Estadão

Bolsonaro muda Casa Civil para estruturar reeleição

A entrada do senador Ciro Nogueira (PI) na Casa Civil, anunciada ontem, representa um movimento político importante para o presidente Jair Bolsonaro em um momento de crescente perda de popularidade do governo. Ao levar o Centrão para a "cozinha" do Palácio do Planalto, Bolsonaro avança várias casas no jogo para barrar o impeachment, atrai apoio no Senado e tenta alavancar sua campanha ao segundo mandato, em 2022. Presidente do Progressistas, Nogueira foi confirmado ministro e capitão do time com a missão de diminuir o desgaste de Bolsonaro – alvo da CPI da Covid -, tirar o governo da rota de colisão com outros poderes e conquistar aliados.

O presidente se reuniu ontem com Nogueira e acertou que ele será o responsável, a partir de agora, pela articulação política do Planalto com o Congresso. Sem partido, Bolsonaro negocia a filiação ao Progressistas e quer contar com a estrutura da sigla PP, forte no Nordeste, em sua tentativa de reeleição.

Com a estratégia de ceder espaço ao Centrão, o presidente faz a 27.ª mudança na equipe em dois anos e meio de mandato e tira o protagonismo de generais sem voto, como o ministro Luiz Eduardo Ramos, que deixou a Casa Civil e foi deslocado para a menos prestigiada Secretaria-Geral, até então ocupada por Onyx Lorenzoni. Visto como um curinga, Onyx já passou por três pastas e recebeu a promessa de ser transferido para Emprego e Previdência, que será recriado com o desmembramento do Ministério da Economia.

Nogueira é o quarto titular da Casa Civil. Antes dele ocuparam o cargo o próprio Onyx, Walter Braga Netto – hoje ministro da Defesa – e Ramos. Na prática, o senador assume sob a desconfiança da ala militar do governo, que vem perdendo poder. Ao <i>Estadão</i>, Ramos chegou a dizer, na semana passada, que havia sido "atropelado por um trem" ao saber que seria substituído.

Bolsonaro procurou contemporizar o mal-estar, uma vez que Ramos tentou dissuadi-lo da mudança algumas vezes. "O general Ramos é uma excepcional pessoa, é meu irmão. Agora, com o linguajar do Parlamento, ele tinha dificuldade. É a mesma coisa que pegar o Ciro Nogueira e botar ele (sic) para conversar com generais do Exército."

O novo ministro não vê problemas em mudar de lado político. Menos de três anos atrás, Nogueira era aliado do PT. Foi muito próximo dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva – hoje o principal adversário de Bolsonaro – e de Dilma Rousseff. Em 2018, quando Lula estava preso, disse no Twitter que deixá-lo fora da disputa era "tirar do eleitor um direito de escolha". Afirmou, ainda, que iria com o petista "até o fim". "Não podemos abrir mão dos sonhos do presidente Lula de um País melhor para os brasileiros", insistiu.

Naquela campanha, Nogueira usava a hashtag "Sou Lula". No plano regional, o senador sempre foi um aliado do governador do Piauí, Wellington Dias (PT). Réu da Lava Jato, Nogueira responde a cinco processos na Justiça, entre os quais inquéritos que investigam denúncias de propinas recebidas da Odebrecht e da JBS. Ele nega as acusações.

Diante das críticas de que contrariou promessas de campanha ao se casar de papel passado com o Centrão, Bolsonaro respondeu que precisa melhorar a interlocução com o Congresso. "Fomos nos moldando", argumentou ele ontem.

<b>Comissão</b>

A saída de Nogueira da CPI da Covid, onde era titular, põe o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) como suplente da comissão. A cadeira do presidente do Progressistas na CPI será agora ocupada pelo correligionário Luis Carlos Heinze (RS). Nogueira deve tomar posse na Casa Civil na próxima semana. Ao entrar no governo, ele também deixa temporariamente o comando do partido, que passará para o deputado André Fufuca (MA).

"Acabo de aceitar o honroso convite para assumir a chefia da Casa Civil feito pelo presidente Jair Bolsonaro. Peço a proteção de Deus para cumprir esse desafio da melhor forma que eu puder, com empenho e dedicação em busca do equilíbrio e dos avanços de que nosso país necessita", disse Nogueira no Twitter.

Na Câmara, Bolsonaro conta com o presidente da Casa, Arthur Lira (Progressistas-AL) para aprovar projetos e impedir o impeachment, mas até agora não tinha nenhum integrante do Senado na equipe. É ali que serão sabatinados o advogado-geral da União, André Mendonça, indicado por Bolsonaro para uma vaga no Supremo Tribunal Federal, e o procurador-geral da República, Augusto Aras, candidato à recondução ao cargo.

Nessa reforma da equipe, o presidente aumentou o número de ministérios para 23. Em 2018, sua plataforma de governo previa a redução de pastas e um gabinete enxuto. À época, Bolsonaro fazia críticas contundentes à velha política e ao "toma lá, dá cá", acusava o PT de fisiologismo e prometia jamais lotear o governo.

O general Augusto Heleno, hoje ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), chegou a cantarolar uma música trocando o termo "ladrão" por "Centrão". "Se gritar pega Centrão, não fica um, meu irmão", ensaiou Heleno numa convenção do PSL, antigo partido de Bolsonaro, mudando o verso da letra de Reunião de Bacanas.

"Eu sou do Centrão", disse Bolsonaro na última quinta-feira, na esteira das críticas à contradição entre o discurso e a prática, ao lembrar que foi filiado ao Progressistas, então PP, por 11 anos.

Em fase de expansão, o partido de Nogueira está filiando ministros, como Fábio Faria (Comunicações), de saída do PSD. O Progressistas tem atualmente a terceira maior bancada na Câmara, com 41 deputados. No Senado, são sete parlamentares.

Nas eleições municipais do ano passado, a sigla cresceu. Elegeu 685 prefeitos e 6,3 mil vereadores, atrás apenas do MDB, que tem 784 prefeitos e 7,3 mil vereadores. Nogueira administrou até hoje a quarta maior fatia de recursos do fundo eleitoral, que Bolsonaro propõe dobrar para R$ 4 bilhões, no ano que vem. Se o acordo com o Congresso vingar, o Progressistas deve ficar com cerca de R$ 280 milhões para a eleição de 2022. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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