Diferentemente do publicado anteriormente, o Itaú não renegociou 5% de 302 mil contratos. Os 5% se referem à parcela renegociada do valor total dos contratos, que somam R$ 12,1 bilhões.
A crise econômica provocada pela pandemia do novo coronavírus já levou dois milhões de clientes a bater na porta dos cincos maiores bancos do País para renegociarem R$ 200 bilhões de empréstimos. O levantamento divulgado ontem pela Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) não informa, porém, o valor total que já foi negociado até agora por Banco do Brasil, Bradesco, Caixa e Santander.
O Itaú Unibanco informou ter renegociado 302 mil contratos, com a prorrogação de parcelas equivalentes a R$ 679 milhões (no total, esses contratos somam R$ 12,1 bilhões). De acordo com o banco, todos os pedidos de renegociação estão sendo atendidos, desde que cumpridas as condições da oferta. A principal condição é estar em dia com o financiamento.
Pressionada por críticas de empresas e pessoas físicas sobre dificuldades para negociar um adiamento nas prestações em dois ou três meses, a Febraban afirmou que entende a "ansiedade" de diversos setores, mas é "preciso compreender que esse é um processo gradual e complexo, que demanda diversas providências e, em muitos casos, envolvem mudanças regulatórias".
A associação cita como exemplo de mudanças de normas que precisaram ser feitas a liberação de depósitos compulsórios por parte do Banco Central. O compulsório é formado por uma parte do dinheiro depositado nos bancos pelos correntistas. Esses recursos são mantidos no BC e os bancos não podem utilizá-los para fazer empréstimos, por exemplo.
Até o momento, o BC anunciou a injeção de R$ 1,2 trilhão no sistema financeiro (R$ 124 bilhões em compulsórios). Parte dos recursos ainda depende de regulamentação para começar, de fato, a chegar às instituições financeiras, mas o BC tem afirmado que o mercado já "está líquido". "Ao contrário do que aconteceu na crise de 2008, desta vez, não estamos observando um empoçamento, mas, sim, um aumento substancial nas necessidades por recursos líquidos, o que torna esta crise bem diferente da anterior", afirmou a Febraban na nota.
No sábado, durante conferência com representantes do varejo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o "empoçamento" de recursos nos bancos estaria retardando a chegada de ajuda para quem precisa na crise. Por isso, a aposta do governo é permitir que o BC negocie diretamente carteiras de crédito e títulos de empresas. A medida está prevista na PEC do "orçamento de guerra", que já foi aprovada pela Câmara e precisa do aval do Senado.
A assessoria da Febraban diz que não há uma contestação ao ministro Guedes, mas "apenas um esclarecimento do setor". Além disso, a entidade diz que os bancos internacionais cortaram as linhas para os bancos brasileiros, o que diminuiu a oferta de recursos no mercado.
Para o diretor da consultoria Teros, Juan Ferres, não se trata de falta de liquidez, neste momento, já que as captações feitas pelos bancos aumentaram nos últimos dias. "Trata-se de um problema operacional de avaliação de risco para destravar o processo", avalia o economista, que montou uma plataforma em tempo real aberta na internet, com dados do impacto da crise em diversos indicadores da economia real. "Por mais que se injete liquidez, os bancos estão tendo muita dificuldade para elaborar uma proposta de crédito aos clientes, já que não há parâmetros para precificar esse crédito", disse.
O economista explica que nem os bancos nem as empresas sabem ao certo quanto tempo e qual a intensidade da crise, de modo que se torna difícil definir, por exemplo, qual carência um estabelecimento irá precisar para poder começar a pagar a dívida ou mesmo se esse estabelecimento irá conseguir se manter depois da crise. Essa incerteza levaria a um alongamento do tempo de análise dos pedidos.
Segundo Ferres, a redução na concessão de créditos para lojistas ou empresas pode ser vista, por exemplo, nos dados de fluxo de operações de antecipação de recebíveis de cartão de crédito. A queda decorre de dois fatores: falta de recebíveis (e garantias) dessas empresas, já que o fluxo financeiro habitual caiu entre 30% e 70%, dependendo do setor; e da incerteza quanto à intensidade e duração da crise ainda existente.
<b>Endividamento</b>
Pesquisa recente da Confederação Nacional de Comércio (CNC) mostrou que em março o endividamento bateu recorde: 66,2% dos trabalhadores possuíam dívidas entre cartão de crédito, cheque especial, crédito pessoal, crédito consignado, carnês, financiamentos de carros, financiamentos de imóveis. Embora mais endividadas, a inadimplência das famílias estava relativamente estável, o que deve mudar agora.
"Os bancos não querem dar dinheiro novo, nem querem alongar. Querem comprar só títulos públicos. O BC tem de reduzir mais os juros para os bancos ganharem menos dinheiro ao comprarem os títulos públicos", afirma Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da CNC.
O setor de comércio previa um aumento das vendas do varejo de 3% no ano, mas a previsão já é de uma queda de 4%. Para Freitas, é preciso evitar que o País entre numa depressão, quadro muito mais grave, caracterizado não só por queda do PIB como também de deterioração do mercado de trabalho, com forte aumento do desemprego e grande perda de renda do trabalhador.