O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, manteve decisão do Tribunal Federal da 1ª Região que reconheceu a validade da proibição do transporte fluvial para fins de passeio no Amazonas para combater a pandemia do novo coronavírus. O ministro deferiu parcialmente liminar a pedido da União e suspendeu apenas trecho da decisão que declarou incidentalmente a inconstitucionalidade de dispositivo de medida provisória do governo Bolsonaro que condicionou a restrição de passageiros em rodovias, portos e aeroportos a emissão de parecer técnico da Anvisa. No entanto, o ministro pontuou que o comando não afeta o resultado prático do decreto estadual que proibiu o transporte de passageiros no Amazonas.
Barroso avaliou que a declaração incidental do dispositivo afrontou decisões liminares dadas pelo ministro Marco Aurélio no sentido de reconhecer a validade da MP de Bolsonaro, mas ressaltou que a decisão do TRF-1 aponta omissão da Anvisa e que o decreto estadual que proibiu o transporte nos rios do Amazonas não alcança o serviço essencial.
A decisão foi dada no âmbito de uma reclamação ajuizada pela União contra decisão liminar do Juízo da 1ª Vara Federal do Estado do Amazonas que foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Tais decisões foram dadas no âmbito de uma ação civil pública apresentada pelas Defensorias Públicas da União e do Estado do Amazonas, que alegavam que, em razão da medida provisória editada pelo governo Bolsonaro, a Marinha passou a entender que não deveria mais cumprir o decreto estadual que proibiu o transporte fluvial de passageiros.
A Justiça do Amazonas proferiu decisão declarou incidentalmente inconstitucional o trecho da medida provisória que vinculava as restrições de passageiros ao parecer da Anvisa por ser tratar de medida desproporcional com a realidade fática do interior do Estado do Amazonas.
O despacho indicou que nota técnica em que o órgão recomenda aos passageiros que lavem as mãos e usem álcool em gel era medida insuficiente em razão da realidade local, seja porque não há equipe de fiscalização nos portos do Amazonas, seja porque o transporte de passageiros em barcos de passeio é caracterizado por aglomerações.
O juiz determinou então que a Marinha cumprisse imediatamente o decreto estadual, com fiscalização da proibição do transporte fluvial de passeio de passageiros no estado. A liminar ressaltou ainda os riscos que a inobservância das medidas de contenção do vírus pode causar às populações indígenas. Foi ressalvada a circulação de policiais, agentes de saúde e transporte de carga.
<b>A reclamação no Supremo</b>
Ao Supremo, o governo alegou que o tema discutido nas decisões poderia desestabilizar o pacto federativo e por isso seria da competência da Corte o processamento e julgamento da ação civil pública em que as decisões questionadas foram dadas.
Além disso, argumentou que a decisão do TRF-1 violava as liminares dadas pelo ministro Marco Aurélio que reconheceram a validade da medida provisória do governo Bolsonaro que condicionou a restrição de passageiros em rodovias, portos e aeroportos a emissão de parecer técnico da Anvisa.
Ao avaliar o caso, Barroso explicou que, de acordo com as liminares concedidas por Marco Aurélio, concluiu-se que o artigo 3º, inciso VI, da MP 926/2020 permanece eficaz, mas não impede a entes regionais e locais a prática de atos inseridos na sua esfera de competência.
O dispositivo estabelece que as autoridades poderão implementar medida de restrição excepcional e temporária de locomoção intermunicipal, conforme recomendação técnica e fundamentada da Anvisa. Além disso, determina que, nessa hipótese, se afetarem a execução de serviços públicos e atividades essenciais, somente poderão ser adotadas em ato específico e desde que em articulação prévia com o órgão regulador ou o Poder concedente ou autorizador federal.
"A decisão reclamada evidencia, no entanto, a omissão da agência reguladora quanto ao transporte fluvial e destaca que a medida imposta no decreto estadual não afeta serviços públicos e atividades essenciais", indicou o ministro.
Barroso também considerou que os autos revelam conflito pontual no exercício de competências legislativas concorrentes e político-administrativas comuns. Para o ministro, a princípio não se vislumbra a alegada usurpação da competência do STF.
Segundo ele, embora o Estado do Amazonas tenha requerido seu ingresso na ação civil pública originária, isso não basta para atrair a competência do Supremo. Somente o litígio entre entes políticos com potencialidade de desestabilizar o pacto federativo se sujeita à competência originária do Supremo, o que não é o caso dos autos, indicou o ministro.