A BRF e a Marfrig desistiram do acordo para fusão de seus negócios, anunciado há cerca de 40 dias. As duas companhias, que haviam acertado um prazo de 90 dias para organizar a fusão, desistiram das conversas por não terem conseguido chegar a um consenso sobre temas de governança corporativa que guiariam a nova companhia.
“Apesar do término das tratativas para a combinação de seus negócios, o relacionamento comercial entre a companhia (BRF) e a Marfrig permanecerá inalterado e não haverá quaisquer modificações nas práticas, condições e termos previstos em contratos por elas celebrados”, informou a dona de Sadia e Perdigão, em fato relevante. Hoje, a Marfrig fornece carne bovina à BRF para produção de hambúrgueres, por exemplo.
Na sexta-feira da semana passada, a colunista Sonia Racy havia publicado nota na coluna Direto da Fonte sobre as dificuldades nas negociações entre as duas companhias.
Novo modelo. O fim dessa negociação, no entanto, pode não ser o ponto final em uma eventual parceria entre as duas empresas. Segundo uma fonte ligada às negociações, BRF e Marfrig poderão retomar as conversas, em outros termos.
Essa fonte disse ao Estado que a falta de consenso sobre governança pode ter sido gerada pelo anúncio prematuro da fusão, que teria sido realizado antes de as empresas amadurecerem o tema. A dificuldade em definir claramente os papéis dos executivos da BRF e da Marfrig na nova companhia também pesou desfavoravelmente. “Havia muitas dificuldades”, definiu essa fonte.
Outra questão complexa seria o fato de os fundos de pensão – Petros (da Petrobrás) e Previ (do Banco do Brasil), que sócios relevantes na BRF – não verem a união com bons olhos. A Previ era abertamente contrária ao negócio.
Os fundos de pensão foram os maiores opositores à gestão do empresário Abilio Diniz e da Tarpon, à frente da BRF, que em 2016 registrou seu primeiro prejuízo da história, e teve seu nome envolvido nas operações Carne Fraca e Trapaça. A empresa negocia acordo de leniência.
Do outro lado da mesa, na Marfrig, haveria dúvidas se a fusão valeria a pena para o empresário Marcos Molina, que ficaria sem poder no novo negócio.
Anúncio. O anúncio da fusão entre as duas gigantes dos alimentos pegou o mercado de surpresa no fim de maio. A combinação dos dois negócios criaria uma gigante global de carnes, com receita de R$ 76 bilhões. Pelo acordo, a BRF ficaria com 85% da companhia que seria criada a partir da fusão, enquanto a Marfrig seria dona de uma fatia de 15%.
A companhia resultante da fusão seria uma gigantes com 136 fábricas e 137 mil funcionários. Caso a união dos negócios tivesse ido adiante, a gigante das carnes ficaria atrás somente da JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, da americana Tyson Foods e da chinesa Smithfield.
Unidas, BRF e Marfrig teriam uma atuação mais abrangente, atuando em todas as principais proteínas animais.
Apesar desse apelo de escala, houve quem questionasse a efetividade da fusão no fim de maio, quando ela foi anunciada. “Não acho que o negócio traga sinergias relevantes, além dos ganhos administrativos e operacionais de praxe”, disse Antônio Barreto, analista de bebidas e agronegócio do Itaú BBA, ao Estado, em maio. “Sobram, dessa forma, outras explicações, como a tentativa da BRF de conseguir reduzir sua alavancagem de forma mais rápida e a criação de um competidor global de porte mais parecido com a JBS e a Tyson Foods.”
Do ponto de vista da redução do endividamento da BRF, haveria outras alternativas, segundo Barreto. O mercado já esperava que, com a gripe suína na China, os resultados da BRF melhorassem de forma sensível ao longo de 2020 e 2021. Tanto que esse fator já tinha começado a aparecer nas ações da empresa, que subiram cerca de 50% nos últimos seis meses.
Dificuldades. A BRF, que enfrenta dificuldades financeiras e de operação há dois anos, com prejuízo acumulado de R$ 5,5 bilhões em 2017 e 2018, teria a intenção de que a combinação reduzisse sua exposição a riscos setoriais e gerasse alguns ganhos de sinergia.
A Marfrig, que nos últimos anos passou a vender negócios para reduzir suas pesadas dívidas, passaria a fazer parte de um grupo sólido, que também venderia carne suína e de frango.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.