Relatório da Operação Camarote, deflagrada pela Polícia Federal (PF) para investigar denúncia de vacinação contra a covid-19 clandestina de empresários em Belo Horizonte, mostra que a mãe do deputado federal Diego Andrade (PSD), líder da maioria na Câmara e coordenador da bancada de Minas Gerais na Casa, está entre as pessoas que passaram pela suposta imunização.
A mãe do parlamentar, Cléia Terezinha de Andrade, é irmã do ex-senador e empresário do setor de transportes Clésio Andrade. Outros dois irmãos do ex-parlamentar, Clenir José de Andrade e Clever Soares de Andrade, também teriam utilizado o serviço, além de Bruna Barbosa de Faria Brito, filha da ex-mulher de Clésio Andrade, Adriene Barbosa, ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) e ex-prefeita de Três Pontas, falecida em 2018.
Por nota, o deputado Diego Andrade afirmou que na data da "suposta vacinação" estava em Brasília, e que responde somente pelos seus atos, pelos de seus filhos menores, "e ninguém mais". Disse ainda que defende a imunização regular e aguarda sua vez para ser vacinado "como todo brasileiro deve fazer".
Além dos parentes do ex-senador, já prestaram ou vão prestar depoimento à PF o presidente da Companhia de Gás de Minas Gerais, (Gasmig), Pedro Magalhães Bifano, irmão do deputado estadual João Magalhães, e empresários dos setores de transporte e têxtil de Minas Gerais. Clésio Andrade depôs na quarta-feira, 14.
A Polícia Federal iniciou investigação sobre a imunização clandestina de empresários na capital mineira depois de reportagem da revista <i>piauí</i> sobre suposta vacinação de pessoas em garagem de empresa de ônibus no bairro Caiçara, região noroeste da cidade. À publicação, o ex-senador Clésio chegou a dizer que tinha sido vacinado. Depois, negou que tenha passado pela suposta imunização.
Vídeos aos quais o <i>Estadão</i> teve acesso mostram várias pessoas na garagem da empresa, que é um dos braços da transportadora Saritur, uma das maiores do setor em Minas Gerais, e uma mulher de jaleco branco fazendo movimentos semelhantes aos usados para aplicação de vacina. Algumas passavam pelo procedimento dentro de seus carros. Segundo a Polícia Federal, a suposta vacinação ocorreu durante dois dias no local, na segunda-feira, 22, e na terça-feira, 23 de março.
Inicialmente foi levantada a possibilidade de importação irregular de vacinas ou, ainda, desvio de imunizante do Sistema Único de Saúde (SUS). As diligências da PF, no entanto, apontaram para a possibilidade de golpe.
As investigações apontaram que a mulher de jaleco branco seria Claudia Freitas, cuidadora de idosos, que se passava por enfermeira, e chegou a ser presa. O esquema teria a participação do filho, Igor Torres de Freitas. Nas buscas da operação Camarote na casa de Claudia foram encontradas ampolas de soro fisiológico, que, conforme a PF, pode ser o que a falsa enfermeira aplicava em seus "clientes". A corporação apurou ainda que a mulher vinha atuando com o esquema desde fevereiro.
<b>Sócios</b>
O relatório da operação Camarote, ao qual a reportagem do <i>Estadão</i> teve acesso, foi feito com base em lista com nomes que teriam passado pela imunização apreendida na garagem do bairro Caiçara. O documento mostra fotos dos parentes do ex-senador.
Um trecho diz que "assim como os demais irmãos, Cléia também compõe o quadro acionário de empresas atuantes no ramo de transportes". E que "vale registrar ainda, que Cléia Terezinha é mãe do deputado federal Diego Leonardo de Andrade Carvalho, filiado ao partido PSD. Logo abaixo, uma foto do parlamentar com Clésio.
O relatório afirma ainda que o nome do ex-senador não consta na lista apreendida, mas não descarta a participação do ex-parlamentar. "Diante do exposto, em que pese não constar expressamente o nome do ex-senador Clésio Andrade na lista que supostamente relaciona as pessoas que receberam a dose de vacina contra covid-19 de forma irregular, o fato de constar parentes próximos do político, presume a efetiva participação do ex-senador no esquema clandestino de imunização, que também pode ter sido um dos vacinados, na ocasião", aponta o documento.
Em depoimento à PF nesta quarta-feira, por videoconferência, o ex-senador afirmou, conforme nota divulgada pela assessoria do ex-parlamentar, que "durante conversa telefônica com um amigo, sobre temas do transporte, tomou conhecimento da disponibilidade de vacina da farmacêutica Pfizer, mas não se interessou". A Pfizer, logo depois das imagens da suposta vacinação e de rumores de que o imunizante utilizado seria o da empresa, negou que tenha negociado doses no Brasil.
O ex-senador, ainda conforme a nota, "explicou que sua mulher, Gisa Andrade, se interessou pela oferta por ser portadora de doença crônica e tomou a frente para se vacinar. Clésio Andrade esclareceu que sua mulher contatou seus irmãos e pagou R$ 3.600,00 para que pudessem receber o imunizante".
Segundo a nota, "na data marca, por solicitação de sua mulher, Clésio Andrade a acompanhou até o local combinado. Ele disse que, novamente, recebeu oferta de tomar a injeção, mas recusou. Gisa recebeu a aplicação e logo em seguida eles entraram no carro e foram embora. Andrade esclareceu que não encontrou com seus irmãos e não sabe se eles tomaram a injeção".
O texto diz ainda que "no dia seguinte, ao ver a repercussão pela imprensa, Gisa Andrade pesquisou na internet o nome do homem para o qual foi feito o depósito e identificou sua mãe que se apresentou como enfermeira. Com esses dados, amigos do casal conseguiram a ficha criminal de Igor Torres de Freitas".
A nota afirma que "Clésio Andrade disse ao delegado que repassou as informações sobre Igor e sua mãe aos irmãos Lessa para informá-los de que tinham sido vítimas de uma fraude e tranquilizá-los, pois não tinham cometido crime algum". Os irmãos Lessa aos quais o senador se refere são Rômulo Lessa e Robson Lessa, da Saritur, também já ouvidos pela PF. A reportagem não conseguiu localizar os irmãos de Clésio Andrade e a filha da ex-mulher do senador.
<b>Íntegra da nota de Clésio Andrade</b>
O empresário Clésio Andrade prestou depoimento ao delegado da PF Rodrigo Morais, esta tarde, por videoconferência, no caso da dita vacinação em Belo Horizonte.
Andrade disse que, "durante conversa telefônica com um amigo, sobre temas do transporte, tomou conhecimento da disponibilidade de vacina da farmacêutica Pfizer, mas não se interessou.
Explicou que sua mulher, Gisa Andrade, se interessou pela oferta por ser portadora de doença crônica e tomou a frente para se vacinar. Clésio Andrade esclareceu que sua mulher contatou seus irmãos e pagou R$ 3.600,00 para que pudessem receber o "imunizante".
Na data marca, por solicitação de sua mulher, Clésio Andrade a acompanhou até o local combinado. Ele disse que, novamente, recebeu oferta de tomar a injeção, mas recusou. Gisa recebeu a aplicação e logo em seguida eles entraram no carro e foram embora. Andrade esclareceu que não encontrou com seus irmãos e não sabe se eles tomaram a injeção.
No dia, seguinte, ao ver a repercussão pela imprensa, Gisa Andrade pesquisou na internet o nome do homem para o qual foi feito o depósito e identificou sua mãe que se apresentou como enfermeira. Com esses dados, amigos do casal conseguiram a ficha criminal de Igor Torres de Freitas.
Clésio Andrade disse ao delegado que repassou as informações sobre Igor e sua mãe aos irmãos Lessa para informá-los de que tinham sido vítimas de uma fraude e tranquilizá-los, pois não tinham cometido crime algum.
<b>Íntegra da nota de Diego Andrade</b>
Na data da suposta vacinação, que depois veio se caracterizar como golpe contra os mineiros, o deputado Diego Andrade estava em Brasília trabalhando. O parlamentar defende a imunização regular e aguarda sua vez para ser vacinado como todo brasileiro deve fazer. Reitera que responde unicamente pelos próprios atos e de seus filhos menores de idade, e ninguém mais.