Enquanto a Europa volta a se fechar para conter a segunda onda da covid-19, o Brasil continua estável na primeira, sem previsão de queda ou aumento significativo do número de casos a curto prazo. O caso do Brasil é único no mundo e intriga infectologistas, epidemiologistas e estatísticos.
Segundo os especialistas, o País ainda está longe de debelar a primeira onda.
A segunda onda só ocorre depois de um primeiro pico infeccioso agudo, seguido de uma queda considerável no número de casos e mortes, chegando praticamente a zero.
Subitamente, há um aumento importante dos registros, superior a 50%.
É o que está acontecendo em vários países da Europa, como França, Espanha e Alemanha, que voltaram a anunciar medidas de lockdown para conter a disseminação do vírus.
O padrão brasileiro é bem diferente.
Houve um pico epidemiológico entre junho e julho, seguido de uma ligeira queda e de uma estabilização no número de casos e mortes.
Durante alguns meses, o número de mortos girou em torno de mil por dia.
Nas últimas semanas está próximo dos 500, patamar considerado ainda muito alto.
“No Brasil todo estamos na primeira onda ainda; tivemos uma queda, mas estabilizamos em níveis muito altos e não conseguimos baixar”, explicou o coordenador do projeto Covid-19 Analytics, da PUC-Rio, Marcelo Medeiros, especialista em estatísticas.
“Ou seja, seguimos em mar revolto, mas nada indica que teremos uma segunda onda por enquanto.
” Na análise de especialistas, o lockdown implementado por diversos países da Europa durante a primeira onda da epidemia foi muito mais radical do que o imposto no Brasil.
Essa seria uma explicação para a queda abrupta do número de casos europeus e, agora, para o seu aumento, após um período de flexibilização das medidas de isolamento.
No Brasil, além de o lockdown não ter sido tão rigoroso, ele não teria sido eficiente em comunidades de grande densidade populacional, caso das favelas e periferias.
A dificuldade de controle passa, também, pela baixa testagem dos casos.
Ápice longo “No Brasil, não tivemos propriamente um pico, tivemos um ápice longo e uma descida muito lenta”, explica Alexandre Naime, chefe do Departamento de Infectologia da Unesp.
“Nossa taxa de transmissão continua alta, nosso R é menor do que 1 (ideal), mas ainda está muito próximo de 1, por isso o decréscimo é tão lento.
” Para os cientistas, o importante agora seria ampliar consideravelmente a testagem, para localizar as cadeias de transmissão.
“Devemos nos preocupar em controlar o que está acontecendo hoje”, disse a pneumologista Margareth Dalcolmo, da Fiocruz.
“As medidas foram muito relaxadas.
Será que precisávamos abrir cinemas, quando se sabe que a transmissão ambiental é crucial?” O epidemiologista Amílcar Tanuri, do Instituto de Biologia da UFRJ, concorda com a colega.
“Temos de monitorar mais os casos e chegar a uma taxa de incidência segura para, por exemplo, liberar as crianças para a escola”, disse.
“Para poder mos voltar com coisas importantes e sacrificar outras, como ficar em bares até a madrugada.
” Especialista em gestão de saúde da UFRJ, Chrystina Barros frisa que cada um deve cumprir o seu papel.
“A doença continua se disseminando, precisamos manter os cuidados”, afirmou.
“Os governos precisam ser coerentes, dar o exemplo e mandar mensagens claras, e a população precisa fazer sua parte, manter o distanciamento, higienizar as mãos e usar máscara.
” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.