“Quem vai pagar a conta é o consumidor final”. A frase é da empresária contábil Silvana Araújo, diretora de Relações Tributárias da ACE-Guarulhos e da regional do Sescon, sobre o reajuste de alíquotas do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) que deixará mais caros, na prática, alimentos e insumos hospitalares, entre outros produtos. O decreto do governador João Doria entrará em vigor no próximo dia 15.
Oficialmente o governo do estado alega que o decreto é necessário para o equilíbrio dos cofres públicos que estaria impactado diante das ações na quarentena. Entretanto, ao GuarulhosWeb, Silvana diz que não concorda com a justificativa. “De janeiro a novembro de 2020, ao contrário do que alega o Estado, a gente já tem um valor superior ao do ano passado em R$ 229 bilhões nos cofres públicos. Então, não fecha a informação de que a arrecadação está baixa e precisa aumentar o imposto. Por isso eu acho que ele acaba sendo mais oportuno do que realmente necessário”, afirma Silvana, que usa números levantados pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
Fuga de empresas
Apesar da tentativa de arrecadar mais com o reajuste, a medida, de acordo com a especialista, pode causar um efeito reverso, caso parte das empresas, fugindo das taxas, migrem para outros estados. “Acho que isso pode trazer consequências bem ruins para a indústria que, se tiver condições, pode deixar São Paulo diminuindo – aí sim – a arrecadação”, complementa.
Oficialmente o governo Doria não anuncia o decreto como um aumento de ICMS e, sim, como redução de benefícios fiscais.
“No Estado de SP, a alíquota padrão do ICMS é de 18%. Por esta razão, as alíquotas inferiores são incentivo fiscal, conforme previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (parágrafo 1º do artigo 14 da Lei Complementar nº 101). Dessa forma, é equivocada a alegação de aumento de tributo”, justifica o Estado ao GuarulhosWeb.
Entidades empresariais, no entanto, rebatem e afirmam que a medida é um reajuste tributário “disfarçado”. “A lei autoriza a redução linear de 20% nos benefícios fiscais concedidos a alguns setores da economia. Setores esses que por muitos anos se beneficiaram com isenções de até 100% do ICMS. Por decisão do governador João Doria, os produtos que compõem a cesta básica, além do arroz e do feijão, continuarão a receber o benefício. As transações de medicamentos, equipamentos e insumos para a rede pública de saúde e Santas Casas também terão os benefícios mantidos”, completa a nota do Estado à reportagem.
O que deve ficar mais caro com a medida do governo estadual?
Apesar da manutenção do benefício aos produtos que compõem a cesta básica, outros alimentos, essenciais na mesa do brasileiro, sofrerão com a decisão. “A gente tem produtos que eram isentos, como hortifruti, leite, insumos agropecuários, máquinas e equipamentos, carros usados, saúde, alimentação e construção civil. Todos eles eram, de certa forma, isentos de ICMS e, agora, começarão a ter uma isenção parcial, que vai gerar um aumento na arrecadação bastante considerável e um impacto negativo para a população”, explica.
Entre os prejudicados com o aumento real, segundo dados da Confirp Consultoria Contábil, estão o leite (27,83%), queijo e suco de laranja (10,83%), frango (25%) e carnes bovina e suína (10,83%). A respeito dos medicamentos e insumos para a rede pública, Silvana argumenta que também será prejudicado pela medida de Doria. “A gente está falando sobre pandemia, sobre vacinação em massa daqui a algum tempo e acontece um acréscimo muito grande em seringas, agulhas e insumos e era uma coisa que não poderia ter nesse momento. Como consequência, o plano de saúde vai aumentar”, completa a contadora.
Até o delivery de alimentos, tão utilizado durante a pandemia, antes beneficiado, passará a ser tarifado em 3,69%. A administração diz que espera receber R$ 7 bilhões com o decreto e alegando que a medida, garantida pela Constituição, é necessária.