França e a estratégia do devagar e sempre

Tratado como um político experiente, articulador, conciliador e formador de alianças, o ex-governador Márcio França (PSB), 57 anos, se diferencia da maioria dos adversários por ser menos atuante na internet e nas redes sociais. Para a disputa pela Prefeitura de São Paulo, ele traçou com seu marqueteiro, ainda na pré-campanha, a estratégia que iria se alicerçar em um tom propositivo – e menos conflituoso – visando ocupar espaço em um ambiente de alta polarização.

A projeção era de crescimento lento e foi o que aconteceu: França marcou 7% em levantamento de setembro, foi a 10% no começo deste mês e ontem aparecia com 13%, na pesquisa Ibope/Estadão/TV Globo. Pela sondagem, ele está em empate técnico com dois candidatos na disputa por uma vaga do segundo turno: Guilherme Boulos (PSOL) e Celso Russomanno (Republicanos).

O marqueteiro Raul Cruz Lima destaca o sangue frio do ex-governador paulista. "Eu avisei desde o começo que o crescimento seria devagar, ele apoiou." Caio França, deputado estadual e filho do ex-governador, conta que, em alguns momentos, fez pressão para que a campanha adotasse um tom mais contundente contra os adversários. "Cheguei a imaginar que a gente teria de ir mais para o confronto. O meu pai foi mais do feeling dele, que é fundamental."

França fechou um arco de alianças com PDT – sigla que indicou o vice, Antônio Neto -, Solidariedade, Avante e PMN, assegurando o segundo maior tempo de rádio e TV no horário eleitoral gratuito – um minuto e 37 segundos de programa, ficando atrás apenas do atual prefeito, Bruno Covas (PSDB), que teve 3 minutos e 29 segundos, além de 29 aparições.

Na disputa de 2018, em que França tentou se reeleger governador, o estilo "devagar e sempre" o levou para o segundo turno depois de ultrapassar Paulo Skaf (MDB) por uma diferença de apenas 89 mil votos, de um total de mais de 15 milhões e chegar ao segundo turno. Era desconhecido por grande parte do eleitorado no início da disputa, pois assumiu o mandato de governador com a renúncia do antecessor, Geraldo Alckmin, de quem era vice – o tucano foi disputar a Presidência e amargou um quarto lugar.

Ele começou a corrida com 5% das intenções de voto nas pesquisas e, no segundo turno, perdeu para o ex-aliado João Doria (PSDB) por 740 mil votos. E – como gosta de repetir – bateu o tucano na capital paulista.

O tom anti-Doria é o mote da campanha mesmo tendo o advogado Anderson Pomini como coordenador jurídico da equipe e um dos principais estrategistas da campanha – ele foi secretário municipal de Justiça do atual governador, quando o tucano estava na Prefeitura paulistana.

Os coordenadores políticos são o ex-deputado federal Beto Albuquerque e o ex-ministro da Defesa, dos Esportes, da Ciência e Tecnologia Aldo Rebelo. Ambos são conhecidos pelo perfil de esquerda moderada. A campanha conta ainda com a presença da Lúcia França, mulher do candidato há quase 40 anos.

<b>Crítica</b>

A ideia do PSB paulista é a de tentar colher os frutos da rejeição ao atual governador, que é reprovado por 54% do eleitorado, de acordo com a pesquisa Ibope/TV Globo/Estadão do último dia 9. Trata-se de uma solução única para duas questões impostas pela disputa: além de levantar uma bandeira, evita a necessidade de ataques mais duros ao atual prefeito Bruno Covas (PSDB), que herdou o mandato do atual governador e que faz tratamento contra câncer. A campanha avalia que, se for muito áspera contra o atual detentor do cargo, corre o risco de ser avaliada como insensível.

"Acho que o Covas é um bom menino", afirmou França inúmeras vezes ao longo da campanha, mencionando o respeito que tem pelo avô do prefeito, o governador Mário Covas (1930-2001), um dos quadros históricos do PSDB.
Nas críticas, sugere apenas que o prefeito não tem pulso firme para se opor a Doria. Em suas investidas contra Covas, ele costuma dizer que a administração municipal se tornou uma secretaria do governo do Estado. França também aponta uma influência muito grande e indevida do ex-presidente da Câmara Milton Leite (DEM) na gestão. Segundo ele, o vereador é, na prática, "o prefeito mais longevo da cidade".

Ao apontar falhas na gestão municipal, França evitar nomear um responsável. "Constrange a todos nós andar pelas ruas e ver essa quantidade de pessoas, crianças, enfim, nessa situação de moradores de rua e parece que há uma certa condescendência do poder público", afirmou no debate realizado pelo jornal O Estado de S. Paulo, organizado em parceria a Fundação Armando Alvares Penteado (Faap). Em todos os embates, o candidato só respondeu de maneira mais contundente com quem foi incisivo contra ele e, na reta final, fez até dobradinhas com adversários com quem disputa uma vaga no segundo turno.

Para convencer o eleitor pelo voto no ex-governador, a campanha de França apostou desde o começo na ideia de que, com a pandemia, a Prefeitura tinha de ir além de uma zeladoria de serviços públicos. Uma das propostas é a criação de um banco. França fala em ajudar a abrir até 250 mil microempresas de graça e emprestar até R$ 3 mil a cada uma, com juro zero, sem fiador. Esse é um dos pontos do que o candidato chama de "Plano Márcio", uma alusão ao Plano Marshall de recuperação econômica dos Estados Unidos e da Europa depois da 2.ª Guerra Mundial.

Ao vender a imagem de moderado, França se comparou ao presidente eleito dos EUA, Joe Biden. O candidato tem repetido a importância do equilíbrio e chegou a falar, na propaganda eleitoral em que cedeu tempo de TV à candidata Marina Helou (Rede), que seus adversários não são os seus inimigos. Uma frase semelhante foi usada por Biden em seu discurso de vitória.

<b>Trajetória</b>

Ex-vereador, ex-deputado, ex-prefeito e ex-governador, França também sempre repete que nunca abandonou um mandato na metade. O discurso tem endereço: Doria, que deixou a Prefeitura para se eleger governador com menos de dois anos de mandato, Russomanno e até Luiza Erundina (PSOL), vice na chapa de Boulos, já que ambos terão de renunciar aos cargos na Câmara dos Deputados caso saiam vitoriosos na disputa municipal.

Eleito vereador em São Vicente em 1988, foi reeleito e, em 1996, disputou a prefeitura da cidade da Baixada Santista, onde permaneceu por dois mandatos. Na reeleição para prefeito, em 2000, conseguiu 93,1% dos votos válidos – outro dado que gosta de divulgar quase todo dia na campanha.

Durante a corrida presidencial de 2014, quando era vice-governador de Alckmin, por pouco França não tomou o mesmo voo que seu correligionário, o governador de Pernambuco e candidato à Presidência da República Eduardo Campos (PSB). "O avião passou por cima do carro em que eu estava", afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo, relatando que só não embarcou por motivos circunstanciais de agenda e tripulação. Ambos eram caciques do PSB.

Depois que ele e o partido se deram conta do que havia ocorrido no acidente aéreo, que matou outras seis pessoas além de Campos, França se dirigiu ao local da queda para falar com as equipes que inspecionam os destroços a fim de resgatar a aliança do governador de Pernambuco e devolvê-la à viúva, Renata.

Atendendo a um pedido de França, um funcionário público da Prefeitura de Santos vasculhou os telhados das casas atingidas pelo avião atrás do objeto. A aliança não foi localizada, mas o servidor achou cinco medalhinhas que o governador de Pernambuco carregava penduradas no pescoço.

Elas foram devolvidas à família. Hoje, elas estão com cada um dos cinco filhos do então presidenciável: o deputado federal João Campos – que é candidato do PSB à prefeitura do Recife -, Duda, Pedro, Zé e Miguel. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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