Candidato a representar o Brasil no remo nos Jogos Olímpicos do Rio, Steve Hiestand não conhece a palavra “adversário”. Literalmente. Nascido em São Paulo, mas criado nos arredores de Zurique, o fisiologista de 30 anos joga capoeira, come feijoada aos domingos “como todo brasileiro”, mas ainda tem alguma dificuldade com o português materno.
Afinal, ficou 24 anos sem vir ao Brasil, onde nasceu em setembro de 1984, fruto da relação entre um suíço e uma brasileira. “Meus pais se conheceram como todo típico suíço conhece uma baiana: no Carnaval de Salvador!”, conta o remador, de sorriso fácil e pele bronzeada. Foram quatro anos morando em São Paulo até que uma doença pulmonar no garoto fez os pais optarem pelo ar puro suíço.
Nunca estudou português, língua que aprendeu no convívio com a mãe e suas amigas. Aos domingos, elas se juntam para comer feijoada e ouvir DVDs de artistas brasileiros. O que ele não sabia sobre o Brasil era o tamanho da burocracia. “Achei que eu ia chegar no Poupatempo e fazer rápido minha carta de identificação (RG). Ia ficar só uma semana no Brasil, mas tive que ficar mais.”
A primeira viagem ao País como adulto foi em outubro de 2012, para o Campeonato Brasileiro. Naquele ano, Steve foi a uma etapa da Copa do Mundo de Remo em Lausanne, na Suíça, e conversou com Guto Loureiro, um arquiteto de 45 anos que fundou o próprio clube, o Loureiro, na Barra, para acabar com a polarização Vasco/Flamengo/Botafogo na Lagoa. O suíço, que voltava ao remo depois de oito anos afastado, ouviu a garantia de apoio, a começar com uma embarcação do single skiff, prova em que o Brasil já tem convite garantido para o Rio-2016.
Em dois anos e meio, Steve veio pelo menos outras cinco vezes ao País. Em março, trocou o inverno suíço pelo verão carioca e sentiu o baque. Doente, ficou apenas em quinto na seletiva nacional. A comissão técnica entendeu as dificuldades do suíço e permitiu a ele participar da segunda seletiva, entre 9 e 11 de abril, na Lagoa Rodrigo de Freitas.
O suíço levou a melhor em três tomadas de tempo contra Gabriel Morais, do Corinthians, mas não fez índice suficiente para ser convocado para a primeira etapa da Copa do Mundo, em Blend. Mesmo assim, viajou até a Eslovênia e participou de uma regata preparatória, ganhando o bronze – perdeu só dos atletas que foram respectivamente ouro e bronze na Copa do Mundo, dois dias depois.
Para ir à segunda etapa da Copa, em Varese (Itália) e ao Pan, em Toronto (Canadá), precisaria voltar ao Rio para mais uma seletiva, de quinta a sábado desta semana, contra Augusto Scheffer (do Grêmio Náutico União) e Fábio Santana (Botafogo). “Investi mais de 60 mil euros (cerca de R$ 205 mil) nos últimos dois anos e meio para entrar na seleção. Mas agora o dinheiro acabou”, conta Steve.
Ele diz ter “muita, muita, muita” vontade de buscar uma medalha em Toronto, mas agora a convocação não depende mais dele. A comissão técnica vai avaliar o desempenho dos demais e decidir quem convocar. Como as seletivas acontecem em condições climáticas distintas, a comparação é difícil. Steve só deverá ser chamado se os demais forem mal.
O remador, entretanto, não se arrepende de ter aberto mão do convite para participar da seletiva para a seleção suíça, no fim do ano passado. “Quero fazer uma coisa uma vez pelo Brasil. Aprendi meu trabalho na Suíça, corri mais de 10 anos pela Suíça, mas nunca fiz nada pelo Brasil. Quero dar algo de volta para o Brasil. É uma coisa do coração.”