Em reunião, EUA e China se acusam de minar ordem global e abusar do poder militar

O primeiro encontro de alto escalão entre representantes dos EUA e da China depois da posse de Joe Biden começou nesta quinta-feira, 18, com acusações mútuas, raramente feitas pelos dois lados frente a frente, de abuso do poder econômico e militar e ingerências indevidas em assuntos internos da outra parte. Os dois lados usaram uma linguagem dura, que pouco sugere uma melhora no diálogo bilateral em relação ao governo de Donald Trump.

Nas declarações de abertura da reunião, diante da imprensa, o secretário de Estado, Antony Blinken, acusou a China de "ameaçar a ordem baseada em regras que mantém a estabilidade global", citando "coerção" a países aliados dos EUA e uma "preocupação profunda" com as ações de Pequim na província chinesa de Xinjiang, em Hong Kong e em Taiwan. Ele ainda apontou Pequim como responsável por ciberataques contra os EUA.

"A alternativa a uma ordem baseada em regras é um mundo no qual a força é recompensada e os vencedores levam tudo. E isso significaria um mundo bem mais violento e instável para todos nós", declarou Blinken. Ao mencionar suas recentes viagens ao Japão e Coreia do Sul, no começo da semana, ele afirmou ter ouvido de autoridades desses países "profundas preocupações" sobre as ações chinesas na Ásia.

O outro representante dos EUA, o assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, optou por um tom menos agressivo: "Não estamos atrás de conflitos, mas estamos abertos a uma competição dura, e sempre defenderemos nossos princípios, para nosso povo e nossos amigos", declarou.

As expectativas de um diálogo duro no encontro, previsto para continuar no sábado, se confirmaram nas falas seguintes, dos representantes chineses. Ao responder a Blinken, o responsável pelas relações exteriores no Partido Comunista, Yang Jiechi, afirmou que os EUA abusam do seu poderio militar e financeiro.

"Os Estados Unidos usam sua força militar e hegemonia financeira para impor sua jurisdição de forma arbitrária e suprimir outros países", afirmou Yang, em uma referência às sanções impostas por Washington a países como o Irã, que afetam empresas de todo o mundo, e a empresas chinesas como a Huawei. "Os EUA abusam do que chamam de segurança nacional para obstruir os canais normais do comércio e incitar outros países a atacarem a China."

Yang disse que a China "não será estrangulada", e reiterou que Xinjiang, Hong Kong e Taiwan são "partes inseparáveis" do país, opondo-se à "interferência americana em temas internos". Ele ainda disse que os direitos humanos nos EUA estão em má fase, referindo-se ao que chamou de "massacre" dos negros americanos.

O chanceler Wang Yi lembrou das sanções impostas pelo Departamento de Estado, na quarta-feira, a 24 pessoas ligadas ao governo de Hong Kong e ao Legislativo chinês, em represália à nova lei eleitoral para a cidade, que praticamente bloqueia a participação política de opositores. "No nosso caminho para cá, soubemos das sanções. Isso não é uma forma de convidar hóspedes para os EUA", disse.

Após a fala da delegação chinesa, as TVs retiraram seus equipamentos da sala, mas Blinken ordenou que permanecessem por mais alguns instantes para voltar a criticar as políticas externa e interna da China. Yang Jiechi, então, afirmou que os EUA "não representam a opinião pública internacional" e criticou a quebra de protocolo.

"Essa é a forma com que vocês esperavam conduzir esse diálogo? Pensamos que o lado americano seguiria os protocolos diplomáticos necessários", disse. O encontro começa já com expectativas baixas, até pelo estado das relações bilaterais.

Antes de Biden assumir a Casa Branca, Donald Trump imprimiu um tom bélico à relação com Pequim, acirrando a disputa comercial e pela primazia tecnológica entre as duas maiores economias do mundo. O democrata deixou claro que manteria a linha de enfrentamento com a China, que classificou como "grande competidora" dos EUA, mas procuraria coordenar sua política com aliados.

A China, do seu lado, vinha mantendo uma retórica mais comedida, mas sem abrir mão de suas posições em temas como Hong Kong e Taiwan.

Nos preparativos para o encontro, diplomatas chineses se referiam a ele como "diálogo estratégico de alto nível" – para os americanos, se trata apenas de uma oportunidade para "discutir, cara a cara, as preocupações que os EUA têm". Outro desejo, embora distante, é a eliminação de algumas sanções relacionadas ao setor de tecnologia – algumas empresas chinesas foram banidas dos EUA, como a Huawei, e apontadas como de potencial "risco à segurança nacional".

Segundo a agência <i>Bloomberg</i>, o governo chinês ainda tem a expectativa de um encontro bilateral entre Joe Biden e Xi Jinping, já no mês que vem, tendo como ponto central um dos temas onde os dois países têm objetivos semelhantes: a questão climática. Pelo plano, os dois se reuniriam no dia 22 de abril, Dia da Terra, na cúpula que o democrata esta organizando em Washington. (Com agências internacionais).

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