Noticia-geral

Demora no SUS complica tratamento contra câncer

As diferenças no tratamento para o câncer podem não depender apenas dos aspectos específicos da doença e das variações entre pacientes. Tempo de espera por consultas com especialistas, facilidade para realização de exames, diagnóstico precoce e disponibilidade de tratamentos modernos não são iguais nas redes pública e privada.

O pai da analista de sistemas Monica Xavier Fonseca, de 45 anos, fazia o acompanhamento em São Paulo até se mudar para Extrema (MG). Após seis meses de espera, ele conseguiu uma consulta de rotina e fez o exame de PSA, cujo resultado foi considerado alto. Foi em novembro do ano passado. Como ele estava encontrando dificuldade para ser consultado rapidamente com um urologista, a família resolveu se unir para trazê-lo de volta para São Paulo para a realização de consultas e tratamento.

Mas os prazos longos que eram dados na rede pública fizeram com que as etapas necessárias para fechar o diagnóstico fossem feitas na rede particular. “Fizemos uma vaquinha e o levamos a um médico particular, que fez o exame de toque e viu que ele estava com o problema de câncer de próstata. Ele não conseguiu fazer os exames na rede pública, todos eram muito demorados. Tomografia, cintilografia e raio X do tórax para ver se tinha dado metástase. Acabamos fazendo tudo particular. Só fez a biópsia em Diadema, porque conseguimos um encaixe”, disse Monica.

Nessa fase, a família do aposentado Leoncio Xavier Rodrigues, de 74 anos, pagou R$ 1.080, mas Monica diz que não se arrepende de ter feito a mobilização para conseguir ajuda. “É horrível saber que seu pai está morrendo e pode não ter chance de ser atendido, porque há várias pessoas na mesma situação. Só um exame, a tomografia, estava marcado no hospital público e era só para abril. Fomos, então, nos lugares mais baratos e pedimos descontos.”

Com os resultados em mãos, o aposentado conseguiu encaminhamento para ser atendido no Hospital São Paulo, ligado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), onde fez cirurgia para remoção do tumor em março.

“Ele foi operado, refez o exame pelo Hospital São Paulo e começou a fazer hormonioterapia. E começou a luta para fazer o tratamento. O remédio estava em falta e fizemos outra vaquinha para comprá-lo. Custava R$ 2.500. Depois, trocaram a medicação dele. Não sei se tem o mesmo resultado.”

Monica diz que, agora, a nova saga é para pegar a medicação. “A gente precisa ficar ligando quase todos os dias para saber se já chegou. Quando chega, minha irmã, que mora mais perto, vai lá buscar. A gente tem medo que ele fique sem, ele precisa desse remédio.”

Apesar das dificuldades enfrentadas, ela comemora o atual estado de saúde do pai. “Ele ficou com incontinência urinária, mas está ótimo. Está bem, animado e com disposição. Consegue dirigir e fazer algumas coisas em casa.”

Em nota, o Hospital São Paulo informou que os dois medicamentos prescritos para o paciente “são indicados e receitados igualmente”. Disse ainda que o contato telefônico “é necessário para confirmar a disponibilidade, já que a entrega dos medicamentos é feita parceladamente”.

Acompanhamento

Paciente da rede privada, o aeronauta Marino S. Filho, de 58 anos, teve indícios de que estaria desenvolvendo um câncer de próstata no começo de 2013, mas seu caminho foi muito diferente do de Rodrigues. O resultado do PSA foi considerado baixo e o exame de toque não revelou presença de tumor. Mesmo assim, o médico que o atendeu deu início a uma varredura para verificar se a saúde dele realmente estava bem.

“Por causa do histórico familiar, meu tio morreu de câncer de próstata, o médico pediu uma biópsia e um dos fragmentos deu positivo. Ele me encaminhou para um especialista, que pediu mais exames, uma biópsia em dez pontos, mapeamento total, ressonância magnética. Foi tudo muito rápido.”

Os resultados mostraram que não seria necessário fazer intervenção cirúrgica imediata e o aeronauta, que é paciente do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, ficou sendo acompanhado durante um ano. “Na segunda ressonância, o médico viu que a lesão estava chegando perto do osso. Fiz uma cirurgia robótica não invasiva, não precisei de nenhuma medicação depois. Tive uma ótima recuperação. Estou vivendo uma rotina normal, faço exames a cada seis meses.”

O aeronauta diz que fez toda a diferença ter recebido um tratamento rápido e de ponta. “Sei que é duro para a maioria da população ter acesso ao tratamento. Há pessoas que levam anos para conseguir fazer a cirurgia. Por isso, o principal caminho ainda é a prevenção. Esse tipo de manifestação não dá sintomas. Quando dá, o homem já está condenado à morte. Os homens não devem ter preconceito”, diz.

Ele diz que o apoio da família foi fundamental ao longo do monitoramento do tumor e nos períodos antes e depois da cirurgia, mas que a força dada pelo médico também foi decisiva para que ele se mantivesse equilibrado. “Ele disse que foi um privilégio ter descoberto em fase inicial e, mesmo que tivesse alguma consequência, eu tenho minha família, minha mulher e teria minha vida. Depois disso, eu não via a hora de tirar a bomba-relógio que havia em mim.”

Diferenças

Oncologista do Hospital Israelita Albert Einstein e supervisor técnico do serviço de oncologia do Hospital Heliópolis, ligado à Secretaria Estadual da saúde, Artur Malzyner diz que as dificuldades e diferenças podem ser encontradas tanto na rede pública quanto na privada.

“O tratamento dos pacientes que têm câncer com acesso à medicina privada não é uniforme. Também não é no SUS. Temos um atendimento que pode ser primário e pouco atualizado assim como uma gama imensa de recursos tecnológicos e farmacêuticos, mas isso é variado tanto no serviço privado quanto no público.”

Mesmo assim, ele afirma que há diferenças quando os sistemas são comparados. “É menor a probabilidade de o paciente receber o mesmo tratamento atualizado que há na rede privada, porque há menos atualizações no SUS.”

Malzyner explica, no entanto, que mais importante do que o tratamento de primeira linha é o diagnóstico precoce. “O sucesso do atendimento não está só em submeter o paciente a um bom tratamento, mas em ter o diagnóstico. Esse é o gargalo”, afirma.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Posso ajudar?