As rodovias e aeroportos que estão sendo devolvidos ao governo federal para serem relicitados devem atrair muitos interessados no mercado, afirmam especialistas do setor. Isso porque o problema não está no ativo em si, mas no contrato de concessão. Ao mudar as regras e adaptar as condições à nova realidade do País, a concessão volta a ser atraente.
"Na época dos leilões, os estudos de viabilidade foram superestimados. Havia um otimismo muito grande em relação ao crescimento do Brasil, que foi transferido para a expectativa de demanda", explica Alberto Sogayar, sócio da área de infraestrutura do escritório L.O. Baptista Advogados. Com a chegada da crise econômica, ficou evidente que as estimativas estavam muito além da realidade.
Para ter ideia, em 2018, as receitas de São Gonçalo da Amarante (RN) estavam 45% abaixo da projetada nos estudos de viabilidade e, em Viracopos, 36%, conforme estudos da época. Por outro lado, os investimentos previstos no edital continuavam tendo de ser cumpridos e as outorgas pagas à União. Segundo a sócia da área de Infraestrutura, Regulação e Assuntos Governamentais no BMA Advogados, Ana Cândida de Mello Carvalho, o risco da demanda era do concessionário, como deveria ser.
O problema é que a modelagem não previa gatilhos de demanda para a realização dos investimentos. Isso criou, por exemplo, aeroportos gigantes sem passageiros, como é o caso de Viracopos – que já teve interessados na compra do terminal. "Era uma modelagem que não olhava a viabilidade do projeto ao longo do tempo. Ou seja, houve um erro do modelo", diz Ana Cândida.
Além disso, boa parte das concessionárias tinha como sócia uma construtora. Portanto, o elevado volume de obras beneficiava as empreiteiras, diz a sócia da área de Infraestrutura & Projetos do Vieira Rezende. Mariana Aidar. "Às vezes, a TIR (taxa de retorno) não era atraente, mas tinha o projeto para construir." Junta-se a isso o fato de o governo destacar entre as condições do leilão uma linha de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES).
No meio do caminho veio a Lava Jato e interrompeu esse fluxo de crédito para as empresas envolvidas no escândalo de corrupção. A Galvão Engenharia, que perdeu a concessão da BR-153, foi uma das que não conseguiram o empréstimo do banco de fomento. A Odebrecht, pivô da Lava Jato, também teve o crédito da BR-163 (MT) negado. Nesse caso, em vez do pedido de devolução, a empresa tenta vender a concessão.
Outra concessionária que pode devolver a concessão é a Concebra, da Triunfo Participações e Investimentos (TPI). A empresa – que administra um trecho de 1.176 km das rodovias BR-060, BR-153 e BR-262 – está em disputas com o governo federal para aderir à relicitação.
<b>Processo longo</b>
Especialistas destacam, no entanto, que o processo de devolução e relicitação não é fácil nem rápido. Depois da decisão da empresa de devolver a concessão, as agências reguladoras precisam aprovar o pedido. Em seguida, enviam o processo ao Ministério de Infraestrutura, que bate o martelo sobre o assunto.
Depois disso, a empresa e a agência reguladora precisam discutir a elaboração do termo aditivo. Isso inclui definir o valor da indenização dos investimentos feitos e não amortizados. "O caminho é longo e o cálculo, difícil, o que pode gerar algumas discussões", diz Ana Cândida.
No caso da Via 040, o primeiro pedido para devolução ocorreu em 2017 e foi reapresentado no ano passado, quando o governo publicou o decreto da relicitação. O enquadramento no PPI ocorreu no mês passado e a expectativa de colocar a rodovia em leilão é de fevereiro de 2022, segundo a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Em nota, a Via 040 afirma que, até a conclusão do processo, continuará prestando serviços de operação e manutenção da via.
Em Viracopos, embora o pedido não tenha sido protocolado ainda, algumas empresas já foram selecionadas para fazer os estudos de viabilidade para o governo. A expectativa é que esses estudos sejam entregues em maio. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>