O presidente Jair Bolsonaro agiu para conter um desgaste maior com diferentes alas de sua base de apoio ao demitir o dramaturgo Roberto Alvim da Secretaria Nacional de Cultura, que parafraseou o ministro da propaganda da Alemanha nazista, Joseph Goebbels. Políticos governistas e opositores avaliaram que a principal pressão veio da comunidade judaica no Brasil, de quem o presidente se aproximou na campanha, mas também houve reações de repúdio de chefes de Poderes e de outros setores da sociedade – "olavistas", evangélicos e movimentos de renovação política.
A Confederação Israelita do Brasil disse que considera "inaceitável o uso de discurso nazista pelo secretário da Cultura do governo Bolsonaro" e cobrou a demissão de Alvim. "Uma pessoa com esse pensamento não pode comandar a Cultura do nosso país e deve ser afastada do cargo imediatamente", afirmou a entidade, em nota. "Quem recita Goebbels e o nazismo não pode servir a governo nenhum no Brasil", endossou a Federação Israelita de São Paulo.
Próximo do presidente e de seus filhos, o embaixador de Israel no Brasil, Yossi Shelley, conversou com ele, mas preferiu a discrição e não fez comentários públicos. Ao jornal <b>O Estado de S. Paulo</b>, a representação do governo israelense em Brasília endossou a demissão de Alvim. "A comunidade judaica e o Estado de Israel estão unidos no combate a todas as formas de antissemitismo. Por esta razão, a embaixada de Israel apoia a decisão do governo brasileiro de exonerar o secretário especial de Cultura, Roberto Alvim. O nazismo e qualquer uma de suas ideologias, personagens e ações não devem ser utilizados como exemplo em uma sociedade democrática sob nenhuma circunstância", diz a nota divulgada pela embaixada.
A Confederação Israelita do Brasil (Conib) divulgou comunicado em que afirma que a fala "é um sinal assustador" da visão de cultura de Alvim. "Emular a visão do ministro da Propaganda nazista de Hitler, Joseph Goebbels, é um sinal assustador da sua visão de cultura, que deve ser combatida e contida."
A representação diplomática da Alemanha no Brasil publicou postagem sem citar Alvim diretamente, afirmando que "o período do nacional-socialismo (de onde vem a abreviação "nazi", do nazismo) é o capítulo mais sombrio da história alemã, que trouxe sofrimento infinito à humanidade". Segundo o texto, "a Alemanha mantém sua responsabilidade. Opomo-nos a qualquer tentativa de banalizar ou mesmo glorificar a era do nacional-socialismo."
Antes inclinado a mantê-lo no cargo, segundo o próprio Alvim havia declarado, Bolsonaro mudou de ideia depois de manifestações dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli. "Há de se repudiar com toda a veemência a inaceitável agressão que representa a postagem feita pelo secretário de Cultura", disse Toffoli. O ministro do STF Gilmar Mendes escreveu, por sua vez, que "a riqueza da manifestação cultural repele o dirigismo autoritário nacionalista".
Para o vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (SP), Bolsonaro contornou um estrago político maior. "O presidente agiu certo e de forma ágil", afirmou Pereira, que é presidente do Republicanos e bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus. "A demissão do secretário resolveu o problema. Agora é atribuição do presidente encontrar outra pessoa de direita para a pasta, que é uma das mais infiltradas e aparelhadas pela esquerda", disse o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), também da bancada evangélica.
Integrantes da ala bolsonarista do PSL também afirmaram que Bolsonaro acertou. "Ele foi cirúrgico", afirmou a deputada Carla Zambelli (PSL-SP). O ex-partido do presidente divulgou nota dizendo que era "inadmissível aceitar tal posicionamento partindo de um representante de um país democrático".
Parlamentares da oposição fizeram representações à Procuradoria-Geral da República para apurar eventual crime de incitação ao nazismo por parte de Alvim, além da responsabilidade do Planalto sobre "perseguições" na cultura e na educação.
O movimento de renovação política Agora! manifestou repúdio ao episódio. "Ao valer-se da estética nazista para dar seu recado nitidamente totalitário, com o selo oficial do governo federal, o sr. Roberto Alvim cruzou todos os limites da civilidade e do respeito ao Estado de direito, às instituições democráticas e ao povo."
"Lamentável que nos dias de hoje alguém faça apologia ao nazismo. Uma vergonha e deplorável, sobretudo por vir de um representante público", disse o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), em rede social.
O apresentador de TV Luciano Huck também criticou. "Sou brasileiro de família judia. 6 milhões de judeus morreram por causa do nazismo. Usar a cultura para fazer revisionismo histórico é perverso e violento. O vídeo do secretário Roberto Alvim é criminoso. Revela uma conduta autoritária inaceitável", escreveu Huck em sua conta no Twitter. O apresentador tem sido apontado como possível candidato à Presidência da República em 2022. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>