Estadão

Como os países lidam com a alta dos combustíveis

A invasão da Rússia à Ucrânia fez o petróleo atingir durante esta quinta-feira, 24, o patamar de US$ 105 o barril – acabou depois fechando o dia um pouco abaixo dos US$100. Isso fez com que os temores em relação ao preço do combustíveis, que se tornaram um problema em todo o mundo, aumentassem ainda mais. É uma discussão que tem sido vista em muitos países: como fazer para conter os efeitos desse aumento para os consumidores?

No Brasil, alguns projetos estão em discussão no Congresso. Dois deles estão prestes a serem votados no Senado – a votação estava marcada para esta semana, mas acabou sendo adiada. Um deles cria uma conta de estabilização de preços dos combustíveis. O outro altera o modelo de cobrança do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Seria uma tentativa de reduzir o impacto da alta da gasolina, do diesel e do gás na vida das pessoas – um ponto especialmente sensível para o presidente Jair Bolsonaro em um ano eleitoral.

Esse, porém, não é um problema apenas brasileiro. Com o descasamento da oferta e da demanda de energia durante a pandemia – a produção recuou no início da quarentena e não acompanhou a retomada da demanda, que aconteceu mais rápido do que se previa -, o preço não só do petróleo, mas de diversas fontes, explodiu. Assim, a energia se tornou um problema no mundo todo, e governos passaram a adotar medidas não muito tradicionais.

"Temos visto economias de mercado enfrentando a crise com duas políticas: tributária e social. Os países estão dando subsídio e reduzindo imposto ou mudando a metodologia de cálculo do imposto", diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

Para tentar conter a alta dos preços, nos Estados Unidos, por exemplo, senadores democratas pedem a suspensão do imposto federal sobre a gasolina até o fim do ano. No Japão, o governo está dando um subsídio para fornecedores de petróleo não passarem os reajustes aos consumidores e tem inspecionado postos de combustíveis para fiscalizar os valores que estão sendo cobrados.

<b>GÁS</b>

Os países da Europa têm lançado mão de medidas para segurar não só o reajuste da gasolina, mas principalmente o do gás natural. Historicamente, o preço do gás tem uma espécie de indexação ao do petróleo. Hoje, porém, com a transição energética e diante do fato de o gás ser considerado uma fonte de energia mais limpa que o petróleo, seu preço tem avançado muito mais rapidamente. A crise entre a Rússia e a Ucrânia, que ameaça o fornecimento de petróleo, também pressionou ainda mais o preço do gás.

Para contornar o problema, a Polônia quer zerar o imposto sobre valor agregado (IVA) do gás. O país já reduziu a alíquota do tributo sobre combustíveis de 23% para 8%. Na França, onde os protestos dos "coletes amarelos" surgiram em 2018 após um aumento no diesel, o pacote inclui a venda de energia pela estatal a preços inferiores ao de mercado. O presidente Emmanuel Macron, que enfrentará eleições em abril, também reduziu impostos da conta de energia e congelou o preço do gás.

Na Ásia, a Tailândia diminuiu um imposto sobre combustível em 50% e estabeleceu um limite de preço de 30 baht (R$ 4,70) para o litro do diesel. A diferença entre o preço pago pelo consumidor e o do produto no mercado internacional é bancada pelo Fundo Estatal de Petróleo. Há, porém, um problema. O fundo está recorrendo a empréstimos para dar o subsídio, segundo informações do jornal Nikkei.

O entrave na Tailândia é apontado como uma dificuldade comum que os fundos de petróleo costumam enfrentar. Estabelecidos com recursos provenientes de impostos do setor ou de dividendos pagos por petroleiras, os fundos destinam recursos para subsidiar o combustível quando a cotação dispara no mercado internacional.

Na análise da diretora do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) Valéria Lima, não há casos de sucesso de fundos de estabilização no mundo. Isso porque os fundos têm dificuldade de restringir os momentos em que os recursos serão usados. "Não dá para tentar segurar um aumento no petróleo para sempre com o fundo. Ele precisa ser visto como algo temporário. Caso contrário, o recurso acaba."

Para Valéria, hoje, a saída mais eficiente de curto prazo para a questão do combustível seria adotar subsídios para a população mais carente. A medida, diz ela, garante transparência e pode ser mais focada do que um imposto flexível, cuja alíquota reduz quando o petróleo aumenta e beneficia também os mais ricos.

Tanto Valéria quanto Adriano Pires veem na mudança no ICMS do combustível em discussão uma boa alternativa para amenizar o problema. Hoje, a cobrança utiliza um porcentual sobre o valor do preço, e não um valor fixo.

<b>PROJETOS</b>

Senadores passaram a usar a invasão da Ucrânia em suas argumentações para defender a aprovação dos projetos que propõem amenizar o aumento do preço dos combustíveis no Brasil. Um deles cria um fundo de estabilização para atenuar a alta dos preços, abastecido, entre outros recursos, por dividendos da Petrobras. O outro muda os parâmetros do ICMS, um imposto estadual.

A votação dos projetos, prevista para quarta-feira, foi adiada para 8 de março. "O sino que toca todos os dias é o do combustível crescendo de preço. E agora, com essa história da Ucrânia, pretexto ou não, vai ser um fator de elevação do preço internacional", disse o relator do projeto dos combustíveis no Senado, Jean Paul Prates (PT-RN).

Há, porém, resistência aos projetos, tanto de governadores, que temem a perda de recursos com a mudança no ICMS, quanto da equipe econômica do governo federal, que avalia a criação do fundo de estabilização como uma medida cara e ineficaz. A avaliação é de que, no fim das contas, não haverá efeitos práticos na ponta. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o relator, por outro lado, insistem na manutenção do projeto e na aprovação da proposta. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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