A Polícia Civil do Rio Grande do Sul indiciou nesta sexta-feira, 23, o motoboy Everton Henrique Goandete da Silva, de 40 anos, por desobediência policial e lesão corporal leve. O resultado das investigações, que também levou ao indiciamento do idoso Sergio Camargo Kupstaitis, 71 anos, por lesão corporal, foram apresentadas nesta sexta-feira, 23, na sede da Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP-RS) do Estado, em Porto Alegre.
No último sábado, 17, os dois homens se envolveram em uma discussão no bairro Rio Branco, na capital gaúcha. Uma testemunha relatou ao Estadão ter visto Sergio, de bermuda e sem camisa, andando em direção a Everton "com uma faca na mão", e que o motoboy já apresentava um ferimento no pescoço. "Ele tentou me matar", teria dito Everton, se referindo a Sergio, morador do bairro. A defesa deles não foi localizada pela reportagem.
Mesmo assim, ambos foram algemados e levados para a delegacia por policiais militares que foram deslocados para acompanhar a ocorrência. A atuação dos quatro agentes da Brigada Militar (BM) no caso também foi investigada.
Segundo a Polícia Civil, 27 pessoas foram ouvidas na investigação, incluindo 22 testemunhas, uma vítima (motoboy Everton) e quatro agentes. Ao todo, foram periciados 12 vídeos, 17 imagens, três áudios e dois laudos periciais.
Ainda de acordo com as investigações, os dois homens têm um histórico de desavenças. Em janeiro deste ano, Sergio chegou acionar a Brigada Militar porque um grupo de pessoas estaria tentando derrubar uma banca de jornal na rua onde mora. De acordo com a BM, Everton foi identificado como um do integrantes nesta ocorrência.
Conforme o que também apresentado pela Brigada Militar, a partir de imagens de monitoramento, Sergio não estaria segurando uma faca, mas "um canivete", e o motoboy teria arremessado três pedras na direção do idoso. A polícia afirmou que, em depoimento, Sergio admitiu as agressões com o canivete.
"O resultado disso tudo é que houve agressões múltiplas a cada um deles, resultando em que em um momento um é agressor e o outro é vítima", disse o coronel Vladimir Luís Silva da Rosa, corregedor da BM. Ambos apresentaram escoriações pelo corpo – Everton, no pescoço; e Sergio, na perna – segundo os laudos do Instituto Médico Legal.
Ambos foram indiciados por lesões corporais leves, mas apenas Éverton, por desobediência. O caso foi remetido ao Poder Judiciário, e o Ministério Público vai analisar se vai, ou não, denunciá-los.
"Caso o Ministério Público ou o próprio Poder Judiciário entenda que houve um crime mais grave, o inquérito policial retorna à delegacia para novas diligências. Porém entendemos que o fato está devidamente elucidado por parte da Polícia Civil", disse o delegado Guerreiro.
Policiais não cometeram crime e poderão voltar às atividades de campo
Imagens que circulam nas redes sociais mostram a ação dos agentes na abordagem no bairro Rio Branco. Nos registros, eles puxam a camiseta de Éverton e o colocam contra a parede, mesmo com os pedidos do motoboy para soltá-lo e dizendo que Sérgio o estava ameaçando.
Mesmo com as pessoas em volta repetindo para os policiais que o motoboy era a vítima na situação, os agentes da BM continuam segurando o homem contra a parede. Segundo relato de uma testemunha ouvida pelo <b>Estadão</b>, Sergio teria voltado ao apartamento enquanto os agentes imobilizam Éverton. Ele troca de roupa e só desce novamente quando mais viaturas chegam e ele é convocado por outros policiais para ir à delegacia.
Em relação a atuação dos policiais militares, a sindicância da Brigada Militar entendeu que, com base no relato das testemunhas e análise de imagens, os agentes não cometerem nenhuma "agressão física" ou "agressão verbal" contra os indiciados na ocorrência.
Eles afirmam que, no momento em que os policiais chegaram para atender o caso, os agentes não sabiam quem era o agressor e quem era a vítima na situação. Disseram ainda que os PMs seguraram o motoboy pela camisa e o pediram para "dar uma segurada".
Segundo o corregedor Vladimir Luís Silva da Rosa, Everton resistiu e desobedeceu ordens da BM, antes de ser algemado e levado para a viatura da corporação. "A manifestação do senhor Everton é ele tentou me matar (se referindo às ameaças de Sergio), mas a Brigada Militar não estava ali (quando aconteceram as ameaças). Ela chega em um ambiente hostil."
Embora não tenham sido registradas agressões por parte dos agentes, os policiais apresentaram "transgressão da disciplina militar" em dois momentos durante a abordagem:
*O primeiro, quando os policiais militares não acompanharam Sergio no deslocamento que o idoso fez para vestir uma camisa e buscar o documento;
*E o segundo, por terem conduzido Sergio à delegacia no banco de trás da viatura, quando já havia chegado uma segunda viatura equipada que permitiria levá-lo na parte traseira do veículo.
Os policiais terão o prazo de 15 dias para apresentar suas defesas a partir do momento em que a corregedoria da Brigada Militar notificar os quatro do resultado da sindicância. De acordo com a SSP-RS, o caso não será remetido à Justiça comum ou à Justiça Militar porque não houve indícios de crime na abordagem do quarteto.
Dois dos policiais tinham sido deslocados para trabalhos administrativos até o final da sindicância. De acordo com a secretaria, os gentes "podem voltar imediatamente a ações de campo".