Memórias de guerra

Dean-Charles Chapman tornou-se conhecido como Tommen na série Game of Thrones. George MacKay foi um dos filhos – Bodevan, o Bo – de Viggo Mortensen em Capitão Fantástico. Ambos fazem agora Blake e Will em 1917, o épico de guerra de Sam Mendes que teve pré-estreias no fim de semana e entra em cartaz na quinta, 23. No começo do mês, 1917 venceu os Globos de Ouro de melhor filme de drama, direção e fotografia. No sábado, foi o grande vitorioso na premiação do Sindicato dos Produtores, o que o converte em favorito no Oscar, ao qual concorre em dez categorias. No começo de dezembro, bem antes de todo esse rebuliço, MacKay e Chapman conversaram pelo telefone com o jornal <b>O Estado de S. Paulo</b>. Estavam entusiasmados com o filme, e com Sam.

"Quando fizemos a audição, sabíamos apenas que era um filme de guerra, mas não as particularidades da produção, que seria filmado num único plano contínuo. E só depois descobrimos que seria um projeto muito pessoal de Sam, que queria contar a história do avô dele durante a 1ª Grande Guerra. Ele cresceu ouvindo essa história, e saber que queria compartilhá-la com o público, e nós seríamos seus instrumentos, criou uma cumplicidade muito grande. Não era só mais um filme, era o filme", disse Chapman. Game of Thrones já era pródigo em cenas de combates, as crônicas do gelo e do fogo, mas aqui não existem fantásticos dragões lançando suas chamas. "Oh, não. O que temos é o horror da trincheira, recriado com todos os detalhes, e quando você está correndo no campo de batalha, com fumaça, explosões e estilhaços, e a cena se estende, e você não ouve nunca o Corta!, a coisa fica muito real e assustadora", acrescenta MacKay.

Começa com um soldado descansando, à sombra de uma árvore. O repouso do guerreiro. É chamado para uma missão – em dupla, com um companheiro. Terão de atravessar a guerra para levar uma mensagem, lá do outro lado. O caminho é permeado de perigo. "É um filme sobre o tempo", define MacKay, "e o fato de ter sido filmado num plano só reforça essa sensação, esse sentimento. No cinema, a gente sempre trabalha com tempo e espaço para criar alguma coisa, talvez uma ilusão, mas nunca com essa intensidade", reforça Chapman.
Recentemente, Steven Spielberg filmou as trincheiras em Cavalo de Guerra, criando cenas poderosas como a da corrida do animal por aquela espécie de corredor sem fim, e a outra em que soldados inimigos se unem no esforço de libertar o cavalo preso no arame farpado. Em 1957, Stanley Kubrick fez seu clássico Glória Feita de Sangue, e são dois filmes sobre a 1ª Guerra. Sam Mendes mostrou-os aos seus atores, discutiu-os com eles?

"Tivemos uma extensa preparação e ela envolveu muita leitura, muita conversa, mas Sam nos proibia de ver clássicos de guerra porque queria criar sua visão, e não queria que nos contaminássemos com a visão de outros diretores", contam. Sobre a preparação – é claro que deve ter sido extenuante. Não apenas a questão emocional, mas a física. Chapman – "Foi realmente uma longa preparação. Seis meses antes que começássemos a filmar.
Cada cena, mesmo a mais simples, envolve sempre uma coreografia entre os atores e a câmera, e sempre em externas, seja um campo aberto, uma correnteza de rio, uma floresta ou as ruínas provocadas pelo bombardeio. A primeira semana foi inesquecível. A gente caminhava durante horas no meio do nada, apenas George, Sam e eu, com as cópias do roteiro na mão, dizendo as frases e ouvindo do diretor o que ele pretendia fazer, e esperava que fizéssemos."

E MacKay – "Em todo filme, a dimensão do cenário e a colocação da câmera são importantes, mas nesse mais que nunca. Devido à coreografia, nós e a câmera sempre em movimento, mesmo em cenas de puro diálogo, repetíamos cem vezes para que o tempo e o espaço fossem perfeitamente definidos e mensurados. Nada poderia dar errado, porque senão todo o esforço estaria perdido". Não se trata de um plano contínuo de mais de duas horas. Foram vários planos-sequência compondo esse movimento contínuo. "Poderíamos falar sobre a questão da câmera, mas o importante é tentar passar o que foram esses seis meses para a gente. Estávamos ali, no meio do nada, e aí começaram a cavar as trincheiras, a produzir o lamaçal, passamos a ensaiar com uniformes, com as armas, vieram os figurantes, as explosões e, finalmente, a câmera. E, de repente, Shoot, Ação!, estávamos no meio do que parecia uma guerra de verdade."

Uma história de amizade. Lá pelas tantas, Blake pergunta a Will: Por que você me escolheu para acompanhá-lo nessa jornada?" E a resposta: "Porque achei que seria fácil, como pegar comida". Na verdade, não é, mas, no período em que ambos ficam juntos, consolidam uma amizade. "Era o que Sam nos dizia. Essa é uma saga de companheirismo e amizade. O fato de termos ficado juntos seis meses, o tempo todo, ajudou para que George e eu também ficássemos os melhores amigos", reflete Chapman.

O filme fecha um ciclo, mas, para evitar o spoiler, é melhor não dizer como termina. Um desafio físico portentoso. E o emocional? "Pois é, mas de atores é isso que se espera, não? Que sejamos capazes de sentir e transmitir emoções. A experiência com Sam foi demais. É só ele chamar e a gente vem correndo", concluem.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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