Existem jazzistas da Noruega, bluesmen da República Tcheca e escolas de samba no Japão. Mas fadistas, só em Portugal. Ou quase. “Tem alguns de outros países, mas sempre sentimos que falta algo no acento, talvez”, diz a cantora Carminho, uma sensação de dois discos e muitos seguidores entre a cena jovem do tradicional fado português.
Nesta terça-feira, 19, e quarta, 20, a casa de shows HSBC recebe quatro nomes representativos do cenário. Carminho e o coletivo Amália Hoje, com releituras modernas para canções da “rainha” Amália Rodrigues, se apresentam nesta terça, a partir das 21h. E os fadistas Raquel Tavares e Camané fecham o festival, quarta.
Se sente surpresa com o fato de o gênero tão regionalizado estar em seu segundo festival no Brasil (o do ano passado teve noites esgotadas), Carminho diz que “sim e não.” “Por um lado sinto que o fado está sendo descoberto pelos brasileiros. Há aqui (no Brasil) uma riqueza cultural muito grande, e isso deixa essa descoberta ainda mais importante para que haja uma predisposição maior entre nossas culturas.” Por outro lado, diz se tratar também de uma constatação. “O mundo todo quer ouvir o fado.”
Carminho fala com conhecimento de causa. Aos 31 anos, o mundo sabe quem ela é. São até aqui dois discos de platina pelos álbuns Fado (2009) e Alma (2012), além de shows na Alemanha, França, Tailândia, Inglaterra, Estados Unidos, Coreia, Finlândia, Suécia e Espanha. Nos últimos três, Fado entrou para a lista dos discos mais vendidos em poucas semanas. “Em muitos desses lugares, cantei em festivais como atração principal.” Ela diz que sua vinda não será apenas para cantar no festival. Nas horas vagas no Brasil, vai se reunir com Elba Ramalho para gravar uma música inédita deixada por Dominguinhos, que vai estar no próximo trabalho da cantora. “Só não posso dizer ainda o nome da canção.”
Aos 46 anos, Camané é o mais conhecido, com carreira mais estabelecida em seu país. Sobre o fato de o fado não ter uma abrangência maior nas plateias do Brasil, ele diz: “Penso que tudo passa pelo poder da comunicação, os media têm sempre um papel fundamental na divulgação. Espero que a imprensa brasileira comece realmente a divulgar a nossa música, porque sempre que existe este intercâmbio, a reação do lado brasileiro é sempre muito positiva.” Mas ele mesmo conclui que não se trata apenas de divulgação: “A questão rítmica também tem alguma importância. Esta toada do fado por vezes para um brasileiro poderá ser lenta, mas não acredito que essa barreira seja , como muitas vezes se diz, a dicção.”
Sobre as tentativas de modernização da linguagem da cultura fadista, Camané analisa: “São questões distintas e explico porquê;. Há muitos rostos novos a cantar fado sem o tentar modernizar e toda essa gente nova que nasceu no fado e o canta agora consegue ter isso, esse mundo e essa capacidade. E existem casos de jovens muito bons aparecerem no fado. Com relação à modernização, todas as experiências são válidas desde que sejam sentidas.” Sobre as plateias de Portugal, ele diz que “todos os tabus caíram.” “Existe realmente em Portugal um público transversal, desde os mais velhos que continuam a ouvir o seu fado como todas as gerações mais novas já o fazem sem preconceito.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.