiteira Engevix Engenheria, foi quem pagou R$ 400 mil do imóvel comprado pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, em 2012, onde funcionava a sede de sua empresa de consultoria em São Paulo, a JD Assessoria e Consultoria Ltda.
A compra é alvo central do inquérito da Polícia Federal que apura corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo Dirceu, a JD e seu irmão e sócio Luiz Eduardo Oliveira e Silva. Comprado por R$ 1,6 milhão, no ano em que ele começava a ser julgado no processo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal, Dirceu registrou em cartório ter dado R$ 400 mil de recursos próprios no negócio.
Em relatório de janeiro, a Receita Federal suspeitou da movimentação financeira porque o dinheiro não passou pela conta corrente de Dirceu naquele ano. O documento resultou em inquérito aberto em 30 de janeiro, para apurar corrupção e lavagem de dinheiro na aquisição desse imóveis e de outro, em nome do irmão.
Nesta quarta-feira, 17, pela manhã, o ex-ministro, por meio de sua defesa, apresentou documento no inquérito em que revelou que o valor não pode ser rastreado em sua conta porque o dinheiro foi pago pela Jamp Engenheiros Associados, diretamente para o escritório responsável pela venda do imóvel, na Avenida República do Líbano, em São Paulo.
Em nota enviada ao Estadão na tarde desta quarta-feira, 17, a assessoria de José Dirceu diz: “Como corretamente aponta o relatório da Receita Federal, os R$ 400 mil reais não passaram pelas contas bancárias do ex-ministro nem da JD Assessoria e Consultoria porque foram pagos, como parte do contrato, pela Jamp Engenharia diretamente ao então representante do espólio do imóvel, o escritório de advocacia Leite & Rossetti.”
“A operação foi perfeitamente legal”, afirma o advogado de defesa do ex-ministro, o experiente criminalista Roberto Podval. “A forma como se deu o pagamento – diretamente para conta de terceiro – estava explicitamente prevista no contrato entre a JD e a JAMP.”
Operador
A Jamp pertence a Pascowitch – que está preso em Curitiba – acusado de ser um dos 11 operadores de propina das empresas acusadas de cartel, com elos na Diretoria de Serviços da Petrobras. A área era uma das controladas pelo PT, segundo os processos, por meio do ex-diretor Renato Duque, que teria sido indicado de Dirceu. Eles negam.
A Jamp assinou contrato com a JD em 2011, para pagamento de serviços que Dirceu teria prestado de consultoria internacional para a empreiteira Engevix. Foram pagos R$ 2,6 milhões entre 2008 e 2012 para a JD, de José Dirceu. Desses, R$ 1,4 milhão foram pela Jamp.
Segundo Roberto Podval, a cláusula 11 do contrato estabelecia que “os depósitos poderão ser efetuados em outras contas-correntes de sua titularidade ou, ainda, da titularidade de terceiros que venha indicar, responsabilizando-se isoladamente por estas operações”.
“Após o pagamento efetuado pela JAMP diretamente aos proprietários, a JD emitiu respectiva nota fiscal contra a JAMP no valor de R$ 436.449,79, recolhendo os impostos incidentes. Todas as informações já foram encaminhadas e são do conhecimento da Justiça Federal do Paraná.”
Investigadores da Lava Jato querem saber mais detalhes dessa negociação. No documento que entrou à Justiça, Dirceu explica que foi contratado pela Engevix em 2008 – data que estão registrados os primeiros pagamentos para a JD. Contrato entregue por sua defesa, no entanto, é de 2010 e retroativo a novembro de 2009.
Os serviços prestados seriam de consultoria em negócios no exterior que não teriam tido relação com a Petrobras. Em 2011, com a saída de Pascowitch da Engevix o ex-ministro revelou que os serviços passaram a ser pagos via Jamp.
O contrato entre a empresa do ex-ministro e a Jamp não especifica a Engevix Engenharia como beneficiária dos serviços de consultoria, é genérico quanto ao objeto contratual e não delimita área de abrangência. Dirceu informou que o contrato de R$ 1,5 milhão assinado em 15 de abril de 2011 pela Jamp e pela JD Assessoria e Consultoria foi referente aos serviços de consultoria internacional prestados para a construtora Engevix Engenharia, em Cuba e no Peru.
“A JD Assessoria e Consultoria assinou o contrato com a Jamp em março de 2011 também com o objetivo de prospectar negócios no exterior para a Engevix”, informou a nota.
Além de seus contratos em obras de refinarias da Petrobrás, a Engevix obteve contratos bilionários nesse período no setor naval e de obras de plataformas para exploração e produção de petróleo do pré-sal. Para os investigadores da Lava Jato, a Jamp era uma empresa de fachada de Pascowitch usada para esquentar o dinheiro da propina. O que reforça a suspeita é o depoimento de um dos sócios da Engevix, Gérson de Mello Almada – preso desde o dia 14 de novembro de 2014 na Justiça Federal, no dia 18 de março. O vice-presidente da empreiteira confessou ter pago por serviços de “lobby” o operador de propina, como forma de garantir seus contratos na Petrobrás.
Pascowitch seria um abridor de portas na estatal, graças aos seus contatos com membros do PT, entre eles o tesoureiro do partido João Vaccari Neto. Era Pascowitch quem definia na Engevix quais candidatos petistas receberiam doações eleitorais.
O que chamou a atenção dos investigadores foi que Almada admitiu ter contrato as consultorias internacionais da JD, para abrir mercado em Cuba e no Peru, mas diz desconhecer a relação comercial entre Jamp e a empresa do ex-ministro – conforme justificou Dirceu em nota oficial à imprensa.
Duque
A Jamp também esteve ligada a um negócio imobiliário do ex-diretor de Serviços Renato Duque. Foram encontrados na casa do ex-diretor contratos e notas que provam que a empresa de Pascowitch emprestou R$ 730 mil, em 2011, para a construtora do prédio onde Duque passou a ser proprietário de três unidades, pelo valor de R$ 2 milhões, no Rio.
Documento de setembro de 2012 mostra que pelo acerto entre Duque e a Malta Incorporadora, previa que o ex-diretor pagaria diretamente para a Jamp valores referentes aos R$ 730 mil que estavam pendentes referentes a um empréstimo feito entre da empresa de Pascowitch para a incorporadora. O valor a ser pago seria de R$ 815 mil.
Duque também virou consultor, depois que saiu da Petrobrás. Sua empresa, a D3TM Consultoria e Participação, firmou contrato com a Jamp em 2013, no valor de R$ 1,2 milhão. Pelo menos 11 notas fiscais apreendidas mostram pagamentos mensais da Jamp de R$ 100 mil para a D3TM entre maio de 2013 e abril de 2014, quando Duque comunicou que não poderia mais cumprir seu contrato. O documento de encerramento da parceria foi encontrado também.
Além da Jamp, a D3TM de Duque foi contratada também por outras duas empreiteiras do cartel que pagaram a JD, de Dirceu: UTC e OAS.