A decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ) de cassar os mandatos do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) e do vice-governador Francisco Dornelles (PP) é mais um fator a atrapalhar a conclusão do acordo em torno do plano de recuperação fiscal do Estado do Rio, firmado no fim do mês passado com o governo federal. A cassação não tem efeito ainda porque cabe recurso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Às vésperas de uma audiência de conciliação, no âmbito de uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) em que o Rio pede a antecipação dos efeitos do plano, a decisão do TRE-RJ serve de combustível para as tensões entre oposição e base governista na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).
A audiência de conciliação foi convocada pelo ministro Luiz Fux, relator da ação do Estado do Rio no STF. No dia seguinte à assinatura do termo de compromisso entre Rio e União, o governo fluminense recorreu ao STF pedindo a antecipação dos efeitos do acordo. Pelo termo, enquanto Pezão tem de mandar medidas de ajuste para a Alerj, o presidente Michel Temer mandará um projeto de lei para o Congresso Nacional, para modificar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), pois o plano de recuperação prevê medidas que desrespeitam a legislação na forma atual.
Pezão já havia sofrido um revés na terça-feira, quando a Advocacia-Geral da União (AGU), a Procuradoria-Geral da República (PGR), o Banco do Brasil (BB) e a Caixa se manifestaram, na ação no Supremo, contra a antecipação do plano de recuperação para o Rio. Fux convocou a audiência de conciliação para ouvir as partes.
Sem a liminar, resta ao Estado do Rio esperar a aprovação do projeto de lei, que o governo federal ainda não enviou, no Congresso Nacional, incluindo Câmara e Senado. O presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB), já disse em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo que o governo fluminense não teria fôlego financeiro para esperar a aprovação do plano de recuperação no Congresso.
Na Alerj, a situação tenta minimizar os problemas, enquanto a oposição vê motivos até para um impeachment de Pezão. O deputado Paulo Melo (PMDB), que já foi presidente da Casa, afirmou que, sem uma liminar do STF, caberia a Temer editar uma Medida Provisória.
Picciani, que se reaproximou de Pezão num processo de recomposição da base aliada, na virada de 2016 para 2017, vem procurando, desde quarta-feira, demonstrar empenho para aprovar a primeira medida de ajuste exigida pelo Ministério da Fazenda como contrapartida do plano de recuperação – a privatização da Cedae, a estatal de águas e esgoto.
O início da discussão segue na pauta da Alerj desta quinta-feira, mas foi adiada para uma sessão extraordinária, de 19 horas às 22 horas. Isso porque a discussão depende do término da apreciação de 27 vetos de Pezão que estão pendentes na Casa. Em sessão extraordinária encerrada pouco antes de 22 horas de quarta, os deputados estaduais votaram 13 dos 27. Por volta de 12h30 desta quinta, os deputados apreciavam o 17º veto.
Desde quarta, a oposição vem usando o regimento interno da Alerj para estender a votação dos vetos. Somente a apreciação do primeiro veto levou 50 minutos. O regimento prevê que, para cada veto votado, cada um dos líderes de partido, além do autor e do relator do projeto votado, pode usar de até dez minutos para discursar. A apreciação dos vetos tranca a pauta e impede o início da tramitação do projeto que autoriza a privatização da Cedae.
Após a decisão do TRE-RJ, Picciani minimizou os efeitos sobre a tramitação do pacote de medidas de contrapartida, mas reconheceu que a cassação, mesmo que temporária, é um “enfraquecimento político” de Pezão. “É ruim, porque é um enfraquecimento político do governador”, disse Picciani, na noite de quarta-feira. “Espero que a decisão se reverta”, completou Picciani.
Para o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), a cassação de Pezão pode atrapalhar a recomposição da base aliada. A ação no TSE foi proposta por Freixo, que foi ao segundo turno na eleição para a prefeitura do Rio ano passado, mas perdeu para o senador Marcelo Crivella (PRB).
O deputado Luiz Paulo (PSDB) lembrou que, após a recomposição desde o fim de 2016, “a base tem um número (de deputados) maior, mas a margem não é grande”. No Rio, o PSDB faz oposição do governo Pezão e a bancada já se posicionou contra o pacote de medidas de ajuste. Na avaliação de Luiz Paulo, sem uma liminar do STF para antecipar os efeitos do plano de recuperação, a base aliada de Pezão pode ruir na Alerj, abrindo espaço para pedidos de impeachment.
Picciani reconheceu na quarta que a decisão do TRE-RJ pode embasar pedidos de impeachment. “Nessa situação política, tudo é combustível”, disse Picciani.