Cerca de 77 mil crianças de até 14 anos estão cegas ou têm deficiência visual grave por doenças oculares que, em sua maioria, poderiam ter sido evitadas. A estimativa é do Conselho Brasileiro de Oftalmologia, que lança no sábado o livro Prevenção da Cegueira e Deficiência Visual na Infância, no 60.º Congresso Brasileiro de Oftalmologia, em Goiânia.
O estudo aponta para a retinopatia da prematuridade, catarata, toxoplasmose e glaucoma congênito como as principais causas da cegueira infantil. Em todos esses casos, o diagnóstico e a intervenção precoce podem reduzir o dano ou evitar a cegueira. A essas já causas já conhecidas, estudadas pelos médicos, somam-se ainda as sequelas da infecção por zika na gravidez.
O problema é que não há uma rede de atenção estruturada, em que os pais recebem encaminhamento para o especialista, após identificado o problema, aponta a oftalmologista pediátrica Andrea Zin, uma das coordenadoras da publicação e pesquisadora do Instituto Fernandes Figueiras (IFF), ligado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Nem mesmo o diagnóstico é garantido – o Teste do Reflexo Vermelho, conhecido como Teste do Olhinho, que permite identificar se a criança tem algum problema de visão, só é obrigatório em 16 Estados e no Distrito Federal.
“A visão exerce papel importante no desenvolvimento geral. Quando você intervém precocemente, evita que crianças sejam desnecessariamente cegas. Mas o teste do Reflexo Vermelho, que é de triagem, não é uma lei federal. Você tem dez Estados em que essa questão não está regulamentada”, afirmou Andrea.
Em alguns casos, como o da catarata congênita, a criança precisa ser operada nos primeiros três meses de vida para evitar a cegueira. Em outros, como a retinopatia da prematuridade, o tempo é ainda mais exíguo – o médico tem até 72 horas depois de identificado o problema. A retinopatia afeta bebês prematuros em que vasos sanguíneos dos olhos cresceram de forma irregular e podem acabar forçando o descolamento da retina, o que leva à cegueira irreversível. Quando há esse crescimento irregular, é preciso fazer uma cirurgia a laser para retirar esses vasos.
Foi o que aconteceu com Gabriel, de 4 meses, nascido na 24.ª semana de gestação, com 614 gramas e 30 centímetros. Internado no IFF, passou por 16 exames até que o crescimento irregular dos vasos pudesse ser identificado. A cirurgia ocorreu a tempo. “Levei um susto quando a médica disse que ele poderia ficar cego. Fiquei com medo de deixar fazer a cirurgia e ao mesmo tempo que ele ficasse cego. Mas deu tudo certo. Ele vai ter acompanhamento e talvez tenha de usar óculos”, disse a dona de casa Tássia da Conceição Marques, de 20 anos.
Tássia vive em Carmo, cidade serrana a 190 km da capital fluminense, e foi encaminhada para o IFF. “Existem bolsões de assistência, como Rio e São Paulo. Mas é preciso estruturar a rede pública, pois o pediatra não sabe para onde encaminhar a criança”, disse Andréa.
Zika
Segundo a especialista, a zika será causa importante de cegueira infantil. O IFF tem programa de pesquisa para acompanhar 1 mil crianças cujas mães contraíram zika, mesmo que os bebês não tenham microcefalia. A médica tem encontrado alterações no nervo óptico que podem levar à cegueira. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.