Cidades

Direito dos homossexuais

Ainda estamos longe de ser um país que tem leis protegendo os homossexuais e seus direitos.

Mas não podemos deixar de ratificar que em 2007 o segmento GLBTTT (Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) obteve importantes vitórias.


 O Brasil é tido como um país “intermediário” quando tratamos da concessão de direitos aos homossexuais, como se não fosse suficiente a proteção que deveria ser dada a todos os cidadãos. Nossa Constituição prega, no seu artigo 5°, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza…”. Mas, estranhamente, o texto constitucional, apesar de assegurar o direito à igualdade, nega-o a muitos, entre eles aos homossexuais.


O mesmo artigo que assegura o direito à igualdade fala também em direito à vida, à liberdade, à segurança. Também fala que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. E vai mais além: afirma que um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil é (mas não parece) “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.


Porém, não podemos dar total credibilidade aos preceitos constitucionais: os homossexuais não podem se casar e sequer podem ter um relacionamento que se assemelhe a uma união estável. Não têm direito à herança no caso de falecimento do companheiro. Não podem adotar crianças. A discriminação é patente.


Além disso, somos líderes num ranking macabro: o Brasil é o país que mais pratica a violência contra homossexuais e transexuais. Segundo dados do Grupo Gay da Bahia, no Brasil, a cada dois dias é morto um homossexual ou transexual em virtude de sua orientação sexual.


Apesar desse cenário negativo, o Judiciário, algumas vezes durante este ano, tomou as rédeas da situação e colocou sob o manto da legalidade e proteção devida pelo Estado os homossexuais que buscaram judicialmente seus direitos. Reconheceu uniões estáveis, mesmo quando nosso Código Civil e Constituição Federal falam em união estável entre um homem e uma mulher. Isso é distribuir a justiça, função principal e primordial que cabe àqueles que representam o Poder Judiciário.


Algumas decisões foram favoráveis, fazendo com que os homossexuais tenham saído vitoriosos em demandas e pleitos que servirão como base para pedidos semelhantes. É a jurisprudência, tão importante na obtenção de novas conquistas. Porém, a maior parte das sentenças permitiu que fosse mantida a prática da discriminação.


As decisões favoráveis surpreendem e, algumas vezes, vêm de lugares inesperados. Tangará da Serra, cidade do interior do Mato Grosso, deve lisonjear-se, pois tem entre seus magistrados pessoa livre de preconceitos e com ampla visão das transformações pelas quais passou e passa nossa sociedade. Trata-se de magistrada que não fecha as portas de seu gabinete, caminhando também fora dele com seu indispensável e louvável sentido de justiça e conhecimento dos direitos fundamentais dos cidadãos. A juíza em questão determinou que, em decorrência do término do relacionamento homoafetivo, uma das companheiras pagasse pensão alimentícia à outra que precisava de amparo material.


Mas na maior parte das vezes, as coisas não fluem como gostaríamos, no Judiciário. Um juiz agrediu ainda mais a moral de Richarlyson (jogador do São Paulo) exatamente quando ele buscava o amparo da justiça. O jogador queixava-se de ter sido discriminado ao insinuarem pejorativamente que é homossexual. O juiz conseguiu fazer algo pior: disse que futebol é coisa para homens e que os homossexuais, se quisessem jogar bola, deveriam montar um time para eles. É com atitudes como essa que ficamos atolados na ignorância. Isso não é o surpreendente. Surpreendente é não se conseguir a aplicação da lei, é ver negados direitos que são, no papel, assegurados e garantidos.


O Legislativo finalmente prestou duas importantes colaborações, o que não fazia havia tempos quando falamos em direitos de homossexuais. Permitiu que se incluísse no texto da lei Maria da Penha a proteção abrangendo todas as mulheres, independentemente de sua orientação sexual, contra a violência doméstica. E também fez com que caminhasse em direção à aprovação o projeto de lei que criminaliza a homofobia. Ou seja, aprovada a lei, agir com homofobia em relação aos homossexuais passará a ser crime, tal como ocorre em relação aos negros.


Esperamos que, num curto espaço de tempo, o homossexual discriminado possa ir a uma delegacia de polícia e ver noticiado o crime de discriminação em razão de sua orientação sexual. Não seria necessária tal lei se o Brasil respeitasse sua Constituição Federal.


Que 20008 seja melhor!


Sylvia Maria Mendonça do Amaral é advogada especialista em Direito de Família e Sucessões do escritório Mendonça do Amaral Advocacia, autora do livro “Manual Prático dos Direitos de Homossexuais e Transexuais” e editora do site Amor Legal – ([email protected])

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